Famosos antes de nascer

por Malu Fontes

  • D
  • Da Redação

Publicado em 18 de setembro de 2017 às 04:30

- Atualizado há um ano

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Nesse tempo de vertigem de imagens e no qual a intimidade das pessoas famosas tem mais relevância do que notícias que dizem respeito à vida de milhares de pessoas, o fenômeno da fama, seja local, nacional ou internacional, atingiu os fetos. Desde que a grávida seja famosa, é automático. Diretamente do útero, os fetos já são estrelas. Os filhos de poderosos sempre nasceram poderosos, vide crias dos monarcas de séculos atrás. Mas, hoje, quando tudo é precificado, para usar a palavrinha da moda do jornalismo político e econômico, basta uma famosa engravidar que tudo sobre o assunto e o bebê ‘quebra a internet’. 

A condição biológica embaralha-se a toda a carreira e, independentemente da grávida em questão falar ou não sobre isso todos os dias, não há saída: você, a não ser que viva em Júpiter, esbarrará diariamente com o assunto. Os exemplos mais recentes desse fenômeno são Beyoncé, que pariu em junho, a princesa Kate Middleton, na Inglaterra, e Ivete Sangalo, grávida de gêmeos, como a cantora norte-americana. Ninguém tem dúvidas de que, para os veículos, como notícia, a gravidez de Ivete é mais poderosa do que qualquer fazenda de cliques do mundo, as criações digitais apátridas que vendem milhões de seguidores para redes sociais para inflar artificialmente o número de seguidores, curtidas e likes.    ULTRASSOM - Quem tiver a experiência de viver alguns minutos numa redação de um veículo noticioso pode ver. Coloque online qualquer notícia sobre as gêmeas de Ivete e acompanhe em tempo real o tsunami de cliques na notícia.  É coisa de outro mundo, desse mundo digital em que uma imagem de uma ultrassonografia dessas meninas deve ser hoje o delírio de consumo de qualquer veículo, colunista social ou digital influencer. Mas não adianta sonhar. Sendo a própria Ivete uma das maiores digital influencers do país, se essa imagem por ventura vier a público deverá ser publicizada por ela mesma. 

Agora pensem no que deve ser crescer e ter, para além do álbum de retratos, todo um acervo na web. As crias das celebridades já nascem com não sei quantas citações nas ferramentas de busca da web. Saem do útero e já têm um loooonga história de vida, seja no ciberespaço, nas redes, nas conversas de boteco ou no imaginário dos fãs das mães, que, automaticamente, tornam-se fãs dos bebês, desde a vida intrauterina. Não à toa, para essas famílias é um problema a decisão de como lidar com a exposição dos filhos. O que mostrar ou não, até onde exibi-los, como protegê-los do assédio de fãs, imprensa e paparazzi.    COTOVELADA - Não à toa os fofoqueiros de plantão, que adoram piorar as coisas para criar intriga e climão, renderam a não perder de vista uma declaração da atriz Deborah Secco à revista Veja, sobre a exposição de sua filha, Maria Flor, em suas redes sociais. A atriz defendeu a tese de que há um interesse gigantesco da imprensa de celebridade e não há como criar um filho numa redoma. Por isso, seu argumento é o de que se ela mesmo posta fotos da menina, não haverá interesse em ficarem perseguindo-a para fotografá-la. E citou o exemplo da cantora Sandy: "Não tenho o dinheiro da Sandy, não ando cheia de seguranças e não moro em Campinas. Então quis evitar que, cada vez que ela aparecesse, isso causasse uma comoção", justificou-se.    As gêmeas de Ivete, há apenas três meses no útero da mãe, já são mais famosas que muito cantante com anos de carreira. Já são objeto de reportagens, posts, memes e comentários.  No dia do anúncio da gravidez, a auxiliar financeira Luciana Lopes saiu-se com a melhor das sacadas sobre o assunto numa rede social: "Tô aqui imaginando o alvoroço que fica na fila da reencarnação quando abre duas vagas para ser filho de Ivete Sangalo". Não é? Deve ter até empurrão e cotovelada. 

Malu Fontes é jornalista e professora de jornalismo da Facom/UFBA.