No tempo do chapéu

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  • Nelson Cadena

Publicado em 1 de setembro de 2017 às 03:00

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Na Bahia, o hábito de usar chapéus como proteção da cabeça exposta ao sol e também como indumentária, complemento obrigatório do figurino, atravessou séculos; as fotografias antigas nos revelam o seu uso em praticamente todos os eventos públicos, o Carnaval, inclusive, para quem não colocava arranjo na cabeça. O uso do chapéu era tão importante que uma rua da cidade, transversal da Câmara Municipal, foi denominada de Tira Chapéu, em referência ao ato cerimonioso de vergar o corpo e saudar, com o chapéu na mão, as autoridades que frequentavam o nobre espaço.

Todos os baianos usavam chapéu, inclusive escravos e os pobres, as fotos do século XIX de africanos carregadores nos revelam homens descalços com calça de algodão surrada e na cabeça um chapéu velho. Os de melhor condição usavam chapéus finos que podiam ser adquiridos em lojas especializadas. Em 1902, quando da inauguração da Rua Chile, o comércio lançou o chapéu Chile em homenagem ao dito país que nos fazia uma visita oficial de sua marinha de guerra, o motivo justificado para mudar o nome da rua que então era conhecida como Direita do Palácio.

O chapéu era indumentária obrigatória para qualquer evento público e, em geral, deveria vir acompanhado de um paletó de linho para os homens, ou um vestido longo para as mulheres, de preferência de seda. Usava-se chapéu sempre, para assistir as missas dominicais, participar das procissões das festas populares e até para o lazer proporcionado pelos esportes. O figurino fazia parte das regatas de Itapagipe, das corridas de cavalos no ground do Rio Vermelho e dos jogos de futebol nos campos da Pólvora, Rio Vermelho e, a partir de 1920, no estádio da Graça. Juízes e bandeirinhas também o usavam.

Foi pensando no chapéu que os fabricantes das fitas do Senhor do Bonfim e outras do gênero, então denominadas de medidas de santo, começaram a ser fabricadas. Eram largas, em torno de 2 polegadas, e confeccionadas em cetim, ou, seda com finos bordados e alto relevo em evidência. Quem não usava no pescoço, usava em volta do chapéu. Ninguém, naquele tempo, poderia imaginar que um dia seriam usadas como pulseiras e tornozeleiras e muito menos fabricadas com materiais tão vagabundos que poderiam ser adquiridas pelos revendedores por menos de 10 centavos a unidade.

A moda do uso do chapéu provocou o surgimento de duas fábricas, pelo menos, a Chapelaria Norte Industrial, de Francisco Hasselmann, e a de Bernardino José Pimentel, na rua da Fonte dos Padres. Eram de boa qualidade, lembro-me de ter lido em alguma ata da Câmara Municipal, ou da Assembleia Legislativa, o aparte de um deputado onde exaltava a qualidade dos chapéus baianos, segundo ele um dos poucos segmentos industriais do qual podíamos nos orgulhar. O comércio ganhava um bom dinheiro com o produto a ponto de existirem lojas que vendiam apenas isso, as famosas chapelarias.

Os baianos adquiriam seus chapéus de palha com feltre, de palha bordada, os ingleses de castor preto, ou, os mais finos de seda do Porto ou de castor branco, ou, pardos com abas largas nas chapelarias da rua Chile: a Chapelaria Mercury, de Giovano Mercuri, bisavô de Daniela Mercury, e chapelaria Imperial, de Floro Pinheiro Requião. Também eram afamadas chapelarias a de Moir & Cia, no Trapiche Grande do Comércio; Madame Prosper, em São Bento, Mamede & Irmão, na Avenida Sete; Chapelaria Vesúvio, na J.J Seabra; Chapelaria Baiana e a do alfaiate francês Monsieur Palon.

Na Rua Chile podiam-se comprar chapéus também nos grandes magazines, a exemplo da loja Au Louvre e, a partir de 1919, nas Lojas Duas Américas. Contavam com departamentos especializados e vendedores que esbanjavam simpatia e elegância, eles próprios usando os chapéus exibidos na vitrine.