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Da Redação
Publicado em 10 de outubro de 2022 às 05:00
Em julho deste ano, no que poderia ser visto como a consolidação de uma visão de mercado, Gilson Rodrigues discursou na abertura do pregão da bolsa de valores de Nova York. Gilson Rodrigues é presidente do G10 Favelas, bloco de líderes empreendedores de impacto social que atua em favelas espalhadas pelo Brasil. E foi assim que o empreendedorismo de comunidade pautou Wall Street – e, também, a Europa.>
“A internacionalização da G10 é um processo em andamento. Tivemos ações nos EUA e Europa levando esse empreendedorismo de favela pra mostrar que existe uma oportunidade de fazer negócios lá e, ao mesmo tempo, dar visibilidade a iniciativas que acontecem na favela. Em geral se fala nas favelas do Brasil sobre violência, marginalidade, coisas ruins. E nós queremos mostrar o lado potente, organizado, economicamente ativo, que movimenta R$ 180 bilhões”, explica.>
O G10 Favelas segue a lógica dos países ricos do G-7 (Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido) para se organizar e operar. Segundo Rodrigues, essas comunidades uniram forças para alavancar o próprio desenvolvimento econômico e protagonismo. O que ele fez foi adaptar a realidade ao que existia no Brasil.>
“O G10 nasceu como um bloco de líderes e empreendedores das 10 maiores favelas do Brasil, que decidiram se organizar de forma conjunta. E isso é uma herança de anos e anos de trabalhos comunitário das lideranças dessas favelas onde nós estamos, de favelas que estão empreendendo e dando certo. Falo como exemplo Paraisópolis, de onde eu sou prefeito, que é um retrato desse Brasil, que tem empreendedores, que tem comércio, população ativa economicamente, idosos. Então a gente olha pra esse conceito de favelas que está dando certo no Brasil e se a gente pode escalar para fora. É isso que a gente está fazendo.”>
Rodrigues se refere à favela brasileira como um país. E, de fato, o paralelo é pertinente: o Brasil tem 13.151 favelas, onde moram 17 milhões de pessoas. A Bahia, por sua vez, conta com 572 favelas, sendo 270 na capital baiana. Segundo dados do DataFavela de abril deste ano, 76% dos moradores querem empreender, empreende ou já empreendeu alguma vez na vida. Em 2015, o mesmo instituto apontava que este número era de 40%, o que mostra o crescente potencial criativo de quem vive nas comunidades. No entanto, a vida de quem empreende nesse “país favela” tem obstáculos que pessoas de fora não enfrentam.>
“As favelas sofrem embargo econômico. Carro de aplicativo não vem, e-commerce não entrega. Tem uma série de bloqueios, como se quem vive em favela morasse numa realidade paralela”, pontua. E, segundo Rodrigues, a melhor forma de transformar problemas em possibilidades de negócio é dando exemplo.>
“A Favela Brasil Xpress, nossa empresa de logística que está fazendo a última linha com o e-commerce, já movimentou mais de um milhão de pacotes num ano, o que significa mais de R$ 600 milhões em compras de favelas do Brasil. Essa empresa faturou R$ 7 milhões num ano. E esses problemas são problemas de 13 mil favelas no país, imagine se cada favela tivesse um Favela Xpress, quanto que poderia ser o faturamento? A gente mostra na prática que é possível, gerando trabalho e renda e trazendo a solução. O empreendedorismo na favela é um mundo a ser explorado”.>
Representatividade Não apenas o empreendedorismo, mas o público das comunidades também é pouco explorado pelo mercado. De acordo com o estudo Diversidade na Comunicação de Marcas em Redes Sociais, realizado pela Elife e a agência SA365, publicado em 2021, apenas 38% das peças publicitárias analisadas tinham pessoas pretas e pardas. E isso tem consequência.>
“Há o apagamento das pessoas que vivem em favelas. É como se a gente não consumisse, não comprasse pão, não se vestisse, não comprasse apartamento, não se divertisse. Quando passam os comerciais de margarina todo mundo é branco, até o cachorro é loiro. A gente quer se ver na propaganda, se identificar. Quem não investe nesse mercado está perdendo dinheiro”, aponta o presidente do G10 Favelas.>
Como em todo país, na favela também existem áreas nobres e periféricas. Rodrigues chama esses lugares de “periferia da periferia”. Levando em consideração apenas o universo das favelas de São Paulo, 84 comunidades apresentam estrutura muito ruim: apenas 35,6% têm acesso à água, 9,9% a esgoto e 45% à coleta de lixo. Esses dados são da pesquisa publicada em 2021 pelo Centro de Estudos da Metrópole, ligado à USP e Fapesp, em parceria com a Prefeitura de São Paulo. Para Rodrigues, esse é mais um motivo para estimular o empreendedorismo dentro da própria comunidade e fornecer formas para que os empreendedores prosperem. Outro caso de sucesso foi o G10 Bank, banco que fornece crédito a empreendedores e famílias com opções muito mais acessíveis que no mercado tradicional.>
“Essa solução entendemos como oportunidade. Quando a gente olha pra oferta de crédito para a população, a gente via que os ‘bancões’ estavam cobrando altos juros para a população ou os empreendedores não conseguiam esse crédito por uma série de dificuldades, burocracias. O G10 Bank nasce como um BNDES da favela de forma desburocratizada para oferecer crédito, mentoria, para que as empresas prosperem. A ideia não é só ter a devolução desse empréstimo, mas que o impacto seja mais profundo dentro da comunidade com geração de emprego e renda. O banco deve cumprir um papel social, não de exploração social”.>
Bolsa de valores da favela Uma evolução desse projeto capilarizado de desenvolvimento do “país favela” foi a criação de uma bolsa de valores própria, que reúne empreendimentos dentro das comunidades. Lembra do discurso que Gilson deu na bolsa de valores de Nova York? Foi justamente para anunciar o processo de IPO (abertura da empresa para investimento) da Favela Brasil Xpress. No último dia 7, o CEO da empresa, Giva Pereira, anunciou crescimento de R$ 3,86% e que fará neste mês o primeiro pagamento aos mais de 800 acionistas dentro e fora de Paraisópolis.>
“Mostramos que temos um resultado até superior do que empresas e investimentos tradicionais ou internacionais. Investir na favela é um negócio altamente lucrativo, e abrimos espaço para que outras pessoas e empresas possam participar”, finaliza Rodrigues.>
Gilson Rodrigues é um dos palestrantes do Agenda Bahia 2022. Ele vai participar do talk “Economia das comunidades” e do painel “Economias do futuro”. >
Serviço: 13ª edição do Fórum Agenda Bahia Onde: Wish Hotel da Bahia, Youtube e Yazo Data: 18 de outubro Inscrições pelo Sympla Valor: evento gratuito >
O Agenda Bahia 2022 é uma realização do CORREIO, com patrocínio da Acelen e Unipar, parceria da Braskem e Rede+, apoio institucional da Prefeitura Municipal de Salvador, Fieb, Sebrae, Rede Bahia e GFM 90,1 e Apoio da Suzano, Wilson Sons, Unifacs, HELA, Socializa e Yazo.>