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A verdadeira função dos áudios acelerados do WhatsApp


 

Isso é sintoma e deleite e mais: tem relevância sim!

  • Flavia Azevedo

Publicado em 29/05/2021 às 11:00:00
Atualizado em 22/05/2023 às 10:43:06
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Meu filho chegou a perguntar "tá tudo bem, mainha?" porque eu, simplesmente, gritava e chorava de tanto gargalhar. Diante de mim, o vídeo que meu amigo me mandou dele mesmo escutando um áudio meu, no modo acelerado. Ele também se acabando, evidentemente, e faz tempo que eu não ria tanto - e com tanta vontade - da minha própria pessoa. Foi assim o meu primeiro contato com o novo recurso e vou te dizer que essa é a única coisa realmente engraçada que eu vi acontecer, pra todo mundo junto, desde o ano passado.

No mundo. No planeta. Talvez, no Sistema Solar "e arredores", como diz o rapaz que já me avisou que nunca mais manda áudio pra ninguém. Depois ele acostuma, assim como Rafa, irmão daquele primeiro amigo, que já disse "gostei não, acelerar um áudio meu é o mesmo que acelerar uma música de Caymmi" me fazendo lembrar que algumas músicas de Caymmi já ficaram ótimas aceleradas. Na minha opinião, claro.

Se dependesse de minha autorização, eu diria que, por mim, me aceleram à vontade. Eu mesma achei foi muito incrível a distribuição gratuita de gargalhadas personalizadas, nesse momento tão difícil da humanidade. É com esse negócio aí que o campo vibracional vai melhorar. Pelo humor em gotas, em cada celular. Pensei, inclusive, em várias pessoas pra puxar conversa, por áudio, pra depois ficar indo e voltando nas audições. Quem é qualquer humorista na fila do pão, minha gente, diante da voz de um ex-marido, bem mala, falando a mil por hora por sua decisão? Nada pessoal, só um exemplo, claro.

Não há nada que me convença de que não é essa a verdadeira função dos áudios acelerados do WhatsApp: nos fazer dar risada. Muita! Mostrar que, na página dois, é todo mundo quinta série, querendo ou por acidente, em um lugar ou noutro da piada. Observe, inclusive, a quinta série que é esse papo de que o recurso seria pra otimizar o tempo de executivos/as de São Paulo e demais pessoas super ocupadas.

Primeiro, que não tem ninguém tão ocupado que não possa escutar um áudio no tempo certo. Depois, porque é muito difícil levar a sério qualquer criatura falando de trabalho daquele jeito e este é o impeditivo do propósito alegado. Esse troço só funciona pra trabalho se a pessoa for, geneticamente, mal humorada o que espero, sinceramente, que não seja seu caso.

Os áudios acelerados relembram e decretam que somos todos risíveis! Inclusive em nosso conceito de "funcionalidade" que, muitas vezes, é muito babaca. Estão aí vários dos gadgets e suas "imprescindíveis" utilidades. Tão úteis que, outro dia, um amigo me disse que ligou pro cardiologista porque foi acordado, no meio da noite, pelo relógio que conta as batidas do coração dele. Em algum momento de algum sonho, evidentemente, o coração acelerou, o apito apitou e a pessoa ligou para o cardiologista que disse o óbvio: "desligue esse alarme antes que você fique maluco". Batidas de coração não devem ser contadas dia e noite, pelo jeito. E tem mais coisa esquisita por aí, se você procurar.

Agora me diga que diacho a pessoa vai fazer com os minutos economizados botando a fala do outro pra correr? E que escuta é essa, minha gente? To-tal-men-te disfuncional. Olha onde foram mexer. Espie direito e veja que esse recurso é, ao mesmo tempo, objeto e metáfora. Somos, nós mesmos, sujeitos e objetos, simultaneamente, no mesmíssimo ato. É assunto pra nunca mais acabar.

Tô me vendo no Bagacinho, pedindo mais um negócio pra beber, enquanto alguém me explica e/ou eu explico a alguém que isso é sintoma e deleite e mais: tem relevância sim! Se fosse com algum/a amigo/a mais afetado "da academia", algum proprietário de Foucault, ficaria ainda mais engraçado, bebido e conversado. Por enquanto, vou só pelo zap, na velocidade que decidirem por mim. E torcendo pelo fim da pandemia que bom mesmo é gastar assunto em mesa de bar.