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Obesidade pode gerar casos mais graves de covid-19, dizem médicos


 

Apesar disso, chance de pegar a doença não é maior entre os obesos

  • Gabriel Amorim

Publicado em 23/04/2020 às 06:00:00
Atualizado em 21/04/2023 às 03:07:06
. Crédito: AFP

Aos 28 anos, o funkeiro MC Dumel foi uma das vítimas baianas da covid-19 na Bahia. A pouca idade do artista, que morreu no último dia 16 após internamento na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Couto Maia, em Salvador, gerou um questionamento: seria a obesidade fator de risco para quem é infectado pelo novo coronavírus?

O boletim que atestou a morte do artista, emitido pela Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab) afirma que ele não apresentava comorbidades comumente associadas a quadros graves da doença como hipertensão e diabetes, mas destacava ‘histórico de obesidade’. Pelos parâmetros da Organização Mundial da Saúde (OMS), é considerado obeso o paciente que tem o Índice de Massa Corporal (IMC) maior que 30 pontos.

Segundo os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados em 2009  1.025.916 baianos eram considerados obesos - 11,2% da população maior de 20 anos do estado. Para o coronavírus, a doença já é considerada fator de risco nas estatísticas nacionais e estaduais que acompanham os óbitos. São, segundo o Ministério da Saúde 103 óbitos de pessoas obesas no país que foram infectadas com o novo vírus. Na Bahia, segundo a Secretária Estadual de Saúde (Sesab), dos 53 óbitos registrados, sete mortes têm relação com a obesidade. Ambos os dados consideram os casos até a última terça-feira (21).

Especialistas  Para os médicos, que trabalham no enfrentamento a ambas as doenças, é correto sim afirmar que a obesidade representa um risco maior de desenvolver quadros graves da covid-19. 

“A obesidade, como qualquer fator, não aumenta o risco de que a pessoa seja infectada mais facilmente mas, se infectando, aumenta as chances de desenvolver formas mais graves da doença”, explica a médica endocrinologista Nathale Prates. 

A primeira razão pela qual a obesidade pode representar um agravamento no quadro diz respeito a um quadro de inflamação crônica causada pela própria condição de obeso. “A inflamação já é algo presente na obesidade. É um processo inflamatório disfuncional e essa inflamação gera substâncias que podem causar mal ao organismo como um todo. Quando o vírus acomete o obeso essa inflamação acaba agravada e isso deixa ele mais exposto”, detalha ela. 

Esse processo inflamatório, segundo estudos mais recentes, é uma das fases da nova doença. “Esse é um dos mais importantes fatores de risco pros pacientes mais jovens, que geralmente não tem diabetes ou hipertensão. Hoje se sabe que o coronavírus têm três fases principais, a primeira que é a fase da resposta viral, que  afeta as vias respiratórias, a segunda afeta mais o pulmão e na terceira ocorre uma resposta inflamatória aumentada, que é a fase mais preocupante pro obeso”, explica o médico infectologista e professor da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública, Robson Reis “Nessa fase três que é uma das mais complicadas onde a inflamação aumenta para o obeso que já tem um quadro de inflamação prévio”, completa.   .  

Todos os profissionais são unânimes em destacar a obesidade como fator de risco para o agravamento, o que significa dizer que os cuidados para se buscar evitar o contágio são os mesmos seja o paciente obeso ou não “A obesidade já vem sendo considerada isoladamente como fator de risco para quadros mais graves, mas ela não torna o contágio mais fácil, então é preciso destacar que a pessoa obesa deve tomar os mesmos cuidados que qualquer outra pessoa”, destaca a endocrinologista Lorena Lima Amato.

Tratamento 

Para além da questão inflamatória, outras condições comuns aos obesos causam preocupação se  associadas a uma possível infecção pelo novo coronavírus. Dentre esses pontos, síndromes respiratórias comuns em pacientes considerados obesos podem agravar os quadros e inclusive dificultar o tratamento. 

“A obesidade é a patologia que carrega consigo o maior número de comorbidades como diabetes, hipertensão arterial. E os pacientes com com a obesidade severa têm patologias pulmonares, dificuldades respiratórias, que também agravam o quadro do vírus”, explica a endocrinologista Teresa Arrutti 

No que diz respeito aos problemas respiratórios, segundo os médicos, é comum que pessoas obesas apresenta, por exemplo, apneia no sono, com uma dificuldade de repirar. Como o coronavírus apresenta, principalmente, sintomas respiratórios uma condição preexistente de patologia pulmonar pode agravar ainda mais o quadro da nova doença.      Outra questão trazida pelos profissionais diz respeito a uma possível necessidade de internamento. É que, segundo os médicos, o paciente obeso tem dificuldades na realização de procedimentos que são comumente necessários quando a covid-19 se agrava e é preciso recorrer a uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI). “Pacientes obesos são mais complicados de manejar a via aérea, o que acaba dificultando a intubação. Que é algo que pode ser necessário caso o quadro evolua com gravidade. Outra dificuldade é a ventilação justamente por conta do peso”, explica a infectologista Clarissa Ramos. 

O que pensam os gordos?

Em anonimato, um homem gordo morador de Feira de Santana contou que está com medo de contrair a covid-19 por causa dos maus hábitos de alimentação e falta de exercícios. Ele acredita que está beirando a obesidade e preocupa-se com a circulação sanguínea, pois teme estar com as veias entupidas. "Também fico preocupado com a minha imunidade por conta do consumo exagerado de açúçar. Com a ansiedade, eu fico com votande de beber café toda hora, preciso controlar", confessa. O homem conta ainda que só tem saído uma vez na semana para ir ao mercado e tem usando máscara a cada saida.

Ativista do movimento contra a gordofobia, Carla Leal diz que durante toda a vida ouviu que a obesidade era um fator de risco para qualquer doença, não só a covid-19. "Quando você aprodunda o estudo sobre o tema, não é bem assim, é uma questão mais ligada aos hábitos. A gente vive numa sociedade onde o corpo gordo é tratado como preguiçoso, sedentário, que come exageradamente. Mas a obesidade é multifatorial, existem diversos motivos para uma pessoa estar gorda. Existe a questão genética, psicológica, a da compulsão alimentar", comenta ela, que já esperava que o corpo gordo viria a ser estigmatizado e alvo de piadas durante a pandemia.

Em relação ao enfrentamento da pandemia, ela diz que está apreensiva, tem feito isolamento, aderiu mais ao delivery, higieniza tudo o que entra em casa e tem tentado se equilibrar para não entrar em pânico. 

*Sob supervisão da editora Clarissa Pacheco / Colaborou Hilza Cordeiro