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Filhos de Gandhy celebra o poder de cura de Omolu na Avenida


 

Depois da polêmica da fantasia amarela no ano passado, Afoxé volta ao tradicional azul e branco

  • Vinicius Nascimento

Publicado em 23/02/2020 às 18:35:00
Atualizado em 20/04/2023 às 21:10:08
. Crédito: Inácio Teixeira/Secom

Desta vez não teve polêmica. Esqueça o amarelo de 2019. No Carnaval em que o Filhos de Gandhy completa 71 anos de existência e resistência, foram os tradicionais e azul e branco que predominaram na fantasia. Neste ano, a roupa faz referência aos orixás Omolu-Obaluaê, deuses da doença e da cura. A escolha parte do entendimento do afoxé sobre as enfermidades que estão atingindo o mundo. 

O traje traz losangos azul na frente e é quase todo branco no fundo. Também estão presentes referências ao elefante (significando a força), camelo (a resistência) e a cobra (Oxumarê). Na parte da frente a roupa tem maior presença dos tons de azul, com vários losangos e desenhos de Omolu na região da barriga e nos pés. Também tem algumas imagens de Gandhy e a pomba da paz. No fundo, o tom predominante é o branco, com o nome do bloco e o ano de fundação escritos em azul.

O turbante também tem uma imagem de Omolu e alguns losangos.Depois de realizar seu tradicional ritual no Largo do Pelourinho, o Gandhy iniciou seu desfile no contrafluxo. O afoxé deixou a praça Municipal em direção ao Campo Grande por volta das 16h40 - quarenta minutos após o previsto. Mas nada que atrapalhasse a alegria do afoxé.

Saindo no Gandhy pelo sétimo ano seguido, Herbert Viana afirmou que o Gandhy tem a energia diferente e faz qualquer um se mexer. Por conta disso, mantém firme a sua fidelidade ao bloco. A ideia foi aprovada por Evangelista, sócio do afoxé há 37 anos e que curtia a festa encostado na corda para poder dançar com mais liberdade e encantar àqueles que deram a sorte de cruzar seu caminho.

"O Gandhy é um sinônimo de liberdade, de empoderamento do povo negro. Essa mensagem de paz é muito importante em tempos tão complicados", disse o folião. Evangelista tem 40 anos de Gandhy e curte colado na corda para dançar e se manifestar com liberdade. O motivo para dedicar tantos anos ao bloco é simples: para ele, o Gandhy é uma ferramenta de empoderamento negro.

Antes disso, encontramos o trio formado por Edson Carvalho, Demerson Washington e Bigode. Eles saem juntos há mais 30 anos  com os filhos de Gandhy. Os três afirmam que não largam o bloco por nada e são encantados pela mensagem de paz que o afoxé  se propõe a levar às ruas.

Antes mesmo de chegar à Castro Alves e fazer a sua parada tradicional, o Gandhy já emocionava. Dona Arlinda, por exemplo, não conteve as lágrimas ao ganhar um cordão do Gandhy Jandson Rabelo, que sai no bloco há doze anos. Ela estava acompanhada da amiga Marlene Barreto - que também chorou durante a passagem do bloco, afirmando que a força do Gandhy é algo que consegue desmontar até a sua personalidade forte."O Gandhy é amor, reciprocidade. Quando vestimos essa roupa temos que entender que é Gandhy e quem está de Gandhy. O nosso compromisso precisa ser o de levar momentos como esse para as ruas de nossa cidade, que já sofre tanto em seu dia-a-dia. Podemos nos satisfazer trocando um colar por um beijo? Sim. Mas isso é ser um Gandhy modinha. O bloco precisa estar preocupado em alegrar a todos, não a si mesmo", explicou o folião. Jandson beija a mão de Dona Arlinda, de 80 anos, presenteada com um colar e um afago do filho de Gandhy (Foto: Vinícius Nascimento/CORREIO) Quem também é experiente no bloco é  Sérgio Nonato. Aos 25 anos, ele convive com uma anemia falciforme desde que nasceu. O seu parto também foi complicado: por nascer prematuro, sofreu uma paralisia cerebral. Contudo, as dificuldades não se tornaram uma barreira completa para o rapaz. Muito pelo contrário, a família faz questão que ele seja muito ativo e Serginho só agradece.

Festeiro, neste ano já marcou presença no Furdunço e na Lavagem do Bonfim. Ontem, só não foi para a Pipoca das Cores de Saulo Fernandes porque a mãe não queria impor uma rotina muito pesada para ele no Carnaval. E, claro, além disso ainda tinha que desfilar no seu xodó: os Filhos de Gandhy. Com sorriso aberto, Sérgio Nonato aguardou a saída dos Filhos de Gandhy (Foto: Vinícius Nascimento/CORREIO) Em 2020, Serginho fez a sua quinta saída no bloco. E ele era só alegria. Devidamente fantasiado, chegou cedo para a concentração e ficou nas proximidades do Terreiro de Jesus esperando o Gandhy passar. Fez todo o circuito com uma animação de dar gosto.

Problemas no trio

Tudo corria bem no desfile do Gandhy, mas o afoxé enfrentou problemas técnicos logo após sua tradicional parada na Castro Alves.  Primeiro, o som dos instrumentos e vozes foi interrompido após um estrondo daqueles tipico de caixas de som pifando. Foram 20 minutos até o som retornar.

Mas logo depois o som voltou a parar. No primeiro retorno, o volume já estava baixo e logo depois cessou de vez. A partir daí, os seguidores do Gandhy seguiram caminhos diversos. Teve quem ficou aproveitando o pagodao que estava rolando  um mirante improvisado na Carlos Gomes e teve quem seguiu com o trio no mais estranho silêncio. 

Sócio do Gandhy há 25 anos, Cleidson Araújo afirmou que esse problema é coisa recorrente no trio e que se frustra sempre que acontece. "É desleixo histórico. Eles têm um ano para se preparar é sempre tem isso. Mas bola pra frente. Sempre resolve", afirmou. Mas teve gente que não contemporizou a falha técnica. Um grupo chegou a vaiar e fazer coro de "ei, fora" quando o trio passava no Edifício Sulacap. Para sorte de todo o mundo, o som voltou ainda durante o protesto e o trio seguiu em frente.

* Com orientação da editora Ana Cristina Pereira

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