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Nove dos 10 colégios públicos baianos com melhores notas no Enem são institutos federais


 

Entre as instituições federais, campus do IFBA em Brumado, no sudoeste baiano, foi destaque e obteve melhor desempenho

  • Larissa Almeida

Publicado em 19/10/2023 às 05:00:00
Campus do IFBA em Brumado obteve melhor desempenho no Enem em 2022 entre institutos federais baianos. Crédito: Divulgação

Um levantamento realizado pela edtech AIO Educação, com exclusividade para o CORREIO, revelou que nove dos 10 colégios públicos baianos com melhores notas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), em 2022, fazem parte do sistema federal de ensino. O Colégio Militar de Salvador (CMS) ocupa a primeira colocação da lista, com 651,33 de média alcançada. Já entre os institutos federais, o maior destaque é para um colégio situado no sudoeste do estado: o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia (IFBA) de Brumado, com média de 623,77.

Comandante do CMS, Coronel Carneiro conta que toda a estrutura do colégio possui um alinhamento estratégico para entregar aos alunos e alunas uma educação de qualidade, e que, no Enem, o foco da unidade de ensino é na formação continuada e progressiva. "Nesse sentido, no Ensino Médio, o aluno estuda e é submetido a avaliações que realizam a preparação consistente e gradual para o ENEM e demais vestibulares e concursos. Desse modo, os discentes passam, durante o ano, por avaliações que seguem o formato dos processos de seleção mencionados. Além disso, buscamos, de forma complementar, aplicação de simulados de caráter formativo e também parcerias com cursos preparatórios", frisa.

Inaugurado em 2016, o IFBA de Brumado conta com uma estrutura moderna de salas de aula, laboratórios e demais ambientes acadêmicos. Segundo Samuel Dias Dutra, diretor acadêmico do campus, esse aparato físico, junto ao modelo de ensino e empenho docente, proporciona boas condições de ensino, que são as responsáveis pelos desempenhos positivos dos alunos no Enem.

“Os bons resultados em processos seletivos acabam sendo uma consequência da qualidade do ensino ofertado. O ensino praticado nos cursos técnicos integrados parte da perspectiva da integração curricular, com atividades interdisciplinares e transversais, aulas em laboratórios, aulas de campo, visitas técnicas, projetos diversos. [...] Temos observado com orgulho os excelentes resultados dos nossos estudantes no Enem e demais processos seletivos, o que é motivo de alegria e sentimento de realização”, destaca.

Assistência estudantil

Além do ensino de qualidade, Samuel menciona a política de assistência estudantil  como uma das razões do sucesso, uma vez que confere aos estudantes em situação de vulnerabilidade social condições de permanência na unidade. “A disponibilização de auxílio moradia, auxílio transporte, auxílio psicológico, dentre outros, bem como o apoio da equipe técnico-pedagógica, [...] dão suporte aos estudantes e suas famílias na superação dos desafios inerentes ao processo de aprendizagem, visando a permanência e êxito dos discentes”, acrescenta.

No ranking, a terceira e quarta posição também são ocupadas pelo IFBA, no campus de Salvador e Camaçari, respectivamente. A sequência só é interrompida pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Baiano (IF Baiano), no campus Guanambi, que fica com a quinta posição, mas a soberania  é retomada e completa a lista com as unidades de Vitória da Conquista (6º), Santo Amaro (7º), Feira de Santana (8º), Seabra (9º) e Jacobina (10º).

Para Jancarlos Lapa, pró-reitor de Ensino do IFBA, o bom resultado dos alunos dos colégios da instituição no Enem se deve a experiência do Ensino Médio integrado à formação técnica. “Eu penso que a formação técnica, junto com a formação geral, estimula o estudante a fazer uma aprendizagem de qualidade, porque ele vai para além de uma preparação para entrar na universidade. Ele sai habilitado em alguma profissão”, diz.

No caso do  campus Salvador, o diretor geral Ives Lima também atribui o bom desempenho da unidade à formação integrada, mas enfatiza outros motivos, como a qualificação da equipe docente, acesso a atividades de pesquisa e extensão, e diversidade de eventos acadêmicos. “O IFBA não foca no vestibular e Enem, mas entende a formação discente de modo global com ênfase em todas as áreas do conhecimento. Os docentes que ministram as disciplinas comuns sempre dão uma atenção diferenciada ao formato de questões do Enem, além de simulados e olimpíadas de conhecimento em diversas áreas”, afirma.

Entre as 14 unidades do IF Baiano espalhadas pelo estado, a unidade situada no campus Guanambi foi a única a aparecer na lista de escolas públicas com melhores desempenhos no Enem em 2022. De acordo com Carlito Barros, diretor do campus, o diferencial do IF Baiano de Guanambi é a infraestrutura. “O campus Guanambi é o mais bem estruturado e se desenvolveu muito nos últimos anos com estruturas de laboratórios, investiu em qualificação de professores e tem o maior orçamento por conta disso. Isso tudo facilita a aprendizagem e, hoje, o Guanambi é o maior campus do IF Baiano”, ressalta.

Desafios

Apesar das boas médias obtidas no último Enem diante de outras escolas públicas, o foco dos institutos federais, de modo geral, não está na preparação para o exame que é porta de entrada de estudantes nas universidades do país. Conforme afirma Samuel Dias Dutra, isso acontece porque a missão do IFBA é oferecer uma “formação integral do cidadão em suas múltiplas dimensões: profissional, técnica, científica, social, humana, artística e cultural”.

Prestes a fazer a prova do Enem, Patrick Ryan, 17 anos, cursa o 3º ano do Ensino Médio no campus do IFBA em Salvador e não nega que a qualidade de ensino, para além da formação técnica, contribui para uma aprendizagem crítica. Ainda assim, ele admite que uma preparação mais específica no colégio faz falta. “Apesar de termos iniciativas pontuais no âmbito institucional de preparação, como aulões e simulados, eu sinto falta de uma amplitude maior dessas ações, bem como uma divulgação mais efetiva. [...] Um dos pontos negativos do IFBA é a alta carga horária, o que dificulta que o aluno tenha horários apenas para estudar para o Enem”, aponta.

A aluna Aline Reis, 19 anos, reforça o ponto de vista do colega. “A preparação está sendo um pouco desafiadora, pois sabemos que o foco principal do instituto não é o Enem, mas sim a formação técnica. [...] Mesmo assim, sinto que estou preparada para fazer o Enem devido ao repertório e preparo que venho adquirindo desde o primeiro ano do Ensino Médio, [mas] poderia estar mais”, pontua.

Ausência de escolas estaduais

Todas as 10 escolas públicas baianas que aparecem no ranking fazem parte do sistema federal de ensino e, ao mesmo tempo que anunciam a eficácia do ensino no sistema, também denunciam o baixo desempenho das escolas estaduais ausentes na listagem. Na visão da especialista em educação Arlete Ramos dos Santos, professora da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), isso acontece porque, nas escolas públicas estaduais, existe uma menor valorização dos professores e faltam garantias básicas de permanência para os alunos.

“Por exemplo, o Governo Estadual tem fechado as escolas do campo para trazer os alunos para as cidades próximas. Nessas cidades, a realidade desses alunos não é trabalhada e eles nem sempre têm uma merenda e transporte adequados para fazer esse percurso. Muitas vezes, o transporte quebra nas estradas e, quando chove, não tem como frequentar as aulas”, relata.

Ela ainda dá ênfase a diferença na preparação durante a pandemia e na infraestrutura das escolas estaduais em comparação com os institutos federais. “Falta infraestrutura nessas escolas para que esses alunos tenham de fato uma aprendizagem com base na integração entre teoria e prática. Nos últimos anos, na pandemia, os institutos federais e as escolas privadas tiveram acompanhamento mais efetivo do que as escolas estaduais”, frisa.

Outro ponto que a Arlete Ramos dos Santos chama atenção e influencia no desempenho apresentado pelos colégios baianos no Enem é a seleção que ocorre como condição para ingressar nos colégios da rede federal, que, segundo ela, já põe em vantagens alunos com melhor base educacional. Com políticas públicas traduzidas em infraestrutura e formação docente, além de apoio familiar e garantias de permanência, a especialista acredita que o desempenho se torna apenas consequência, como no caso do Colégio Militar de Salvador e dos institutos federais.

“Os diretores das escolas estaduais não podem fazer a mesma seleção que as escolas militares e institutos federais. Isso reflete no resultado, mas não quer dizer que as outras escolas públicas não têm condição. Se elas tivessem as mesmas condições que são dadas tanto nos institutos federais como nas escolas militares, certamente também as escolas estaduais alcançariam notas iguais ou superiores a essas escolas que têm esse padrão de educação com condições de infraestrutura e valorização maiores”, finaliza

A Secretaria de Educação do Estado da Bahia foi procurada duas vezes pela reportagem para se posicionar sobre a ausência de escolas estaduais na lista, mas não respondeu às tentativas. A Associação dos Professores Licenciados da Bahia também foi procurada para o mesmo pedido e não respondeu até o fechamento da reportagem. 

*Com orientação da subchefe de reportagem Monique Lôbo