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'A Bahia não anda com as próprias pernas hoje’, diz especialista sobre situação financeira do estado

Antonio Silva Magalhães Ribeiro, que é pesquisador e professor da Uefs, faz um alerta sobre o desequilíbrio fiscal na Bahia

  • Foto do(a) author(a) Rodrigo Daniel Silva
  • Rodrigo Daniel Silva

Publicado em 10 de julho de 2025 às 05:30

Antonio Silva Maga- lhães Ribeiro
Antonio Silva Magalhães Ribeiro, pesquisador e professor da Uefs Crédito: Arisson Marinho/CORREIO

Pesquisador de finanças públicas e professor assistente da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs), Antonio Silva Magalhães Ribeiro faz um alerta sobre o desequilíbrio fiscal na Bahia. Segundo ele, as despesas do estado vêm crescendo em ritmo muito superior ao das receitas.

Ribeiro afirma que a situação só não é mais grave por causa dos sucessivos pedidos de empréstimos feitos pelos governos estaduais. No entanto, ele adverte que esse endividamento compromete o futuro das finanças públicas, já que, além do valor principal, os cofres estaduais precisam arcar com juros elevados.

O especialista também aponta erro na gestão do governador Jerônimo Rodrigues (PT), seu colega na Uefs, por não ter promovido um enxugamento da máquina pública após assumir o cargo em 2023. Ele vê ainda excessos de “bondades eleitorais” realizadas principalmente em 2022, durante o governo Rui Costa (PT), como fatores que contribuíram para agravar o desequilíbrio fiscal do estado.

“Sempre tivemos um relacionamento cortês e civilizado, embora com posições políticas diferentes. Não obstante o bom relacionamento pessoal que sempre tivemos, é preciso deixar claro que eu, no lugar do governador, faria diferente”, diz.

O senhor tem chamado atenção para o ritmo acelerado do crescimento da dívida consolidada da Bahia. Por que esse aumento preocupa? Qual é, hoje, a real situação fiscal do estado?

Analisando aqui, se nós fizermos um balanço, de 2007 até 2024, o estado da Bahia arrecadou R$ 77 bilhões e gastou R$ 75 bilhões. Até aí tudo bem. E já recentemente, em 2023 e 2024, arrecadou R$ 14,9 bilhões e gastou R$ 15,2 bilhões, já superou. Isso aqui é um balanço contando com as receitas das operações de crédito.

Ou seja, dentro aqui, já tem empréstimos, financiamentos e etc. A gente percebe que, por exemplo, os juros e encargos da dívida saltaram de R$ 567 milhões em 2021 para R$ 915 milhões em 2022, para R$ 1,536 bilhão em 2023 e R$ 1,764 bilhão em 2024. Então, vemos o salto que essa despesa deu dos juros e encargos. Eu não estou falando da amortização da dívida. Quando somamos os juros, encargos e as parcelas de amortização, esse valor saiu de R$ 1,9 bilhão em 2021 para R$ 3,296 bilhões em 2024.

Aqui na Bahia, sempre em déficit, mas até 2021 era mais tranquilo. De 2021 para cá, as coisas ficaram mais difíceis

Antonio Silva Magalhães Ribeiro

Pesquisador e professor da Uefs

Se não considerar as operações de crédito nos últimos 18 anos, tivemos, pelo menos, 15 anos deficitários. Então, o que eu quero dizer com isso? Está havendo um desequilíbrio já há algum tempo. Tomar empréstimo, financiamento, fazer operações de crédito não é nenhum crime. Mas isso tem que estar dentro de um planejamento de longo prazo.

Se considerar de 2014 a 2022 (último ano do governo Jaques Wagner até o último do governo Rui Costa), a receita total do estado da Bahia cresceu 88,9%. Mas a despesa total cresceu 98%. Quer dizer 10% a mais do que as receitas. Nos dois últimos anos (2023 e 2024), a receita total cresceu 4,2% e as despesas 4,7%. Então, vemos um descompasso entre o crescimento da receita e o crescimento da despesa.

Vemos um descompasso entre o crescimento da receita e o crescimento da despesa

Antonio Silva Magalhães Ribeiro

Pesquisador e professor da Uefs

O que tem provocado o aumento da despesa?

É um avanço muito significativo na despesa em pouco tempo. Se nós formos apurar, temos dois ou três itens que me chamam a atenção. Um é a despesa com a contração de pessoal - não estou falando em concursados -, estou falando em Reda, contratos de terceirização, serviço de pessoa física e locação de mão de obra.

A locação de mão de obra que em 2018 estava R$ 814 milhões dobrou para R$ 1,702 bilhão em 2024. Mais do que dobrou. Essa locação de mão de obra é para serviços gerais, como segurança. O Reda, que estava em R$ 651 milhões em 2018, está em R$ 1,716 bilhão em 2024. No conjunto, todas essas contratações, nos últimos 10 anos (2014-2024), cresceram 188%.

Outro item que me espanta são as subvenções sociais e econômicas (transferência de recursos para atender as entidades públicas e privadas). Essa transferência para instituições sem fins lucrativos teve um aumento, de 2014 para 2022, de 510%. Estava em R$ 284 milhões em 2018, pulou para R$ 1,416 bilhão em 2022, e R$ 2,532 em 2024. É um pulo muito elevado. O crescimento das despesas tem que estar ali próximo do crescimento das receitas. Eu acho um crescimento muito elevado.

Em 2022, criou-se uma rubrica de contratos de gestão. Começou em 2022 com R$ 783 milhões. Em 2024, chegou a R$ 1, 768 bilhão. Nesses três anos (2022 a 2024), houve um gasto de R$ 3,892 bilhões. As subvenções econômicas, nos três últimos anos, atingiram R$ 1, 744 bilhões. As subvenções sociais saíram de R$ 80 milhões em 2022, R$ 89 milhões em 2023, e R$ 155 milhões em 2024.

Tem também as transferências para instituições com fins lucrativos. As instituições com fins lucrativos saíram de R$ 252 milhões em 2018 para R$ 628 milhões em 2024. É uma elevação gigantesca. No total, eu tenho computado aqui que todos esses gastos, contribuições, subvenções sociais, subvenções econômicas e auxílios tiveram um reajuste de mais de 400% de 2014 a 2022.

Antonio Silva Magalhães Ribeiro, pesquisador e professor da Uefs
Antonio Silva Magalhães Ribeiro, pesquisador e professor da Uefs Crédito: Arisson Marinho/CORREIO

As parcerias público-privadas são apontadas como modelos de sucesso na Bahia. O senhor concorda?

São instrumentos importantes quando o estado, o município, o país precisam de investimento. Isso é muito bom para investimentos em infraestrutura. Infraestrutura gera investimentos, multiplica o investimento, movimenta uma elevada soma de recursos e gera emprego. Então, as PPPs têm esse aspecto interessante. Só que as PPPs da Bahia, elas também crescem no ritmo em descompasso com as receitas. Em 2011, quando essas PPPs começaram, foram gastos R$ 139 milhões e significavam 0,7% da receita corrente líquida. Esses R$ 139 milhões saltaram para R$ 1,527 bilhão em 2024. Isso já significa 2,35% da receita líquida. Então, vai ocupando a receita corrente líquida. A minha preocupação é com o avanço das despesas que provocam, sendo que as receitas não estão correspondendo. A velocidade do crescimento das despesas não é a velocidade do crescimento das receitas.

E como está a situação da dívida total do estado?

A dívida total saiu em 2014 de R$ 16,9 bilhões para R$ 35,2 bilhões em 2024. Mais do que dobrou em 10 anos. De 2006 para 2014, ou seja oito anos, houve um crescimento médio anual de 4,83%. De 2014 a 2022, também oito anos, o crescimento médio anual já foi 8,58%. Olha só, quase o dobro. Nos dois últimos anos, nós tivemos uma média anual de 11,81%. Ou seja, há um crescimento preocupante. O pagamento dessa dívida implica juros, encargos e amortização. Em 2020, o custo dessa dívida era de R$ 1,473 bilhão. Em 2022, já eram R$ 2,222 bilhões. E, em 2024, R$ 3,296 bilhões.

Qual a consequência desse aumento da dívida para o futuro?

A consequência é que essa dívida tem um custo e cria uma despesa financeira. É uma despesa que não resolve o problema do futuro. Se esse custo financeiro da dívida for aumentando para além da receita, o problema é que vai ter que começar a tirar dinheiro de alguma área para pagar os seus compromissos. Eu estava olhando que, em 2022, a assistência social tinha 0,41% da receita corrente líquida. Em 2023, já caiu para 0,31%. O transporte, em 2022, era 4,21%. Em 2023, já foi 3,56%. Então, tem que sair de algum lugar esse dinheiro. Não dá para fazer uma análise completa do orçamento, mas eu vi que essas duas funções de governo - assistência social e transporte - sofreram perdas de 2022 para 2023.

O senhor considera que a Bahia tem conseguido caminhar com recursos próprios?

A Bahia não anda com as próprias pernas hoje. Está sempre precisando de operações de crédito. Eu diria que as dificuldades são inerentes. Mas há exemplos de estados, por exemplo, como o Espírito Santo, que conseguiu equilibrar as suas contas sem provocar endividamento, sem nada. As dificuldades existem, mas é preciso encarar e tentar reverter. Não se pode aprofundar as dificuldades. A visão de um técnico é diferente da visão dos políticos. Esses não gostam muito de falar em redução de despesas. Eles têm seus projetos eleitorais e nem sempre estão muito preocupados com o equilíbrio das contas. Eu não vejo ninguém discursar pedindo que se atente para os desequilíbrios (financeiros).

Antonio Silva Maga- lhães Ribeiro
Antonio Silva Magalhães Ribeiro, pesquisador e professor da Uefs Crédito: Arisson Marinho/CORREIO

O estado corre algum risco de insolvência, como aconteceu no Rio Grande do Sul?

A curto prazo, não. Ainda há tempo de reverter isso. No Rio Grande do Sul, a gestão, que antecedeu o atual governador, foi uma gestão muito temerária. Aqui na Bahia, sempre em déficit, mas até 2021 era mais tranquilo. De 2021 para cá, as coisas ficaram mais difíceis.

Não sei quais prioridades foram estabelecidas pelo governador, mas sinto que algumas opções do seu antecessor deveriam ser alteradas

Antonio Silva Magalhães Ribeiro

Pesquisador e professor da Uefs

O governador Jerônimo Rodrigues deveria ter feito um plano de corte de gastos depois de eleito?

Sim. Todo governante, ao ser eleito, deve fazer uma radiografia da realidade e planejar o futuro. Não sei quais prioridades foram estabelecidas pelo governador, mas sinto que algumas opções do seu antecessor deveriam ser alteradas. Alguns gastos em 2022 foram desproporcionais e de qualidade zero, se analisados sob a ótica da qualidade dos gastos. Até hoje, embora estudioso do tema, não consegui - talvez por insuficiência minha - saber que despesas foram enquadradas na subfunção denominada de “outros encargos especiais”, em 2022, com todos os seus bilhões.

Um estado que passa sete anos sem dar reajuste (ao servidor público) é para fazer uma poupança

Antonio Silva Magalhães Ribeiro

Pesquisador e professor da Uefs

Durante o governo de Rui Costa, atual ministro da Casa Civil, a Bahia ficou sem reajustar o salário dos servidores estaduais. Isso não deveria ter ajudado as contas públicas?

O gasto com servidor público é o maior item de despesa de um governo. E tivemos sete anos sem reajuste sequer pela inflação. Ora, um estado que passa sete anos sem dar reajuste é para fazer uma poupança fantástica. Era para fazer uma poupança magnífica. E além disso (não dar o reajuste), ainda cortou a contribuição do Planserv.

O senhor tem criticado o excesso de bondades eleitorais. Isso tem afetado as contas públicas estaduais?

Bondade eleitoral é um termo que se usa para quando se quer fazer bondades, sem que o orçamento esteja preparado para isso. O que eu notei aqui é que, em 2022, as subvenções crescem assustadoramente. As contratações crescem assustadoramente também. A propaganda e a publicidade crescem assustadoramente. Elas saíram de R$ 159 milhões em 2019 para R$ 215 milhões em 2022.

As emendas parlamentares no orçamento federal têm sido alvo de muitas críticas. Esse modelo tem impactado também o orçamento da Bahia?

Eu sou um crítico dessas emendas a nível nacional. Em 1964, os militares cortaram essas emendas parlamentares. Disseram que havia muita corrupção. Eu sou professor há muito tempo e sempre critiquei isso. Acompanho essas emendas parlamentares a nível federal e a nível estadual também. E hoje, por mim, acabava tudo isso e recomeçava com novas bases.

Em 2020, as emendas orçamentárias da Bahia custavam R$ 74 milhões aos contribuintes. Em 2024, foi para R$ 370 milhões empenhados. De R$ 74 milhões para R$ 370 milhões, isso significa um aumento de 400%, comprometendo o orçamento. Tudo isso é orçamentário. Só de 2023 para 2024, saiu de R$ 123 milhões para R$ 370 milhões. Isso é um aumento de 200% em um ano. Nenhum ente federativo suporta isso.

Antonio Silva Magalhães Ribeiro é graduado em Administração de Empresas pela Universidade Católica do Salvador. Mestre em Administração pela Universidade Federal da Bahia e doutor em Sociologia Econômica pelo Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa. Atualmente é consultor e professor assistente da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs). É um estudioso dos temas: governança, finanças públicas, administração pública e planejamento governamental.