Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Maria Raquel Brito
Publicado em 16 de setembro de 2025 às 05:00
Em janeiro deste ano, o trabalhador Pedro Alves do Rosário, de 40 anos, morreu ao ser eletrocutado enquanto manuseava uma extensão elétrica durante a montagem de um show em Salvador. Testemunhas disseram que ele não utilizava os equipamentos de proteção individual necessários para o serviço que estava prestando. Segundo Brenda Alves, filha de Pedro, o pai não tinha formação técnica para trabalhar com eletricidade. >
“Eu sabia que ele estava trabalhando no show, mas achei que fosse apenas com a montagem do palco. Sem a parte elétrica”, comentou, à época, em entrevista ao CORREIO. De acordo com Brenda, o pai foi obrigado a trabalhar como instalador no show da banda Menos é Mais sem ter sido ofertado qualquer curso ou capacitação em rede elétrica. A família processou a empresa terceirizada para a qual Pedro estava trabalhando na ocasião.>
O caso de Pedro Alves do Rosário está longe de ser o único acidente de trabalho registrado na Bahia em 2025. Entre janeiro e o dia 10 de agosto, 10.187 acidentes de trabalho e doenças ocupacionais foram comunicados por empregadores baianos através do Canal de Denúncia Trabalhista do Ministério do Trabalho e Emprego. Nesse mesmo período, 63 óbitos decorrentes de acidentes foram notificados por empregadores.>
Conforme o número de denúncias, foram registrados este ano, em média, 1.390 acidentes de trabalho por mês. O índice é 10,3% maior que a média do ano passado, quando foram notificadas, entre janeiro e dezembro, 15.123 ocorrências. >
O número inclui também doenças ocupacionais, aquelas desencadeadas por determinadas atividades laborais em função da existência de riscos inerentes a elas, como enfermidades relacionadas à ergonomia - a exemplo das lesões por esforços repetitivos (LER) - e às doenças mentais.>
De acordo com Aldemiro Palma, especialista em Engenharia de Segurança e professor doutor dos cursos de Engenharia da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) e do Instituto Federal da Bahia (IFBA), a grande quantidade de acidentes de trabalho no estado pode ser associada às mudanças de modos operatórios e formas de trabalho, como terceirização, contratos temporários e inovações tecnológicas.>
“Também ao aumento da contratação de empresas de médio porte e micro empresas terceirizadas, que não possuem os mesmos padrões de segurança das empresas contratantes”, completa.>
A falta de segurança para os trabalhadores é refletida no ofício da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego na Bahia (SRTE/BA), que investiga acidentes de trabalho e adoecimento. Segundo o órgão, entre abril de 2024 e abril de 2025, 113 empresas foram embargadas ou interditadas por auditores-fiscais do trabalho em virtude da constatação de grave e iminente risco à vida dos trabalhadores. >
Idealizado pela iniciativa SmartLab de Trabalho Decente, o Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho reúne informações sobre as atividades com maior número de acidentes e afastamentos e os principais motivos de lesões. As informações têm como base registros de acidentes de trabalho do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).>
A reportagem entrou em contato com o Tribunal Regional do Trabalho, a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego na Bahia e o Ministério do Trabalho e Emprego em busca de dados mais atuais e detalhados em relação aos acidentes de trabalho na Bahia, como as principais causas e as faixas etárias mais afetadas, mas todos afirmaram não haver tempo hábil para conseguir as informações. >
Segundo o Observatório, a ocupação com mais acidentes de trabalho na Bahia entre 2012 e 2024 – ano mais recente das análises – foi a de técnico de enfermagem, com mais de 12 mil registros. Neste mesmo intervalo, os serventes de obras foram os trabalhadores com mais afastamentos acidentários, um total de 3.281 concessões. >
Silvia Isabelle Teixeira, juíza do trabalho e gestora do Programa Trabalho Seguro na Bahia, diz que faz sentido que os técnicos de enfermagem estejam no topo do ranking, devido à alta rotatividade da profissão, “com muito descumprimento das normas de segurança do trabalho”.>
Teixeira acredita haver uma subnotificação histórica no número de acidentes na Bahia. “Os empregados não têm plena proteção contra a despedida arbitrária e ficam com medo de acionar o Judiciário ou fazer denúncia ao MPT, ainda que isso possa ser feito de forma anônima”, diz. >
O professor Aldemiro Palma concorda. Segundo ele, empresas que não possuem serviços especializados de Segurança e Saúde do Trabalho não costumam fazer anualmente as estatísticas de acidentes conforme as normas e nem emitem a Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT) em acidentes sem afastamento.>
Para evitar acidentes e garantir a integridade física dos trabalhadores, há uma série de comportamentos que as empresas podem seguir. Palma enumera alguns: “cumprir rigorosamente a legislação trabalhista e previdenciária, investir em treinamentos e capacitação profissional, difundir o pensamento prevencionista através de campanhas de segurança, realizar avaliação e controle de riscos nos ambientes de trabalho com medidas mitigadoras das condições, atos e fatores pessoais de segurança”.>