Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Carolina Cerqueira
Publicado em 7 de julho de 2024 às 05:00
Ao apertar o play, o ouvinte é atingido por uma enxurrada de instrumentos diferentes. É difícil identificar quais são eles e que ritmo é esse. Mas é muito fácil começar a remexer o corpo sem nem se dar conta. Em “Quarenteniando”, são 50 segundos de puro instrumental e, quando chega o refrão repetitivo com adicional de voz, a vontade é sair dançando e cantando por aí. >
Lançada em 2021 e com 7.346 players, é a música mais ouvida do grupo Sonora Amaralina, no Spotify. Ela se junta a outras três canções lançadas em 2023 na plataforma: “El Ritual de La Cumbia”, “O Tchê” e “Quebra Coco”. >
O grupo nasceu há seis anos, no bairro de Amaralina, em Salvador, como um reduto da Colômbia. A semente foi a cumbia. Para os não familiarizados com a palavra, ela representa um gênero musical colombiano com raízes africanas e indígenas, que se espalhou pela América Latina.>
Mesmo não comum na Bahia, atravessou o continente de oeste a leste e chegou à capital do estado como expressão de resistência não só de colombianos, mas também chilenos, argentinos, uruguaios e quem mais aparecer. >
A banda Sonora Amaralina mantém as portas abertas para os integrantes que vêm e vão. Com um mínimo de 11 músicos, o grupo funciona como uma orquestra. Como os movimentos das ondas sonoras, a equipe é flutuante. Quem está de passagem, seja por um intercâmbio, seja por uma viagem mais longa, pode chegar, desde que saiba tocar. >
Não precisa nem encontrar um idioma para se comunicar, a música é a língua universal, destaca a clarinetista Daniela Natali, de 30 anos. >
“Agora estamos com um alemão tocando sax tenor. Outro dia eu estava falando e falando e ele rindo porque não estava entendendo nada. Quando começamos a tocar, tudo fluiu porque a partitura é universal; é através da música que a gente conversa”, diz ela, que nasceu em América Dourada, no interior da Bahia. >
O trombonista e diretor musical do grupo, Matias Traut, de 37 anos, veio da Argentina e mora em Salvador há 11 anos. Ele conta que já tocou com Carlinhos Brown, Saulo e BaianaSystem e hoje se junta a Jau e Rumpilezz. Assim a cumbia vai ganhando ares de baianidade. >
“A gente tem como base a cumbia da Colômbia, mas também trazemos traços da cumbia do México, da Argentina, de todos os cantos”, diz ele. O responsável pelo sax, Gleison Coelho, de 33 anos, acrescenta que também buscam referências na música baiana. No repertório, estão adaptações dos sons de Gerônimo Santana, Riachão e Timbalada. >
“Uma orquestra de cumbia na Bahia não vai ser isenta, seja na forma como formulamos uma frase, seja na forma como os percursionistas tocam. Por mais que se tentasse uma cumbia original, ela está impregnada de Bahia”, diz ele, que veio de Aramari, no interior do estado. >
O público >
Mesmo com a mistura, os integrantes da Sonora Amaralina contam que o público se surpreende com o ritmo inusitado e quem ouve pela primeira vez fica se perguntando: “Que som é esse?”. “No início, eles ficam curiosos, tentando entender. Mas, aos pouquinhos, vai contagiando e eles se integram ao ritmo, começam a dançar e se divertir”, diz Matias. >
No show que o CORREIO acompanhou, na Casa da Mãe, foi assim. Teve quem dançasse sozinho como se não estivesse sendo visto, quem dançasse com o grupo de amigos e quem preferisse curtir o calor humano do ritmo latino coladinho com um parceiro. >
O responsável pelas congas, Marcel Moron, de 46 anos, ressalta: “Tocamos para fazer uma festa”. O festejo é do tipo que tem público eclético. “Tem aqueles fiéis, que estão em todos os shows, e outros que acabam chegando sem conhecer, estão de passagem”, diz ele, que é uruguaio e está em Salvador há 20 anos. >
No improviso >
As apresentações são no esquema de improviso. Quando se juntaram, os músicos ensaiaram por um mês e se jogaram de cabeça. Começaram tocando no Bar Velho Espanha, depois no Mercadão e ainda na Casa da Mãe. Agora, tocam aos domingos na Casa da Felicidade, no Rio Vermelho. Sem ensaios. >
“Os ensaios ficaram ali no primeiro mês. Depois disso, não conseguimos reunir tanta gente no mesmo dia e horário, sem ser nas apresentações. As partituras ficam ali e quem chega toca. É um improviso que dá certo”, diz Matias. >
Quando tem uma música nova, eles compartilham foto das partituras no grupo de mensagens, mandam áudios uns para os outros. Chegam alguns minutos antes da apresentação para passar o som e checar se a música nova funciona. >
Todos ali estão envolvidos em outras atividades profissionais. “Na Sonora Amaralina, não estamos pelo retorno financeiro. Estamos pela vontade de tocar mesmo, com amor pela música, vontade de fazer um projeto relevante”, diz Gleison. “A paixão pela música está em primeiro lugar, é isso que nos faz querer fazer da melhor maneira possível”, complementa Daniela. >
Com traços de um coletivo musical, a Sonora Amaralina não tem empresário e nem produtor. Ela quer crescer, furar a bolha, mas não de qualquer forma. >
“O som que fazemos está fora do padrão dos streamings. Tem muitos instrumentos, não tem muito eletrônico e carrega uma tradição. Eu acredito que somos mais um coletivo musical, não somos uma banda convencional”, destaca Gleison. >
Instagram: @sonoraamaralina >
Telefone: (71) 98508-4335 >
Todos os domingos, a partir das 20h, na Casa da Felicidade, no Rio Vermelho >