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'Não estou na TV por ser novinha', diz atriz Edvana Carvalho, aos 57 anos

Ela está no ar com a personagem Eunice no remake da novela Vale Tudo

  • Foto do(a) author(a) Carolina Cerqueira
  • Carolina Cerqueira

Publicado em 10 de agosto de 2025 às 05:00

Edvana Carvalho tem dois filhos e dois netos
Edvana Carvalho tem dois filhos e dois netos Crédito: Roberto Cunha

Edvana não se ilude: “A minha beleza não é determinante para que eu seja atriz, nunca foi”, diz ela, que celebra as rugas e as manchas de melasma que o tempo a concedeu. Aos 57 anos, a atriz baiana acredita ainda ter muitos personagens pela frente, já que, nas palavras dela, o racismo a impediu de fazer sucesso ainda jovem.

Integrante da primeira formação do Bando de Teatro Olodum, em 1990, ela, além de outros trabalhos, atuou no primeiro e segundo filmes “Ó, Paí, Ó”, interpretou a personagem Inácia no remake da novela Renascer de 2024 e agora dá vida à personagem Eunice no remake de Vale Tudo, da TV Globo.

Eunice é estilista, ativa no mercado de trabalho, e atuou como modelo madura em uma campanha da agência Tomorrow, levantando discussões sobre etarismo. Para Edvana, a casa dos 50 anos é uma oportunidade de liberdade e redescobrimento. A atriz, que tem pós-graduação em psicopedagogia e forte conexão com a educação, é atualmente mestranda em Dramaturgia pela Universidade Federal da Bahia (Ufba).

“Eu tenho aberto mão de coisas e pessoas que eu sei que podem me fazer mal. Fica mais fácil dizer não sem sentir culpa. Você não precisa ficar agradando, você precisa fazer as coisas boas para você. Você não fica com medo de perder amizades, não fica com medo de perder amores. Você se basta mais”, diz ela.

Foi assim, vivendo espontaneamente, que Edvana virou meme sem nem saber o que essa palavra significava. O bordão “É a Bahia!” se espalhou pela internet em 2024 numa velocidade difícil de acompanhar. Até hoje, a atriz relata receber vídeos reproduzindo a cena em inglês, espanhol, francês e até alemão.

Tudo graças a um vídeo de bastidor filmado por Edvana com o celular durante um intervalo das filmagens de “Ó, Paí, Ó 2”. No vídeo, Edvana interage com uma baiana de acarajé, perguntando se tem quitute pronto para comprar. Quando a baiana responde que só vai ter no final da tarde, Edvana responde: “É a Bahia!”.

O bordão passou a ser utilizado nas mais diversas situações e virou até música no Carnaval de 2025. Na parceria de Parangolé, Escandurras e La Fúria, a Bahia é celebrada como o melhor do lugar do mundo. “O Rio de Janeiro continua lindo, o São Paulo é o Brasil, e a Bahia é o mundo. O melhor lugar do mundo é a Bahia, porra!”, diz a letra.

Nesta entrevista, Edvana conta os bastidores do meme e o que é, para ela, essa Bahia do bordão. Compartilha os desafios da profissão e fala sobre saúde mental sem amarras. Conheça mais sobre a atriz soteropolitana que foi criada nos bairros Curuzu e na Liberdade, filha de Seu Ivan e Dona Edna, que tem dois filhos (Luana e Davi Sol) e dois netos (Lorenzo, de 8 anos, e Leo, de 7 meses).

No ano passado, você viralizou com o vídeo “É a Bahia!”. Conta os bastidores desse vídeo?

No primeiro “Ó, Paí, Ó”, tanto na peça quanto no filme, tem a clássica cena da Lúcia, uma baiana de receptivo, que é a minha personagem, com uma baiana de acarajé, interpretada por Rejane Maia. No “Ó, Paí, Ó 2”, não tinha no roteiro essa cena das duas baianas e é uma cena de sucesso no primeiro filme. Quando eu vi que não ia ter, eu brinquei com Rejane dentro do contexto da cena do primeiro filme e filmei. Fizemos um making off ali, um bastidor. Esse vídeo ficou guardado e, quando o filme ia estrear no Rio de Janeiro, publiquei. Aí viralizou de uma forma que hoje em dia eu recebo ele em espanhol, inglês, francês, alemão. Já recebi até um vídeo com bonequinhos de videogame fazendo a cena. Aí usam para tudo. Se tem polícia correndo atrás de bandido, é a Bahia. Se tem um destino turístico bonito, é a Bahia.

Como você soube que estava viralizando e o que achou disso?

Eu liguei para a minha filha quase chorando, perguntando o que era aquilo que estava acontecendo na internet comigo. Aí ela deu risada e disse que eu tinha virado meme. Eu perguntei: ‘E isso é ruim?’. E ela respondeu: ‘Não. Dê graças a Deus que o seu meme é positivo’.

O que é a Bahia desse bordão?

Cada um dá a interpretação que quer. Mas eu acho que a baiana de acarajé é um dos símbolos mais fortes e potentes que a gente tem de resiliência, de emancipação e de luta da mulher negra na nossa sociedade. As primeiras que vendiam os bolinhos de fogo de iansã e os quitutes dos tabuleiros foram as mulheres negras empreendedoras. Elas são muito independentes, têm personalidade forte. Então, a Bahia que eu falo é a Bahia nesse lugar de que não se sobra, não se vende pelo dinheiro. Ela está ali no seu negócio e é a gente que tem que se adequar a ela e não ela ao cliente, sabe? Tem essa realeza nas baianas de acarajé espalhadas por Salvador e pela Bahia. É uma coisa sagrada, não é do jeito que você quer só porque você está pagando. É a Bahia, viu, sacana? A Bahia é assim, não venha, não!

Você fez Inácia em Renascer e a personagem fez muito sucesso. Agora, você faz Eunice em Vale Tudo. As duas novelas são remakes. Quais são os principais desafios de cada personagem?

Fazer remake é sempre um desafio a mais porque as pessoas já criticam novas histórias, imagine remake. A população brasileira é muito exigente, então, quando você faz um remake, tem o medo da crítica ainda maio. Mas, ao mesmo tempo, eu acho um presente na minha vida fazer essas duas novelas. Lá atrás, aquela minha menina, a minha adolescente que fazia teatro desde os 16 anos e já queria estar na tela fazendo novela tinha esse mundo como algo muito longe. Eu adoraria estar ali fazendo a primeira versão de Renascer, mas era muito longe. Deus foi muito generoso comigo falando que naquela hora eu não iria, mas um dia eu iria fazer Renascer e Vale Tudo.

A personagem Eunice é uma costureira que debate o mercado de trabalho depois dos 50+. Ela foi modelo madura de uma campanha da Revista Tomorrow, também debatendo beleza e envelhecimento. O que você busca passar ao público ao ser representante dessas pautas nas telinhas?

Eunice mostra que o etarismo é uma construção misógina, machista, patriarcal do mundo. Ela vem quebrando essas barreiras. Aos 50, ela é estilista, modelo, está se redescobrindo num outro tipo de 50 anos que não é igual ao de antigamente. Quando eu era criança, quem tinha 50 ou 60 anos era considerado velho. Hoje, essa idade é tempo de liberdade, até de começar uma profissão nova ou se curar de tantos anos trabalhando. Eu sou uma mulher de quebrar paradigmas, eu meto o pé na porta e vou. Acho que a Inácia e Eunice são fortes assim também.

Você está com 57 anos. Como tem lidado com o envelhecimento?

É sempre uma questão envelhecer. As pessoas gostariam de ficar jovens eternamente ou pelo menos com aparência jovem. Então, tem questões, sim. Você precisa ficar mais atenta ao seu corpo, precisa abrir mão de certos costumes. Vai ter que ter mais atenção e carinho com você. Eu tenho lidado com isso da forma que eu posso, me exercitando fisicamente e procurando ter uma mente mais saudável. Eu tenho aberto mão de coisas e pessoas que eu sei que podem me fazer mal. Fica mais fácil dizer não sem sentir culpa. Você não precisa ficar agradando, você precisa fazer as coisas boas para você. Você não fica com medo de perder amizades, não fica com medo de perder amores. Você se basta mais.

Na peça ‘Aos 50 Quem Me Aguenta?’, você discute esse tema também passando pela questão da cor da pele. Quais as particularidade que você percebe no envelhecimento de uma mulher preta?

Tudo para a gente é mais difícil, do nascimento à morte. A gente passa a vida inteira sofrendo mais do que pessoas não pretas. Em todas as instâncias, em todos os lugares, mesmo quando você fica famosa, mesmo se você tiver grana. Mas eu não mudaria nada no meu tom de pele, quem tem que mudar é a sociedade esse jeito de pensar. Está cafona isso. Esse negócio de ser racista e homofóbico está cafona, isso já foi. mais.

Tem sentido o impacto do envelhecimento na profissão?

Como, estruturalmente, o racismo me impediu de chegar antes, quando eu era mais jovem, aí eu estou me lixando agora para isso de estar mais velha. Eu não estou na televisão porque sou novinha, não estou porque sou malhadinha. Então, envelhecer não vai fazer diferença nos textos que eu posso interpretar, nos personagens que eu posso fazer. A minha beleza não é determinante para que eu seja atriz, nunca foi. Para mim, é até melhor porque, como todo mundo quer se manter jovem, se eu vou envelhecendo, vai tendo papel para mim, vai ter muito espaço para mim com as minhas rugas e minha cara manchada de melasma.

A educação é algo muito forte na sua vida. Você tem pós-graduação em psicopedagogia, deu aulas na rede pública e tem projetos em uma escola municipal de Salvador. O que te faz se dedicar também a isso e não só ao trabalho como atriz?

Eu atuei como professora de teatro em escola pública municipal de Fundamental 1 por 21 anos. Eu amo isso. Eu tenho hoje colegas de trabalho que foram meus alunos. Hoje, eu não estou mais em sala de aula, mas me mantenho como parte da coordenação pedagógica da Escola Municipal Padre Confa, em Salvador, como um apoio. Eu desenvolvo projetos lá, como Roda de Conversa, levando uma vez por mês um profissional para discutir com as crianças, os pais, a comunidade. Sempre procuro estar movimentando a escola de alguma forma. Por mais que eu esteja readaptada à nova configuração, fora da sala, eu não consigo ficar sentada numa cadeira sem fazer nada, não consigo ficar parada. Eu preciso me sentir viva dentro da educação. E eu acho muito forte que as crianças tenham uma referência negra que deu certo e está perto delas. Por isso eu gosto de estar perto das minhas crianças. É através da escola que eu cheguei até aqui; se não fosse pelo estudo, eu não ia estar dando essa entrevista. Educação liberta, arte liberta. Juntar os dois, então, é um poder incrível.

Você está fazendo mestrado em dramaturgia na Ufba. O que te move a continuar se qualificando?

O meu mestrado tem a ver com a minha peça ‘Aos 50 – Quem Me Aguenta?’ porque eu escrevi ela quando estava entrando nos 50 anos, com meus hormônios se desorganizando todos. Eu adoeci, tive síndrome do pânico, um princípio de depressão, fui para psiquiatra e psicólogo. Em 2019, eu me via dentro do carro na frente da escola sem querer entrar. Quando eu conseguia entrar, me trancava na sala e chorava. Era uma época em que estavam acontecendo muitas violências físicas contra professores em sala e eu estava trabalhando os três turnos na escola. Comecei a adoecer mesmo, fui procurar ajuda médica e foi difícil aceitar o diagnóstico. Eu não acreditava que eu estava entrando numa depressão porque eu sempre fui muito alegre e solar, não acreditava que aquilo poderia acontecer comigo. E, no meu processo de cura, o teatro e a escrita foram fundamentais, tiraram vários gritos da minha garganta. Foi aí que escrevi meu espetáculo. Escrevi para não pirar. E decidi levar isso para o mestrado, com a pesquisa ‘Aos 50 – Quem Me Aguenta à luz da escrevivência da professora Conceição Evaristo’, para revisitar a criação desse texto para que outras mulheres pretas, ao lerem minha pesquisa, possam pensar ‘poxa, se ela fez, também vou fazer’.