60+

Nem dente de rei escapa: por que idosos têm mais complicações com saúde bucal

Veja quais cuidados devem ser tomados e os alertas feitos pelos dentistas

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  • Carolina Cerqueira

Publicado em 6 de abril de 2024 às 13:00

Má higienização pode levar a periodontite, cárie e candidíase oral
Má higienização pode levar a periodontite, cárie e candidíase oral Crédito: Reprodução/YouTube Record Europa

Esta semana, os dentes “tortos” do rei Charles III, de 74 anos, roubaram a cena na primeira grande aparição pública do monarca desde o início de fevereiro. No último dia 15, foi a vez dos dentes “amarelados” da ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Carmen Lúcia, de 69 anos, virarem assunto.

Mas, afinal, os 60+ têm mesmo os dentes mais comprometidos? Dentistas garantem que sim e o cenário impulsiona, inclusive, a especialidade de odontogeriatria no mercado de trabalho.

Confira seis perguntas e respostas que explicam por que os idosos estão sob maior risco de comprometimento da saúde bucal, quais são as principais preocupações e quais cuidados devem ser tomados:

Por que idosos estão mais suscetíveis a problemas bucais?

A Pesquisa Nacional de Saúde mais recente, conduzida pelo IBGE em 2019, mostra que, enquanto 96% das pessoas de 18 a 29 anos escovam os dentes pelo menos duas vezes ao dia, na faixa etária a partir dos 60 o número cai para 86%. Mas não é somente a diminuição dos cuidados que pode acarretar problemas bucais.

O presidente do Conselho Regional de Odontologia da Bahia e professor da Faculdade de Odontologia da Ufba, Marcel Arriaga, destaca que a gengiva tende a ficar mais fina e sensível ao longo do tempo, podendo ser facilmente ferida com a mastigação e escovação.

Outro fator é a alta incidência de ingestão de medicamentos a partir dos 60 anos. “Remédios como corticoides, antidepressivos, anti-hipertensivos, diuréticos, anticoagulantes e anticonvulsionantes diminuem a produção de saliva, substância que protege contra cáries e outras doenças”, aponta Arriaga.

O primeiro passo é beber bastante água. Em casos mais graves, um dentista pode prescrever o uso de saliva artificial, vendida em farmácias.

Saiba qual o tipo de escova ideal para depois dos 60
Idosos devem beber bastante água para manter a produção de saliva em nível adequado Crédito: Reprodução/iStock

Quais complicações mais aparecem nessa faixa etária?

Segundo o periodontista Leonardo Gomes, a periodontite (perda óssea nos tecidos que circundam os dentes) é bastante comum, além da cárie e da candidíase (infecção oral por fungos).

Elas acontecem por conta da presença de placas bacterianas, provocadas pela má higienização e retração da gengiva, que é recorrente na faixa etária.

Para pacientes diabéticos, o risco de desenvolver as complicações é maior, assim como as consequências destas, que incluem a perda dos dentes.

De acordo com a pesquisa SB Brasil 2022/2023, 31,7% das pessoas de 60 anos ou mais não possuem todos os dentes e 72% usam próteses.

Quais cuidados devem ser adotados?

A escovação deve ser feita com uma escova macia com cerdas e cabeça pequenas para facilitar o alcance dos dentes menos expostos. A pasta de dente deve conter flúor e o fio dental e os enxaguantes bucais (com sabor não muito acentuado por conta das papilas gustativas mais sensíveis) não devem ser abandonados.

Em caso de dificuldade de coordenação motora, as escovas elétricas são muito bem-vindas.

O periodontista Leonardo Gomes alerta para a importância de não colocar a saúde bucal como secundária após a chegada dos 60 anos e da fiscalização e auxílio quanto à higiene bucal por parte de parentes e cuidadores de idosos que perderam a autonomia ou estão acamados.

Como higienizar próteses e dentaduras?

A má higienização das próteses e dentaduras removíveis pode provocar candidíase oral e até câncer bucal. Diariamente, os pacientes devem higienizá-las com escova específica para este fim e sabão neutro.

Para uma limpeza mais profunda, os dispositivos devem ser colocados em um copo com água com adição de pastilhas de limpeza ou soluções efervescentes vendidas em farmácia pelo tempo indicado nas embalagens.

Como estes produtos podem ter alto valor aquisitivo, o periodontista Leonardo Gomes afirma que a substituição por duas gotas de água sanitária funciona, devendo ser acrescida da lavagem com água e sabão neutro. Próteses que tenham partes metálicas não devem passar por essa forma de desinfecção, pois o hipoclorito de sódio é corrosivo.

Os pacientes não devem dormir com próteses e dentaduras removíveis, pois o tempo de descanso é fundamental.

A limpeza da gengiva não deve ser esquecida, podendo ser feita com o auxílio de uma gaze umedecida com soro fisiológico uma vez por dia. Também deve ser feito o uso de gluconato de clorexidina (enxaguante antimicrobiano vendido em farmácias) uma vez por semana.

Todas as próteses e dentaduras devem passar por manutenção frequente realizada por um dentista. Se mal encaixadas, podem provocar lesões na gengiva.

Com qual frequência ir ao dentista?

A frequência esperada durante a infância e idade adulta é de seis em seis meses. Por pacientes idosos apresentarem maior sensibilidade das gengivas e maior risco de comprometimento da saúde bucal, em geral, indica-se uma frequência de quatro em quatro meses.

Mas deve haver uma avaliação individual e cada caso pode demandar uma frequência diferente.

Para pacientes acamados, já há um serviço de atendimento em domicílio, geralmente prestado por profissionais odontogeriatras, dentistas com especialização em cuidados bucais dos idosos.

Qual o cenário atual da saúde bucal dos 60+ e a projeção para o futuro?

Segundo a odontogeriatra professora da Ufba e da Faculdade Bahiana de Medicina e Saúde Pública, Viviane Maia, a especialidade surgiu em 2002 e tende a crescer nos próximos anos.

“Com o envelhecimento da população, teremos cada vez mais pacientes idosos e uma diminuição dos totalmente desdentados, já muito menor do que há 20 anos. Os idosos do futuro terão menos dentes perdidos ou dentes substituídos por implantes, o que gera uma maior demanda de atendimento”, diz.

Diante do cenário, a odontogeriatria, que oferece atendimento em domicílio e uma avaliação mais completa e complexa do paciente, tende a ganhar espaço no mercado de trabalho.

“Sempre recebo ligação de dentistas clínicos pedindo orientação quanto ao atendimento desses pacientes, que possuem demandas específicas. Estamos falando de pacientes que utilizam muitos medicamentos e que não podem usar qualquer tipo de anestésico e qualquer quantidade. Além disso, os anti-inflamatórios devem ser evitados, assim como os corticoides”, acrescenta.