Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Thais Borges
Publicado em 7 de outubro de 2025 às 05:00
Na aula de geometria das profissões, um grupo de alunos reproduziu uma cena de crime. Para trazer a experiência de um perito criminal, a ideia era fazer os cálculos e encontrar as posições exatas em que tudo aconteceu - inclusive de que ponto um assassino teria atirado na vítima. Outro grupo, por sua vez, representou o trabalho dos arquitetos e fez os cálculos de um projeto. >
Esse foi apenas um dos projetos de um novo componente curricular que tem conseguido melhorar o desempenho de Matemática na rede Sesi em todo o país - e pode ser um bom norteador de como desenvolver o aprendizado de uma das disciplinas mais críticas no Brasil. Trata-se do Módulo de Aprendizagem Personalizada (MAP), uma disciplina que foca na recomposição - ou seja, reduzir as perdas e dificuldades no desempenho em conteúdos que seriam de anos anteriores numa área. Desde a pandemia da covid-19, essa passou a ser uma preocupação ainda mais forte nas escolas. >
O MAP foi integrado ao currículo de todas as turmas do 1º ano do Ensino Médio nas 12 escolas da Bahia. Ao todo, são pouco mais de 2,4 mil alunos baianos. Em todo o Brasil, são mais cerca de 33 mil estudantes e mais de 60 professores da rede que aderiram ao projeto, que é uma parceria com o Instituto Reúna, entidade que apoia iniciativas de promoção da educação de qualidade. A cada semana, são quatro horas de MAP: duas horas para Matemática e duas horas para Ciências da Natureza. >
Em apenas um ano, a estratégia conseguiu mudar os resultados da Avaliação Nacional da rede. Em 2023, mais da metade dos estudantes da 1ª série tinha defasagem em Matemática: 21,2% abaixo do nível básico e 31,5% no nível básico. Em 2025, mais de 88% chegaram aos níveis considerados adequados ou avançados de proficiência da disciplina. Os números trazem uma perspectiva otimista para aprendizagem de uma das áreas que, historicamente, alunos brasileiros têm desempenho mais precário. >
No caso do Sesi Candeias, a professora Viviane Nery tem conduzido a nova matéria de uma forma que convida os alunos a trazerem suas experiências para a sala de aula. “O aluno é protagonista e está no centro do aprendizado, então, quem produz e pesquisa é ele. Nós, enquanto professores, somos os mediadores”, explica. >
Ela também passou a trabalhar Matemática para projetos de educação financeira e aspectos do cotidiano dos estudantes. Em menos de um ano, a professora passou a ver os avanços dos alunos. Além de trabalhar criatividade e criticidade, ela acredita que houve mais desenvolvimento socioemocional. “Eles entendem melhor porque produzem a Matemática. Ela deixou de ser aquela decoreba de fórmulas ou aquela situação em que o aluno ficava preso na resolução de exercícios e não via o mundo lá fora. Hoje, conseguem ver isso de forma prática e sentem mais confiança”. >
Foi o que aconteceu com a estudante Gabrielle Luize, 15. Ainda que sempre tenha sido boa aluna, tinha medo de Matemática. Antes de uma prova, mal conseguia dormir. “O MAP veio para me mostrar que não preciso ter esse rancor da Matemática. Antes, via muitos colegas falando: ‘para que vou usar isso na vida?’. Agora, a gente consegue enxergar onde usar. A questão do financeiro é uma das mais plausíveis”. >
Na Bahia, 2.455 têm recebido esse aperfeiçoamento, de acordo com a gerente de educação regular do Sesi, Jucineide Melo. Nas aulas, o objetivo é trabalhar habilidades que os estudantes mostram ter fragilidade. “No Avalia 1, que é um exame feito em julho, já tivemos um acréscimo de 15% (nas notas), comparado a 2024”. >
Os professores passam por formação continuada e há reuniões mensais com os coordenadores do projeto. “Eles percebem que tem monitoramento e acompanhamento. São metodologias ativas por pares, baseadas em problemas, como a sala de aula invertida. Em um semestre, já vimos um impacto no processo”. >
Segundo o gerente de inovação e desenvolvimento do Instituto Reúna, Tiago Monteiro, a parceria com o Sesi começou no ano passado justamente porque os indicadores de aprendizagem são críticos no Brasil. Isso significa dizer que os estudantes não estão aprendendo o que deveriam aprender no momento certo. “A recomposição tem foco diferente da recuperação ou do reforço. É uma atividade mais profunda”, explica. >
Ele defende mais coerência pedagógica e um olhar mais forte para o currículo. “A partir do conceito de coerência pedagógica sistêmica, que tem o currículo no centro do processo, a gente potencializa a formação de professores, o olhar para o material didático e o próprio processo de avaliação - tudo isso com vistas a fortalecer o processo de aprendizagem”. >