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Carol Neves
Publicado em 10 de dezembro de 2025 às 07:30
A aprovação do chamado “PL da Dosimetria” pela Câmara dos Deputados, na madrugada desta quarta-feira (10), abriu caminho para a redução das penas de condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 - incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Ao todo, 291 deputados votaram a favor do texto-base, 148 foram contrários e houve uma abstenção; 72 parlamentares não registraram presença. >
A proposta segue agora para análise do Senado, onde, segundo o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União-AP), deve ser votada ainda este ano. Depois disso, o projeto será encaminhado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que poderá sancionar ou vetar trechos da matéria.>
Tumulto e retomada do debate>
A decisão de pautar o projeto surpreendeu os líderes partidários. O anúncio foi feito ainda na manhã de terça-feira (9) pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), em meio a um dia turbulento. Durante a tarde, o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) ocupou a cadeira de Motta em protesto por sua possível cassação, se recusou a deixar o posto e acabou retirado à força pela polícia legislativa. A confusão levou a segurança a retirar jornalistas do plenário e interromper a transmissão da TV Câmara - algo inédito.>
O assunto, que havia perdido tração nos últimos meses, voltou ao centro das discussões. Em agosto, aliados de Bolsonaro chegaram a ocupar os plenários da Câmara e do Senado para pressionar por uma votação que não ocorreu. Desta vez, porém, o texto avançou.>
O impacto para Bolsonaro>
Se o projeto virar lei, Bolsonaro pode ter a pena reduzida e permanecer menos tempo na prisão. Condenado a 27 anos e 3 meses por liderar um plano de golpe de Estado, o ex-presidente está preso desde 22 de novembro na sede da Polícia Federal em Brasília, depois de tentar danificar a tornozeleira eletrônica durante a prisão domiciliar. Para o ministro Alexandre de Moraes, a ação indicava tentativa de fuga - o que levou à decretação da prisão preventiva.>
O trânsito em julgado ocorreu em 25 de novembro, e, apenas 15 dias depois, os deputados aprovaram o texto que favorece a redução das penas. Cálculos da equipe de Paulinho da Força (Solidariedade-SP), relator do PL, estimam que Bolsonaro poderia cumprir cerca de 2 anos e 4 meses em regime fechado caso as mudanças entrem em vigor.>
O que muda com o projeto>
Pelo PL, o crime de golpe de Estado - cuja pena é maior - passa a absorver o delito de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Hoje, o entendimento do STF permite a soma das punições. Com a alteração, haveria uma redução automática. No caso de Bolsonaro, o abatimento seria de 6 anos e 6 meses.>
O projeto determina que, quando os crimes forem cometidos no mesmo contexto, deve ser aplicado o “concurso formal”, com base na pena mais elevada e um acréscimo de um sexto até metade, a ser definido pela Justiça.>
Além disso, a proposta reduz o tempo necessário para a progressão de regime: a passagem do fechado para o semiaberto poderia ocorrer após 1/6 da pena, e não mais 1/4. O texto também permite descontar parte da pena para quem usou tornozeleira eletrônica em prisão domiciliar e trabalhou durante o período - a cada três dias de trabalho, um dia seria abatido.>
Paulinho da Força afirmou ter discutido o texto com lideranças partidárias e membros do STF. Sobre questionamentos posteriores, declarou: “Se alguém recorrer ao Supremo dessa decisão, acho que vai perder”, afirmou ao portal G1. >
Ele reconheceu ter apresentado a proposta ao senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) na semana anterior, mas disse não saber se o ex-presidente foi informado. Flávio, que recentemente lançou sua pré-candidatura à Presidência em 2026 com apoio do pai, recuou dois dias depois, afirmando que isso teria um “preço”.>
Debate sobre anistia>
Embora aliados de Bolsonaro insistam na anistia completa, o projeto não cancela condenações. “Não estamos dando anistia. Não tem anistia. As pessoas vão continuar pagando”, disse Paulinho da Força.>
Parlamentares ligados ao governo Lula avaliam que a mudança representa um sinal de impunidade para os envolvidos nos ataques antidemocráticos. Segundo o relator, no entanto, a proposta teria o efeito contrário: “Vão pensar duas vezes [antes de fazer novamente]”.>
Entenda a anistia>
A anistia é um perdão estatal que extingue a punibilidade, podendo ser concedida por lei do Congresso ou, em alguns casos, por medidas do Executivo. Não é o caso do texto aprovado na Câmara, que trata apenas da dosimetria das penas.>