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Tharsila Prates
Publicado em 15 de julho de 2025 às 21:24
O Ministério Público do Estado do Ceará, com o apoio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Rio Grande do Norte, cumpriu nesta terça-feira (15) um mandado de busca e apreensão pessoal e domiciliar em Natal (RN) contra um dos suspeitos de envolvimento na campanha de ódio promovida nas redes sociais contra a farmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, vítima de tentativa de homicídio, símbolo da luta contra a violência doméstica e que dá nome à Lei nº 11.340/ 2006, que pune a violência contra a mulher. >
A ação fez parte da 2ª fase da operação Echo Chamber, que quer dizer Câmara de Eco, em referência a um termo usado para descrever um ambiente em que as pessoas são expostas a informações ou ideias que reforçam suas próprias crenças, sem entrarem em contato com opiniões divergentes.>
A 9ª Vara Criminal de Fortaleza determinou também a suspensão pelo prazo de 90 dias de todos os episódios do documentário “A investigação Paralela: o caso de Maria da Penha”, produzido pela empresa Brasil Paralelo e que apresenta a versão do ex-marido de Maria da Penha, Marco Antonio Heredia Viveros, sobre a tentativa de assassinato da farmacêutica. O episódio investiga o crime que deu origem à Lei Maria da Penha. >
O MP informou que foram apreendidos aparelhos eletrônicos e documentos, que seguirão para análise do MP do Ceará. A medida visa a aprofundar as investigações sobre uma campanha sistemática de ódio disseminada nas redes sociais contra Maria da Penha >
As investigações tiveram início a partir de manifestações recorrentes de desinformação, conteúdo calunioso e ataques misóginos, promovidos por meio de canais digitais, com o objetivo de descredibilizar a história da vítima, questionar decisão judicial transitada em julgado e promover o descrédito da legislação de proteção à mulher.>
Conversas extraídas de aparelhos eletrônicos apreendidos no curso das investigações revelaram, segundo o MP, a existência de estratégias organizadas para invalidar a criação da Lei Maria da Penha, desacreditando a própria vítima e a norma, na tentativa de retirá-la do ordenamento jurídico ou, ao menos, mudar o nome da lei. Além disso, evidenciam-se indícios de que os envolvidos buscaram obter vantagem econômica a partir da exploração dessas narrativas, valendo-se da repercussão midiática e do engajamento em redes sociais para alcançar interesses próprios.>
Na primeira fase da operação, deflagrada em dezembro de 2024, foram cumpridos mandados de buscas e apreensões, atendendo a pedido do MP. O Poder Judiciário determinou, ainda, a suspensão do perfil de um suspeito na plataforma Instagram pelo período de 90 dias; a proibição dele se aproximar ou manter contato, pessoalmente ou através de pessoa interposta, com Maria da Penha e suas filhas, bem como de se aproximar das residências delas; como também o impedimento de se ausentar da comarca onde reside, por mais de sete dias, sem autorização judicial, assim como do país. >
O caso>
Maria da Penha conheceu o colombiano Marco Antonio Heredia Viveros em 1974, quando estava cursando o mestrado na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo. À época, ele fazia os seus estudos de pós-graduação em Economia na mesma instituição.>
Naquele ano, eles começaram a namorar, e Marco Antonio demonstrava ser muito amável, educado e solidário. O casamento aconteceu em 1976. Após o nascimento da primeira filha e da finalização do mestrado de Maria da Penha, eles se mudaram para Fortaleza, onde nasceram as outras duas filhas do casal. Foi a partir daí que as agressões começaram a acontecer.>
Em 1983, Maria da Penha foi vítima de dupla tentativa de feminicídio por parte de Marco Antonio. Os detalhes são contados no site oficial do Instituto Maria da Penha.>
O primeiro julgamento de Marco Antonio aconteceu somente em 1991 - oito anos após o crime. O agressor foi sentenciado a 15 anos de prisão, mas, devido a recursos solicitados pela defesa, saiu do fórum em liberdade. O segundo julgamento só foi realizado em 1996, no qual o seu ex-marido foi condenado a 10 anos e 6 meses de prisão. Contudo, sob a alegação de irregularidades processuais por parte dos advogados de defesa, mais uma vez a sentença não foi cumprida.>
O caso ganhou repercussão em 1998, quando foi denunciado para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/ OEA). Em 2001 e após receber quatro ofícios da entidade, silenciando diante das denúncias, o Estado brasileiro foi responsabilizado por negligência, omissão e tolerância em relação à violência doméstica praticada contra as mulheres. A Lei Maria da Penha surgiu depois disso, há 15 anos.>