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Perla Ribeiro
Publicado em 8 de dezembro de 2025 às 09:30
Quando os pais de Benício Xavier, 6 anos, Bruno Mello de Freitas e Joyce Xavier Carvalho, levaram a criança à emergência do Hospital Santa Júlia, em Manaus, no dia 22 de novembro, jamais cogitaram que ela sairia de lá sem vida. O pequeno deu entrada na unidade apresentando um quadro de tosse seca e febre. A suspeita era de laringite. Mas o erro na administração de uma dosagem de adrenalina fez tudo evoluir da pior forma muito rápido. A saturação caiu para cerca de 75%. Ele foi levado à sala vermelha e depois para a UTI por volta das 23h. Durante a intubação, sofreu as primeiras paradas cardíacas. Foram seis no total. >
Quando os pais se deram conta, estavam numa Unidade de Terapia Intensiva (UTI) vendo uma equipe tentar reanimar a criança após uma sequência de paradas cardíacas: "Eu tocava muito nele, apertava muito o pé dele. Eu gritava muito naquele leito. Gritava: 'volta Benício, volta e fica com a gente, você tem força'. E eu rezava, era a única coisa ali como pai", relembra o pai, em entrevista do Fantástico. Ele morreu às 2h55 do dia 23 de novembro.>
Benício Xavier de Freitas morreu após receber dose de adrenalina na veia
Na entrevista ao programa da TV Globo, o pai contou que, ao ser transferido para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI), o menino estava lúcido. Ele jantou e pediu água com frequência. "Ele me vê e toda vez que tosse ele pede: 'pai, eu quero água'. Ele vai e dá só um golinho". Minutos depois, a criança começou a ficar ofegante. Bruno conta que o filho estava sonolento e se mexia muito. A orientação da equipe médica, segundo ele, foi de que era preciso melhorar a oxigenação para evitar a intubação. “Eu falava com ele internamente: ‘Bora, filho. Bora. Melhora essa oxigenação’. Eu rezava muito, muito, ajoelhado do lado da maca e, infelizmente, essa oxigenação não chegava.”>
Sem apresentar melhora, pouco antes da meia noite, Benício passou pela primeira das três tentativas de intubação. "Ai, a partir desse momento, começa um entra e sai (de pessoas na UTI)", relembra Bruno. Durante a intubação, a criança sofreu as primeiras paradas cardíacas. Foram seis no total, três delas testemunhadas por Bruno dentro da UTI.>
O pai de Benício relembra que a sexta e última parada cardíaca foi a mais demorada. Diante dos esforços dos médicos, e tomado por desespero, ele se ofereceu para ajudar. "Nessa última, no momento que a médica estava fazendo a oxigenação, eu recordo que eu vou lá com ela e digo: 'você quer que eu ajude? Você quer que eu faça?' Porque eu percebo que cansa, então ela disse: 'não, pode deixar'".>
Benício morreu às 2h55 do dia 23 de novembro. Para o pai, a lembrança maior que vai ficar é da criança que Benício era. "Uma criança pura, meiga, não era desobediente. O ser vivo mais puro que eu já encontrei, que eu conheci na humanidade", diz Breno. >
As complicações que levaram ao fim precoce da vida de Benício iniciaram após uma adrenalina que deveria ser administrada via inalação foi injetada na veia da criança. O erro na prescrição foi seguido de um novo equívoco: uma técnica de enfermagem teria alertado à colega que a medicação era para ser inalada, mesmo assim, teve a orientação ignorada. Segundo a família, a criança recebeu lavagem nasal, soro, xarope e três doses de adrenalina intravenosa de 3 ml a cada 30 minutos, aplicadas por uma técnica de enfermagem. "Meu filho nunca tinha tomado adrenalina pela veia, só por nebulização. Perguntamos, e a técnica disse que também nunca tinha aplicado desse jeito. Mas afirmou que estava na prescrição", relatou o pai.>
O menino piorou rapidamente: ficou pálido, com membros arroxeados, e disse que "o coração estava queimando". Em mensagens em que pediu ajuda ao médico Enryko Queiroz e em um documento enviado à polícia, a médica admitiu o erro. No entanto, a defesa dela afirma que a confissão foi feita "no calor do momento". A técnica de enfermagem Raiza Bentes Paiva, responsável pela aplicação do medicamento, também é investigada. Ambas respondem ao inquérito em liberdade.>
O Conselho Regional de Medicina do Amazonas (CREMAM) abriu processo ético sigiloso para apurar a conduta da médica no dia 26 de novembro. O Hospital Santa Júlia afastou tanto Juliana quanto a técnica de enfermagem Raiza Bentes. Em relatório enviado à Polícia Civil, ao qual a Rede Amazônica teve acesso, Juliana reconheceu que errou ao prescrever adrenalina na veia. Ela afirmou ter informado à mãe que a medicação deveria ser administrada por via oral e disse ter se surpreendido pela enfermagem não questionar a prescrição.>
A técnica Raiza Bentes declarou que apenas seguiu o que estava registrado no sistema. O delegado Marcelo Martins investiga o caso como homicídio doloso qualificado, considerando inclusive a possibilidade de crueldade.>