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Da Redação
Publicado em 2 de setembro de 2010 às 09:40
- Atualizado há 2 anos
Tomo emprestada a frase acima de meu amigo, já falecido, Epaminondas Costalima, publicitário e imortal da Academia de Letras da Bahia, uma sentença que costumava repetir nos seus sermões de fim de tarde na então sede da Publivendas, Rua dos Ingleses.>
A frase acima cai como uma luva para definir o tsunami que dizimou as barracas de praia da orla de Salvador, semana passada, um dos episódios mais desumanos que já tive a oportunidade de testemunhar nos meus de trinta e cinco anos de vivência nesta cidade. Aquilo não foi apenas um ato frio e protocolar da Justiça, foi maldade. No sentido em que Epaminondas costumava dizer; burrice ao extremo, semse medir as consequências.>
A derrubada das barracas da orla de Salvador, com a complacência dos governos municipal, estadual e federal, da Assembleia Legislativa do Estado e Câmara de Vereadores, do Ministério Público e OAB e da própria mídia, que também se omitiu nesse processo, é a própria essência da burrice. Retrata a incapacidade de negociar, articular, buscar soluções, trabalhar por uma solução mediadora entre o conflito estabelecido (meio ambiente x economia) patente nesse episódio.>
Burrice que teve como desfecho o ato final da Justiça, apenas um juiz protagonista (uma decisão solitária que caberia a um colegiado) desferindo a espada de Thémis sobre a jugular de uma categoria econômica. Dizimada por capricho. As barracas de praia eram feias, sem higiene, mal resolvidas no contexto ambiental e avançavam sobre a areia com mesas e cadeiras? Certo. A solução encontrada para essa questão é: suprimam as barracas e com elas a categoria econômica e toda a cadeia produtiva envolvida?>
Então, vamos ser coerentes. A Justiça falha e é lenta, acumula milhões de processos, então suprima-se a Justiça. O governo não atende as necessidades dos cidadãos e não oferece assistência médica, nemeducação de qualidade? Então, suprima-se o governo. A mídia comete abusos e se omite em questões fundamentais? Então suprima-se a imprensa.>
O Congresso Nacional trabalha de terça a quinta e abre mão de legislar para que o executivo legisle por ele com medidas provisórias? Então, suprima-se o parlamento. O fato é que a burrice como uma forma de maldade não teve atenuantes na decisão judicial adotada semana passada, cujo ápice foram as cenas deprimentes que o Brasil testemunhou pela TV, o ser humano reduzido ao papel de um simples detalhe.>
Quer dizer que se a área ocupada era da Marinha e a Marinha nunca reivindicou esse direito, então não há direito adquirido? Quer dizer que o Brasil temcinco mil quilômetros de praia e dezenas de milhares de barracas ao longo de sua orla e apenas em 50 quilômetros o Ministério Público enxergou uma irregularidade?>
Quer dizer que o meio ambiente nada tema ver com o ser humano, com a preservação do homemcomo ator de uma cadeia produtiva, ele próprio um contribuinte social? A estas alturas, tudo consumado, nossos governantes devemestar morrendo de vergonha, a consciência pesada, remoendo o peso da omissão. Eu, particularmente, como modesto formador de opinião, estou. Sinto-me também um algoz, por calar. E quem cala consente. E não sente.>