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Publicado em 8 de setembro de 2025 às 05:00
A Prefeitura de Salvador vai mudar de endereço, transferindo-se da Praça Municipal para a Praça da Sé. Vergonhoso é saber que a Administração Municipal cumpre uma decisão judicial, transitada em julgado, de iniciativa do Ministério Público Federal, com a cumplicidade do IPHAN. Erram feio, o IPHAN, o MPF e a Justiça! >
Mário Kertész venceu as eleições municipais de 1985, empunhando a bandeira de levar de volta a Prefeitura para a Praça Municipal – que houvera sido transferida para o Solar Boa Vista, em Brotas, um prédio histórico onde residiu o poeta Castro Alves e funcionou a clínica médica de seu pai, hoje, outra vez, um imóvel tombado em ruínas. O artífice do cumprimento dessa proposta foi o Arquiteto João da Gama Filgueiras Lima, o Lelé, que concebeu e instalou o projeto em prazo recorde.>
Ao transferir-se para o antigo Palácio Arquiepiscopal, a Prefeitura provoca um outro deslocamento, o do Centro de Referência da História da Igreja Católica no Brasil, que houvera sido aí recentemente instalado, após obras custeadas pelo BNDES, de restauração desse monumental imóvel do Século XVIII. O importante acervo histórico perde seu endereço próprio para ser acomodado na Catedral Basílica. >
E o que fazer na Praça Municipal? Assim como rejeitou o projeto de Lelé, o IPHAN certamente recusaria um projeto de Frank Gehry, Calatrava ou Jean Nouvel, entre outros ilustres arquitetos que realizam projetos icônicos, capazes de transformar cidades mundo afora. A Prefeitura anuncia um centro de convenções. O IPHAN preferirá, certamente, ficar com o velho “Cemitério de Sucupira”, denominação pejorativa que a população dera ao simulacro de praça por sobre a subestação de energia e o estacionamento subterrâneo ali construídos. >
Mas a Prefeitura de Lelé não é uma edificação para ser demolida. Ela foi montada, peça por peça, e, como tal, pode ser desmontada, devendo ser reutilizada em outro local. É o que proponho: que a Prefeitura de Lelé continue tendo, em Salvador, uma função nobre, capaz de preservar a obra e homenagear este arquiteto de grande relevância, que tanto contribuiu com a cidade, por exemplo, com o projeto do Hospital Sarah Kubitschek, as salutares escadarias drenantes ou as suaves passarelas coloridas que tanto embelezam o tecido urbano local. >
A sugestão é que o atual Palácio Thomé de Souza seja relocalizado para local adrede preparado para ser o marco fundacional da nova Centralidade Metropolitana, proposta pelo PDDU, para ser implantada em Águas Claras. Relocalizado entre Pirajá e Águas Claras, preservando sua função institucional, o edifício viria ser a sede da Prefeitura-Bairro, dando origem a um novo centro cívico na cidade, em praça que receba o nome do ilustre arquiteto e urbanista.>
Desta forma, preserva-se o imóvel, tributa-se homenagem ao seu criador e implementa-se a estrutura urbana aprovada no PDDU. Promove-se, ademais, uma verdadeira refundação da Cidade, mediante a criação de um marco de referência capaz de simbolizar a estruturação dessa nova centralidade urbana.>
Como novo centro de negócios, a Centralidade Metropolitana Águas Claras constitui iniciativa destinada a orientar a nova fase do desenvolvimento urbano da metrópole, consolidando uma estrutura policêntrica, criando polarização em meio a uma área onde habita população de baixa renda, hoje condenada a perder três horas por dia em deslocamentos para trabalhar em outras partes da cidade.>
Servida por metrô e pela BR-324 – principal acesso à cidade – para Águas Claras está sendo transferida a Estação Rodoviária e, em suas redondezas, desenvolvem-se atividades de logística e indústria, dando forma ao Polo Logístico de Valéria. A formação de um novo centro de serviços e habitação consolidará este processo. >
Configura-se assim, do ponto de vista territorial, a oportunidade de alavancar a economia urbana – calcanhar de Aquiles da Cidade – marcada por baixo PIB, elevadas taxas de desemprego e predomínio da pobreza.>
Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional. Autor de Cidades e Municípios: gestão e planejamento.>