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Europa em decadência: a vaca está indo para o brejo!

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Publicado em 7 de setembro de 2025 às 10:00

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Após passar muitos anos no Brasil, Nigel, um amigo meu inglês, passou uns dias em Paris e me mandou um WhatsApp que só um brasileiro poderia entender: “Dude, listen up, you know Europe the cow is really going to the swamp”, o que ele quis dizer e não faz sentido nenhum em inglês foi: “Parceiro, se liga, sabe a Europa... a vaca vai mesmo pro brejo”.

O meu querido Nigel está certo.

A Europa vive uma encruzilhada histórica. O continente que já ditou os rumos da civilização hoje se arrasta preso às suas próprias ilusões. Falta poder militar, falta energia barata e confiável, falta uma indústria tecnológica capaz de competir com os gigantes dos Estados Unidos e da Ásia. Em vez de pragmatismo, a Europa se deixou aprisionar por dogmas ideológicos e por uma burocracia que paralisa qualquer reação.

O Brexit (saída do Reino Unido da Comunidade Europeia) não pode ser entendido apenas como um gesto isolado de nacionalismo britânico, mas como uma reação direta às políticas esquerdistas e ambientalistas que passaram a dominar Bruxelas. A Inglaterra, historicamente pragmática e voltada para a competitividade global, rejeitou a burocracia sufocante da União Europeia, onde regulamentações excessivas, agendas climáticas irreais e a expansão ilimitada do Estado de bem-estar social comprometiam a soberania econômica e o dinamismo dos mercados. Ao deixar o bloco, os britânicos enviaram uma mensagem clara: não aceitariam ser arrastados para a mesma estagnação que condenou o continente, preferindo trilhar um caminho próprio em busca de flexibilidade, autonomia e abertura ao comércio mundial.

No tabuleiro geopolítico, as fragilidades são ainda mais gritantes. A ingenuidade em relação à Rússia custou caro, e a dependência silenciosa da China mostra o quanto o continente perdeu a noção de soberania estratégica. Bruxelas fala em “liderança global”, mas a verdade é que a Europa se tornou refém das decisões de Washington e de suas próprias divisões internas. Um continente que já foi centro do mundo hoje parece mais preocupado em elaborar relatórios ambientais e códigos de conduta do que em garantir sua sobrevivência no século XXI.

E, enquanto isso, cresce o descontentamento popular. Trabalhadores, agricultores e classes médias se sentem abandonados por elites distantes, que insistem em impor agendas irreais e custosas. O resultado está aí: partidos populistas e de extrema-direita avançam em toda parte, alimentados pelo ressentimento com uma União Europeia cada vez mais vista como um castelo de tecnocratas. A realidade é dura: ou a Europa se reinventa de forma radical em sua defesa, em sua economia e em sua identidade ou será relegada a um papel periférico no mundo multipolar que se desenha.

A hegemonia de uma visão esquerdista na Europa levou o continente a abraçar uma agenda ambientalista rígida, quase dogmática, que passou a ser tratada mais como um imperativo ideológico do que como uma estratégia racional de desenvolvimento. Guiados por pressões políticas internas e pela narrativa do “fim do mundo climático”, governos europeus adotaram medidas drásticas de descarbonização e restrições regulatórias sem considerar os impactos econômicos e geopolíticos. Ao impor custos cada vez mais altos à sua própria indústria e agricultura, a Europa abriu espaço para que outras economias, menos engessadas por esse tipo de mentalidade, conquistassem mercados e vantagens competitivas.

Enquanto a esquerda europeia se concentrava em “salvar o planeta” a qualquer preço, potências como China, Índia e até mesmo os Estados Unidos mantiveram posturas pragmáticas, equilibrando crescimento econômico com transições graduais de matriz energética. O resultado foi a perda de competitividade estrutural: empresas europeias enfrentaram custos proibitivos de energia e produção, viram cadeias industriais migrarem para fora do continente e se tornaram cada vez mais dependentes de importações de energia, minérios críticos e até alimentos. A tentativa desesperada de criar barreiras como o CBAM (Carbon Border Adjustment Mechanism) é apenas uma prova de que o continente busca se proteger de uma competição global que ele próprio deixou escapar.

Essa visão esquerdista também ampliou divisões internas. Populações rurais, pequenos produtores e trabalhadores industriais passaram a se rebelar contra políticas vistas como elitistas, idealizadas em gabinetes de Bruxelas, mas desconectadas da realidade do cidadão comum. O fosso entre elites urbanas progressistas e a população trabalhadora tradicional vem minando a coesão social e corroendo a legitimidade política das instituições europeias. Ao transformar a pauta ambiental em bandeira ideológica, a esquerda europeia não apenas isolou o continente no cenário global, mas também acelerou sua decadência econômica, social e política.

Sinceramente, hoje tenho mais medo de andar pelas ruas de Paris, em especial perto da região da Torre Eiffel que passear no Pelourinho fugindo dos vendedores de fita do Senhor do Bonfim. Não resta dúvida: a Europa dominou o mundo durante séculos, sustentada pela máquina a vapor inglesa, pelo controle dos mares e, não menos importante, pela exploração brutal da escravidão. Foi esse tripé tecnologia, poder naval e mão de obra forçada que garantiu sua supremacia global.

Essa mentalidade de superioridade ainda resiste no imaginário europeu, mas hoje não passa de ilusão. O continente insiste em se enxergar como centro do mundo, quando na verdade perdeu o protagonismo. O eixo da economia global já mudou de lugar: atualmente, 62% do PIB e 65% da população mundial estão concentrados na região do Indo-Pacífico.

Apesar disso, os mapas continuam colocando a Europa no centro, como se fosse o coração do planeta. Mas esse coração já não pulsa como antes. O Atlântico deixou de ser o palco principal da história, e o Indo-Pacífico assumiu o papel de novo centro de gravidade mundial. Diante dessa realidade, é impossível negar: a Europa está em decadência — e sua relevância continuará diminuindo se não abandonar suas ilusões.

Em 1900, a Europa tinha 25% da população mundial, e hoje mal chega a 6%, mas representa 50% do gasto social global. Esse modelo de “Estado de Bem-Estar” foi longe demais. A Europa causou inveja no mundo, porém, a dura realidade é que, em 2050, nenhuma economia europeia estará entre as 10 mais importantes do mundo.

Entre 2008 e 2023, a União Europeia cresceu apenas 13,5%, enquanto os Estados Unidos avançaram impressionantes 87% no mesmo período. Entre 2010 e 2023, a diferença também é gritante: 21% de expansão no PIB europeu contra 34% nos EUA, com a zona do euro ficando ainda mais para trás, com apenas 18%. Em 2023, a distância se ampliou ainda mais enquanto a economia americana cresceu cerca de 2,5%, a zona do euro mal passou de 0,4%. Esses números não deixam dúvidas: as políticas esquerdistas e ambientalistas, que priorizaram regulações sufocantes e metas climáticas irrealistas em detrimento da competitividade e da inovação, condenaram a Europa à estagnação.

As fragilidades europeias ficam ainda mais evidentes quando se observa o modelo de financiamento social. Enquanto os gastos em saúde nos Estados Unidos são compostos por 55% de fundos privados, na Europa esse percentual não passa de 25%, sobrecarregando os cofres públicos. O mesmo ocorre na educação: cerca de 30% do financiamento é privado nos EUA, chegando a 65% no ensino superior, enquanto na Europa 90% do sistema educacional é público. Essas benesses, vistas como conquistas sociais, tornam-se insustentáveis diante do baixo dinamismo econômico: em termos nominais, o PIB per capita europeu (US$ 38 mil) é menos da metade do americano (US$ 81 mil).

A decadência europeia é, portanto, fruto de escolhas estratégicas equivocadas. O continente cometeu três erros cruciais: colocou sua segurança nas mãos dos Estados Unidos, sua energia nas mãos da Rússia e seu comércio nas mãos da China. Essa combinação de dependência externa, políticas ambientais dogmáticas e um Estado de bem-estar social oneroso explica por que a Europa perdeu espaço no cenário mundial.

O Brasil, infelizmente, repete os mesmos erros que levaram a Europa à estagnação. Movido por uma visão esquerdista e ambientalista rígida, o país tem priorizado discursos ideológicos em detrimento do crescimento econômico real. Regras cada vez mais restritivas para o agronegócio, entraves ambientais que travam a infraestrutura e a expansão energética, além do fortalecimento de um Estado inchado e ineficiente, lembram as políticas que empurraram o continente europeu para a perda de competitividade global. Em vez de aproveitar suas vantagens naturais abundância de recursos, matriz energética limpa e liderança agrícola, o Brasil corre o risco de se engessar, sacrificando desenvolvimento, empregos e soberania econômica em nome de agendas que soam modernas, mas que podem condená-lo a repetir o fracasso europeu.

No caso brasileiro, aqui parodiando o meu amigo inglês: a vaca está mesmo indo ou já foi para o brejo?

Jorge Cajazeira, é Ph.D. pela Fundação Getúlio Vargas (EAESP) e consultor internacional de empresas.