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O arrocha venceu todos os embargos e chegou em Cuba

Livro sobre música brasileira escrito na ilha caribenha destaca gênero criado em Candeias e pioneirismo de ‘Lairton e Seus Teclados’

  • Foto do(a) author(a) André Uzeda
  • André Uzeda

Publicado em 9 de novembro de 2025 às 08:00

Bar em Havana com a bandeira do Brasil em destaque.
Bar em Havana com a bandeira do Brasil em destaque. Crédito: André Uzêda

Assim como os filmes de Hollywood exercem uma forte influência cultural sobre o Brasil, as novelas da Globo fazem algo semelhante na maior ilha do Caribe. Em Cuba, Lula, Anitta e Neymar podem até fazer um relativo sucesso, mas são nomes como Antônio Fagundes, Glória Pires e Cauã Reymond que provocam suspiros apaixonados, reflexos cintilantes de uma idolatria exacerbada.

As novelas brasileiras, dubladas em espanhol, são um sucesso de público há mais de quarenta anos e influenciam comportamentos, maneiras de se vestir e até o gosto musical dos cubanos. Existem grupos no Whatsapp e Facebook para discutir, palpitar e acompanhar as tramas diariamente.

Fachada do bar La Bodeguita Del Medio, onde é possível tomar um dos mojitos mais famosos de Cuba e ouvir música brasileira ao vivo. por André Uzêda

Isso é o que a diplomacia internacional chama de soft power – a capacidade de um país induzir decisões de outro não por uso da força ou do dinheiro, mas por simples persuasão, projetando anseios e valores através da indústria cultural.

O primeiro grande sucesso arrasa-quarteirão em solo cubano foi “A Escrava Isaura”, em 1984. A partir daí foi aberto um outro flanco de atuação neste mesmo ramo artístico. Como as novelas são sempre musicadas, com trilhas sonoras para embalar dramas narrativos ou momentos de catarse dos personagens, elas também foram exportadas para Cuba.

Por isso, não é incomum, ao encostar numa bodega de Havana para apreciar um refrescante mojito, ouvir talentosos músicos tocarem ao vivo grandes sucessos brasileiros. O repertório vai desde as consagradas Garota de Ipanema (de Tom e Vinícius), passando por Carinhoso (Pixinguinha) até desembocar em hits mais recentes, de cantores como Ana Carolina e Michel Teló.

Reverência à música baiana

Em dezembro de 2023, o pesquisador cubano Ignacio Díaz González, formado em educação musical e integrante da União dos Escritores e Artistas de Cuba (Uneac), lançou o livro “La Música de Brasil”.

Por apenas um dólar ou 6.000 pesos cubanos, é possível adquirir um exemplar em uma das livrarias bancadas pelo governo. Logo nas primeiras páginas, Díaz González escreve que “Estados Unidos, Cuba e Brasil são as três grandes potências da música popular do mundo”.

Ao longo da pesquisa, ele se propõe a mergulhar em toda extensão da canção brasileira, relacionando com temas políticos, pontuando influências estrangeiras e traçando paralelismos históricos entre Brasil e Cuba, como consequência do processo de colonização dos dois países.

Na obra, há inúmeras citações à Bahia – por meio do samba de roda, do berimbau e da capoeira – e também aos artistas baianos. Caetano Veloso, por exemplo, é classificado “um dos maiores cantores que já existiram em nível mundial e figura central do movimento cultural tropicalista”.

Gal Costa é apresentada como “dona de uma afinação perfeita e técnica vocal invejável”, enquanto que Raul Seixas é classificado como “o poeta dos hippies” e um dos maiores roqueiros brasileiros de todos os tempos. João Gilberto é citado como “um verdadeiro gênio”.

Quando o arrocha chegou em Cuba

Além do confete lançado para os músicos baianos, os movimentos culturais nascidos por aqui também ganharam enorme destaque no livro de Díaz González.

O Axé é sinalizado como um movimento que “tem raízes em vários ritmos musicais, como o samba, o frevo, o funk carioca e o reggae”, além de enaltecer a origem da palavra, importada do iorubá.

O mais interessante, no entanto, é o espaço que o autor dedica ao arrocha, um gênero que no próprio Brasil está circunscrito a espaços periféricos, ganhando destaque ocasionais na mídia nacional. “O arrocha é um ritmo dançante derivado do Brega (ambos com grande semelhança). É originário da cidade de Candeias, no estado da Bahia”, diz o texto.

Díaz González cita Lairton e Seus Teclados como pioneiro do gênero, com a música ‘Morango do Nordeste' e se debruça até sobre as produções independentes dos CDs de arrocha, que impulsionaram a popularização do gênero por meio da pirataria no início dos anos 2000.

“O advento da tecnologia digital da música, assim como a proliferação de grupos musicais independentes, garantiram a disseminação do gênero dentro dos estratos sociais mais baixos, pois as classes médias e altas continuam vendo o ritmo com grande preconceito”, completa.

Vale lembrar que, há exatos 63 anos, Cuba vive sob forte embargo econômico imposto pelos Estados Unidos, um ano depois que Fidel Castro declarou o regime socialista da revolução. Mas não há bloqueio certo que segure a malemolência de uma bela sofrência.

Essa coluna é dedicada à amiga Perla Ribeiro, que tem feito exercícios de pilates para melhorar sua capacidade no arrocha.