Comer bem eleva a alma

Viena! E os cafés... Ah, os cafés! E não apenas as bebidas. Mas as cafeterias. E os doces? E as tortas? Acho que todo mundo já ouviu falar na Sachertorte. E o charme do Hotel Sacher, onde ela foi criada? E as pequenas tortas de morangos, de cerejas, framboesas, amêndoas, avelãs e tantas outras que nos atraem e nos desafiam?

Freud teria frequentado o café do Hotel Sacher. E também teria ido muito ao Café Central, os dois em Viena. Freud e milhares de vienenses. Os cafés, e há dezenas deles, com grande variedade de bebidas, são um orgulho para os vienenses. Os austríacos são formais. Ainda hoje, se alguém for identificado como um "doutor", vai ser atendido antes dos outros que possam estar numa fila.

Os cafés servemde local de encontro de amigos, para matar o tempo, para ler jornais ou para ficar vendo a vida passar pela janela. O problema é que, junto com o café, vemum cardápio com as tortas e os doces. Cada Café-Konditoreien (Café-Confeitaria) temsuas próprias receitas de tortas e doces. Resistir? Para quê?

No Café Central, comemos uma torta de avelãs que ainda hoje lembro o sabor.Uma massa deliciosa à base de avelãs entre duas folhas de chocolate ao leite, como se fosse uma mil-folhas. Fantástica! Melhor que a Sachertorte? Páreo duro. Duríssimo. A torta de Franz Sacher, então chef de doces do príncipe Metternich, foi criada em 1832.

É uma torta de chocolate, com recheio de geleia de damasco e coberta com chocolate amargo. Talvez tenha ficado famosa não só pelo sabor, mas pela disputa que envolveu uma outra confeitaria, a Demel, que queria usar a expressão “sachertorte original”, porque teria sido comprada de um integrante da família Sacher.

A disputa foi parar nos tribunais. E o Hotel Sacher ganhou o direito de ficar com o "original". Mas, por toda Viena, as confeitarias vendem a Sachertorte. Casa maravilhosamente com um café com leite bemforte. Sabores que se complementam. Semo café... não sei não.

Mas centenas de vienenses e turistas vão até o Hotel Sacher para provar um pedaço da torta, que é servida com chantilly. No Verão, há quase sempre uma fila de espera. Nemse preocupe. As garçonetes são simpáticas, nos deixam à vontade e não ficam com aquela expressão que sugere que está na hora de outro sentar no seu lugar.

O café não é barato. Mas em que lugar você pode ler todo o jornal, oferecido de graça, por uma, duas horas, com a mesma xícara de café? Garçons em seus smokings impecáveis servem, deixam a nota do que foi consumido e só reaparecemse você chamá-los.

Os vienenses consideram Sachertorte muito seca, por isso ela sempre é acompanhada com creme chantilly. Existemvárias versões da Sachertorte, mas a original é um segredo. A receita está guardada numa caixa forte, protegida por extremas medidas de segurança. O diretor e o cozinheiro do Hotel Sacher são obrigados a assinar um contrato de segredo da famosa torta. No Hotel Sacher se produz aproximadamente 270 mil tortas por ano.

BUDAPESTE Os docestambém são maravilhososem Budapeste. E a ConfeitariaGerbeaud também écharmosa. Chega a lembrar aConfeitaria Colombo, que ficano Rio de Janeiro. As tortas delá também são ótimas.A casa foi fundada em 1858.E também está sempre cheiade búlgaros e turistas. Astortas são quase todas asmesmas servidas em Viena.

Há sempre uma boa criação da casa, claro, como a Dominik, com musse de chocolate sobre uma fina torta de amêndoas e com cobertura de chocolate meio amargo. Não há como descrever todos os doces, todas as tentações que provamos ou que resistimos. Afinal, há sempre um balcão refrigerado, lotado de pequenas obras de arte em forma de doce.

E, para um formigão como eu, é até pecado não provar tudo. Mas, se não dá para exagerar, não dá para passar e ignorar tantas criações. Minha parte de ascendência alemã não temcomo resistir. E para quê? Se a vida é doce, que mais doce ainda fique!