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A canetada de Gilmar Mendes

O STF precisa zelar pela Constituição. E zelar significa autocontenção, sobretudo quando a tentação do protagonismo acena

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  • Editorial

Publicado em 5 de dezembro de 2025 às 05:30

A decisão do ministro Gilmar Mendes de reinterpretar pontos centrais da Lei do Impeachment, especialmente ao restringir à Procuradoria-Geral da República a legitimidade para apresentar pedidos contra ministros do próprio STF, impõe ao país uma reflexão necessária. O respeito institucional exige sobriedade, e é justamente em nome dessa sobriedade que a medida precisa ser criticada, com clareza e firmeza.

O Supremo Tribunal Federal tem - e deve ter - a função de guardião da Constituição. Mas guardião não é legislador. Cabe ao Congresso Nacional criar e alterar leis; ao Judiciário, interpretá-las, aplicá-las e garantir sua coerência constitucional. Ao redefinir unilateralmente quem pode pedir o impeachment de ministros e ao elevar o quórum para abertura de processo, o ministro Gilmar Mendes ultrapassa os limites da função judicial e avança para um terreno reservado ao Legislativo. Esse tipo de decisão, tomada por canetada solitária, não apenas reescreve a lei de 1950 como altera parte do sistema de freios e contrapesos.

É impossível ignorar o pano de fundo político. A discussão sobre eventuais pedidos de impeachment contra ministros do STF, ventilada por grupos ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro e potencialmente fortalecida por uma nova composição do Senado a partir de 2026, criou um clima de tensão entre os Poderes. Nos bastidores, comenta-se que o temor de um Senado hostil teria motivado a medida. Se for esse o caso, o gesto revela mais que uma reação preventiva: revela futurismo institucional, um movimento para se blindar de cenários futuros ainda hipotéticos. Mas a pergunta que fica é perturbadora: vale mexer na lei para criar blindagens? O país precisa de estabilidade. Não de mudanças feitas sob suspeita.

A verdade é que nunca houve, até hoje, abertura de processo de impeachment contra ministros do Supremo. As regras existentes, apesar de antigas, jamais produziram instabilidade real. Por isso, modificar a lei agora (e fazê-lo pela via judicial) parece menos resposta jurídica e mais interferência em prerrogativas alheias. Ao retirar do cidadão um direito previsto na lei e ao transferir exclusivamente ao chefe da PGR a legitimidade para denunciar, o ministro cria um funil institucional que concentra poder, reduz controle social e produz a sensação de que a Corte busca se isolar das pressões democráticas. O poder, cabe sempre recordar, emana do povo.

A decisão também abre fissuras desnecessárias entre Supremo e Congresso Nacional. Ao elevar o quórum para abertura de processo para dois terços e ao remodelar o rito, Gilmar não corrige uma distorção. Na verdade, ele cria um novo conflito. O Senado, que já reagiu com veemência, vê suas prerrogativas sendo reinterpretadas sem diálogo, o que só alimenta a crise entre Poderes numa reta final de ano marcada por atritos.

O STF precisa zelar pela Constituição. E zelar significa autocontenção, sobretudo quando a tentação do protagonismo acena.