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Jorge Cajazeira
Publicado em 4 de maio de 2025 às 05:00
A Bíblia nos conta que no sexto dia da criação Deus falou: “deixe-me fazer outra criatura que possa cuidar da Terra para mim. Eu criarei seres humanos, homens e mulheres, meninos e meninas, eles serão como Eu, pois os farei à minha imagem e semelhança. >
”E assim foi feito, do relato bíblico podemos deduzir que todos nós descendemos de uma única mulher, nossa mãe EVA. Será mesmo possível>
O mês de maio é conhecido como o mês das Mães, a data como conhecemos hoje, surgiu nos Estados Unidos no início do século XX, principalmente graças aos esforços de Anna Jarvis. Antes dela, já existiam movimentos isolados, como os clubes de trabalho organizados por Ann Reeves Jarvis, mãe de Anna, que visavam ensinar cuidados sanitários e auxiliar famílias durante a Guerra Civil Americana. Após a morte de sua mãe em 1905, Anna Jarvis iniciou uma campanha para criar um dia oficial em homenagem às mães, como forma de reconhecer os sacrifícios que elas fazem pelos filhos. Em 1908, ela organizou a primeira celebração formal do Dia das Mães em uma igreja metodista em Grafton, West Virginia. A ideia rapidamente ganhou apoio, e em 1914 o presidente Woodrow Wilson oficializou a data a ser comemorado no segundo domingo de maio.>
A celebração se espalhou para diversos outros países, incluindo o Brasil, onde foi oficializada em 1932 por decreto do então presidente Getúlio Vargas. Curiosamente, anos depois, Anna Jarvis passou a criticar a forte comercialização do feriado, lamentando que o sentido original de homenagem sincera tivesse sido, em sua visão, desvirtuado pelo consumismo.>
Anna tinha suas razões. Segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o varejo brasileiro movimentou cerca de R$ 13,2 bilhões no Dia das Mães de 2024, representando um crescimento real de 3,5% em relação ao ano anterior. Os setores de vestuário, calçados e acessórios lideraram as vendas, com R$ 5,1 bilhões, seguidos por farmácias, perfumarias e cosméticos, com R$ 2,6 bilhões. >
Além disso, uma pesquisa da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) estimou que aproximadamente 128 milhões de brasileiros compraram presentes para a data, gerando uma movimentação de R$ 40,21 bilhões nos setores de comércio e serviços.>
O comércio eletrônico também teve um papel significativo, com um aumento de 16,7% no faturamento durante o período, totalizando um acréscimo de R$ 1,6 bilhão. Categorias como perfumaria, vestuário e eletroportáteis apresentaram os maiores crescimentos. Em termos regionais, São Paulo liderou as vendas com R$ 3,9 bilhões, seguido por Minas Gerais (R$ 1,4 bilhão) e Rio de Janeiro (R$ 1,1 bilhão). Estados como Espírito Santo e a nossa Bahia tiveram destaque relativo, com projeções de crescimento de 6,3%.>
Mas voltemos ao relato Bíblico. Seríamos todos filhos de EVA? Acreditem, sim! >
Tecnicamente falando, a ciência genética aponta que todos os seres humanos vivos descendem de uma "Eva mitocondrial" — mas é importante entender bem o que isso significa.A "Eva mitocondrial" é o nome dado ao último ancestral comum pelo lado materno de toda a humanidade moderna. Ela viveu provavelmente entre 100.000 e 200.000 anos atrás. Essa mulher não foi a única mulher viva em seu tempo, nem a primeira mulher da espécie humana — ela é apenas aquela cuja linhagem materna (de mãe para filha) não foi interrompida até os dias atuais. As linhagens de suas contemporâneas simplesmente se extinguiram em algum momento.>
Lembrando os ensinamentos do Prof. Ivan Álvaro de Jesus, meu mestre da Biologia nos tempos do Colégio Marista, um fato muito interessante é que a mitocôndria tem seu próprio DNA (o DNA mitocondrial), separado do DNA do núcleo da célula. Isso acontece porque, acredita-se, as mitocôndrias descendem de bactérias que há bilhões de anos foram englobadas pelas células ancestrais em uma relação de cooperação — uma teoria chamada endossimbiose.>
Ocorre que o DNA mitocondrial é herdado exclusivamente da mãe. Estudando as mutações acumuladas nesse DNA ao longo das gerações, os cientistas conseguiram traçar uma espécie de "árvore genealógica" materna global que leva até ela.>
Mas atenção: isso não quer dizer que havia só ela viva naquela época. Havia milhares de seres humanos, só que, por uma série de fatores de reprodução e sobrevivência, apenas a linhagem materna dela chegou até nós.>
A Eva mitocondrial teria vivido na África, muito provavelmente na região da África Oriental ou Austral. Embora a localização exata ainda seja motivo de estudo e debate, muitas pesquisas genéticas apontam para áreas que hoje incluem países como Etiópia, Quênia, Tanzânia ou regiões próximas no sul da África.>
Essa conclusão vem da comparação do DNA mitocondrial de pessoas de todo o mundo, que mostra maior diversidade genética em populações africanas — e onde há mais diversidade genética é, geralmente, o lugar de origem mais antigo.>
Para estabelecer a época que a EVA viveu se usa o relógio molecular que é uma técnica que os cientistas usam para estimar o tempo de divergência entre espécies ou populações, baseando-se na taxa de mutação do DNA.>
Funciona assim: sabemos que o DNA sofre mutações (pequenas mudanças) ao longo do tempo — e no caso do DNA mitocondrial, essas mutações ocorrem a uma taxa relativamente constante. Com efeito, os cientistas medem o número de diferenças (mutações) entre o DNA mitocondrial de pessoas vivas hoje. Como eles têm uma ideia de quantas mutações surgem em média por geração (por exemplo, uma mutação a cada 3.500 anos — só como ilustração), eles podem “voltar no tempo”, calculando há quanto tempo foi que todas as linhagens maternas atuais se encontraram numa única mulher — a Eva mitocondrial.>
Afinal, todos viemos da África. Todos viemos da mesma mãe.>
A ciência, por meio do estudo do DNA mitocondrial, revelou uma verdade profunda e inescapável: todos os seres humanos vivos hoje descendem de uma única mulher. Ela não foi a única mulher do seu tempo, mas foi aquela cuja linhagem materna atravessou milênios para chegar até nós.>
Essa origem comum não é apenas uma curiosidade biológica. É uma afirmação poderosa de nossa unidade como espécie. A Eva mitocondrial, quase certamente, era uma mulher negra. Sua pele, adaptada à intensa radiação solar africana, carregava a melanina que protegia e dava cor. A diversidade de tons de pele que vemos hoje é uma adaptação recente e superficial: na essência, somos todos filhos e filhas de uma mulher negra africana.>
Quando compreendemos que nossa história começa com uma mulher africana, compreendemos que o racismo é uma traição à nossa ancestralidade mais profunda. Repudiar o racismo não é apenas um dever ético; é um ato de fidelidade à verdade de quem somos. Somos uma só família, vindos do mesmo berço, carregando na mitocôndria de cada célula a assinatura imortal daquela mãe africana.>
Negar o outro é negar a si mesmo. Honrar nossa origem é abraçar a dignidade de toda a humanidade.>
Dedico esse texto a minha finada mãe Dona Dudu. Não se passa um dia sequer que eu não me lembre dela. Saudade sem fim!>
Jorge Cajazeira é Ph.D. pela Fundação Getúlio Vargas (EAESP) e consultor internacional de empresas>