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Da Redação
Publicado em 4 de abril de 2022 às 05:07
- Atualizado há 2 anos
Na brevíssima temporada que passei na Suíça, estive em Vevey, num domingo, com o único intuito de conhecer o Chaplin’s World.>
Andando pelos aposentos preservados da casa, vemos vídeos, fotos, esculturas de cera, obras de arte, utensílios de Chaplin e informações, nas paredes, sobre sua história, sua criação. Fui me emocionando com tudo, mas o que mais me pegou foram as perseguições políticas.>
Chaplin começou a ser malvisto por conta de filmes como Tempos Modernos (1936), onde sua crítica à mecanização do homem soava como uma crítica ao capitalismo. E piorou quando ele criticou Hitler, no filme O Grande Ditador (1940).>
Os desavisados, acostumados às narrativas que sempre põem os EUA como o país da liberdade, democrático e progressista, talvez não saibam que, em 1939, 20 mil pessoas lotaram o Madison Square Garden, em Nova Iorque, para um comício nazista; já com a 2ª Guerra Mundial em curso. Sim, no país da Ku Klux Khan houve forte simpatia ao fascismo alemão, e o governo achava que Hitler era um mal necessário para combater o comunismo; o eterno fantasma de assustar idiotas. Sim, lá, como no Brasil, há sempre idiotas com medo do comunismo tomar conta do país, e o filme O Grande Ditador, criticando Hitler, foi visto com maus olhos. >
Os EUA só entrariam na guerra final de 1941, por conta do bombardeio japonês a Pearl Harbor. O que fez, inclusive, com que o governo do país mandasse cerca de 120 mil cidadãos nipo-americanos – crianças e idosos inclusos – para Campos de Concentração espalhados por 7 estados do país.>
Os EUA acabaram lutando ao lado da União Soviética e, finda a 2ª Guerra Mundial, outra se estabeleceu: a Guerra Fria.>
Como botar medo e inventar mentiras são dois ótimos recursos para cooptar idiotas, em 1950 o senador Joseph McCarthy descobriu uma oportunidade de ouro. O que foi chamado de Macarthismo era a perseguição radical a todos os suspeitos de estarem associados ao comunismo. Prisões, confiscos, interrogatórios.>
Assisti, final de semana, ao documentário A Alma da América (2020), protagonizado pelo historiador Jon Meacham. Preocupado com a guinada à extrema-direta da eleição de Trump, Meacham traça um histórico dos períodos sombrios do país, denunciando um lado nefasto de seu povo e governantes, para mostrar como o país conseguiu, nalgum momento, se livrar de questões como as que citei, aqui, e outras mais, como os direitos civis para mulheres e o povo afro-americano. Meacham deixa claro o quanto McCarthy tinha consciência de que não havia ameaça nenhuma comunista, mas que este seria um bom recurso para se popularizar e conseguir apoio maciço de eleitores.>
Chaplin foi um gênio. Escrevia, dirigia, atuava e compunha a trilha dos próprios filmes. Em 1952, ele, que já havia prestado depoimento sobre acusações de comunismo, e estava com sua vida toda sendo investigada, foi fazer uma breve viagem ao Reino Unido para lançar seu novo filme, Luzes da Ribalta. Foi a oportunidade do FBI revogar o visto de Chaplin, exilando-o do país.>
Chaplin só voltou aos EUA em 1972, há 50 anos, para receber um Oscar honorário. Morreu em Vevey, na Suíça.>
Seja comunismo, mamata da Rouanet, perversão, ou qualquer outra invenção idiota, sempre haverá idiotas censurando, perseguindo e estigmatizando artistas. E idiotas apoiando.>
McCarthy passou para a história como um canalha. Chaplin, como gênio.>
Há sempre a oportunidade de se entender melhor a história, que sempre se repete, para se olhar o presente e se escolher de qual desses lados você quer estar.>