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Kátia Borges
Publicado em 23 de fevereiro de 2020 às 05:00
- Atualizado há um ano
Confesso que nunca soube direito como lidar com a alegria. Os dias que antecediam as festas populares, por exemplo. Ao longo da infância, sempre constantes na Bahia, desenhavam um arco de tensão em minha vida aos oito anos. A obrigação de estar feliz o tempo todo. Permissão para cantar, gritar, dançar, aumentar o volume do rádio. Mas a felicidade, como ensinam as novelas, só vai ao ar no último capítulo.
O desenrolar de um enredo que se resolve quando sobem os créditos. Felizes para sempre, o sempre, esse lugar que nem existe. Nunca me disseram. Como é a sensação? Vencer o medo do escuro, comprar o carro do Batman. A animação de ir, pela primeira vez, ao circo. Ver um leão, o elefante, a dança dos poodles. O domador, chicote em riste. Os palhaços e suas piadas sem graça. As motocicletas no Globo da Morte.
Aprender a ler numa revista em quadrinhos, juntando as sílabas, decorando as suas sonoridades, embaixo da máquina de costura de minha mãe, a sombra da minha árvore. O mundo a revelar as mensagens dos seus outdoors. Ou, quem sabe, a profusão de luzes saltitando no para-brisa do carro. Enquanto avançávamos em direção a Baixa Grande, o serviço de som tocando música triste. Coração de FM.
Na fazenda dos meus avós, os licuris enchendo, até a boca, os tonéis. E, logo depois, o ijexá subindo a rua larga, na Avenida Fernandes, contornando o Largo dos Mares. Uma mágica, essa alegria. A igreja gótica. O perfume do dendê e a casa flutuando no incenso. Meu pai sambando no corredor. Uma canção aleatória dos Beatles. Os archotes acesos no Réveillon, uma trilha de fogo até o mar de Arembepe. Noites de amor ouvindo Barulhinho Bom em looping – “I can see clearly now the rain is gone”. E a felicidade, essa força tão intensa e tão rara, de repente, à porta, sem qualquer convite.