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Kátia Borges
Publicado em 25 de setembro de 2022 às 05:30
- Atualizado há 2 anos
Setembro é um mês esquisito. Talvez porque se situe no ponto exato entre um ano e o próximo. De outubro em diante começam a surgir na linha do horizonte os primeiros prenúncios do Natal e bate aquela sensação de que o que havia de dar certo não deu e é preciso reorganizar todas as metas. Em 1988, o Brasil pós-ditadura tentava estabilizar a economia com planos que fracassavam um após o outro. É inevitável comparar o país ao 737 que o piloto Fernando Murilo comandava naquela quinta-feira.>
Parafuso: o sequestro do voo 375 (parte 1)>
Da experiência trágica e histórica, restaria um laudo de Badan Palhares, atestando que o sequestrador do voo 375 morrera de causas naturais, muito embora estivesse estável, após ser baleado pela polícia, ainda no aeroporto de Goiânia. Mistérios. Nada impede, logicamente, que um paciente experimente uma piora drástica em poucas horas, devido a alguma comorbidade. Mas alguns fios soltos nessa história, muito provavelmente, seguirão balançando, suspensos no ar, para todo o sempre.>
Será que o modus operandi estaria relacionado às viagens do sequestrador? Por duas vezes, o humilde trabalhador da construção civil, descrito como um homem tranquilo e gentil, pelos colegas e vizinhos, esteve fora do país a trabalho. Nenhum jornalista, ao que se sabe, interessou-se em tentar reconstituir seus percursos, contatos e experiências. Também não recordo ter lido investigação alguma sobre a saúde pregressa do sequestrador que justifique sua morte “súbita”.>
Mas, afinal, o que tanto me fascina nessa história do sequestro do voo 375? Talvez o fato de ter convivido com o pânico de voar durante boa parte da vida. Quando começou? É fácil localizar. Um radar danificado, numa viagem de Salvador a São Paulo. A aeronave sobrevoando a capital paulista durante a noite por infinitos minutos. Uma passageira nervosa sentada ao lado, deixando marcas de aflição em minha pele. Mas, acima de tudo, o fato de não estar no controle do manche.>
Aquela ilusão de estar preparado a arriscar qualquer manobra, pronto para enfrentar o imprevisível, tentar um tonneau, mergulhar em parafuso. Bem pior que o aviso sonoro para apertar os cintos durante as turbulências. A necessidade de nunca abandonar o posto na vigia, mesmo caindo de sono. A capacidade de se cercar de garantias absolutamente inúteis em relação ao futuro. O fato de que qualquer uma dessas segundas-feiras seja apenas uma possibilidade contida no domingo.>