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Redes sociais também infantilizam adultos

Para as crianças voltarem a ser protegidas, os adultos precisam voltar a agir como adultos

Publicado em 18 de agosto de 2025 às 05:00

Redes Sociais passam a ter responsabilizadas por posts ilegais de usuários
Redes Sociais  Crédito: Shutterstock

Existem reality shows cujos participantes são adolescentes que fazem bullying ao eliminar os colegas. Algorítimos de redes sociais facilitam a vida de pedófilos na busca e troca de imagens de crianças usando biquinis a partir das fotos ou vídeos inocentes que você posta dos seus filhos brincando na praia. O assunto explodiu a partir do vídeo “Adultização”, do humorista Felca, divulgado através do YouTube. A repercussão foi imediata. O Congresso Nacional prometeu que a pauta seria prioritária.

É realmente assustador o conteúdo do material divulgado. Igualmente apavorante é o fato de que eu e você nunca havíamos escutado falar no autor do vídeo que parou o Brasil e, principalmente, naqueles canais que fazem sucesso entre milhões de jovens produzindo material degradante. Os pais não têm a mínima noção do que seus filhos fazem e os riscos que correm na internet.

Felca não é o primeiro a falar no tema. Antes de ele trazer exemplos tão concretos e chocantes, pesquisas apontavam exatamente o que ele ilustra. O livro “Geração Ansiosa”, de Jonathan Haidt, aponta a explosão dos índices de suicídio entre jovens desde a chegada dos smartphones. Alerta ainda para o fato de que os pais estão superprotegendo os jovens do mundo real, enquanto os deixam completamente expostos a perigos maiores nas redes. “Engenheiros do Caos”, de Giuliano da Empoli, e “Máquina do Caos”, de Mark Fisher, já explicavam o funcionamento perverso dos algorítimos das redes sociais.

Redes sociais não apenas promovem a “adultização” de crianças. Elas também infantilizam adultos. Promovem o pior que nos habita e que, instintivamente, mais captura a nossa atenção. Vivem do gesto inconsciente de diminuir a velocidade para olhar um acidente de trânsito, da excitação com a briga na escola e do prazer pela humilhação alheia. Exploram aquilo que mais mobiliza o ser humano: o ódio, o egoísmo e a possibilidade de culpar alguém pelas nossas frustrações.

O Presidente do País mais poderoso do mundo construiu a carreira política cultivando a imagem infantil e narcisística de valentão e divulgando na internet teorias da conspiração, como a de que o seu antecessor, Barack Obama, não teria nascido nos Estados Unidos. Enquanto governante, age como um garoto mal comportado. Usa o twitter para anunciar sanções arbitrárias sobre outros países, ameaçar empresas, imprensa e universidades, assim como usou o mesmo canal insuflar uma reação violenta quando perdeu uma eleição.

O Brasil tem inúmeros exemplos de pessoas que se elegeram sem nenhuma plataforma séria, apenas porque viralizaram nos computadores declarando ódio a alguém. Assim como Trump e aquelas pessoas que exploram crianças na internet, são habilidosos na exploração da mesma lógica insensível dos algoritmos que Felca, Haidt e Fisher denunciam.

Não pode passar despercebido o fato de que o Congresso, tão chocado e prometendo respostas urgentes após ouvir um humorista, é o mesmo que, a despeito de tantas pesquisas sérias disponíveis, recusou-se a aprovar a Regulação das Redes Sociais, um dos passos indispensáveis para combater o problema. Mesmo após eleitos, parlamentares se dedicam apenas a criar conteúdos que gerem engajamento segundo aquelas regras. Nunca serão a favor da regulação das redes sociais porque vivem justamente da desorganização e irracionalidade que elas proporcionam.

Quem vive da desorganização social não pode conviver com a institucionalidade. Não me refiro a bobagens como uso de paletó ou linguagem empolada. Falo do comportamento sóbrio, da postura e da maturidade que se esperam de determinados atores. Então, deputados e senadores chegam ao cúmulo de vilipendiar a cadeira dos Presidentes do Congresso para tentar impor pautas mesquinhas. É algo tão impensável quanto uma turba de defensores públicos ou juízes invadir, gritando, o gabinete dos chefes das suas instituições.

Felca conseguiu furar a bolha no terreno do adversário. Entretanto, paradoxalmente, um impacto tão positivo justamente através do Youtube, é motivo de alerta. Ele subverteu os algorítimos, mas não o fato de que as redes imperam. Logo um deputado criará um inimigo e a aquela denúncia será esquecida. Algo será feito contra os agentes que transformam instituições em circos, mentem e impedem debates sérios ou eles continuarão sendo eleitos? Para as crianças voltarem a ser protegidas como crianças, não basta um bom vídeo fazer sucesso. Os adultos precisam voltar a agir como adultos.

Rafson Ximenes é Defensor Público