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Vanessa Brunt
Publicado em 5 de abril de 2024 às 05:00
Recomeços, decepções, escolhas, a força da ancestralidade e até mesmo o mar da Bahia. Todos esses aspectos se misturam em poemas de escritores conterrâneos da nova geração, que estão constantemente compartilhando seus pensamentos e suas obras nas redes sociais. Confira e conheça:>
01. Poema de Sofia Oliveira (@sofidisse):>
Recomeçar nem sempre é mudar o caminho,>
mas a forma de caminhar.>
Você precisa se perdoar>
por acreditar que sempre precisa>
acertar.>
Se conhecer é saber quais os dias de voo >
e quais os dias de pouso.>
A felicidade não é uma corrida contra o tempo,>
é um caminho em busca de si.>
Qualquer lugar que não me cabe é passado.>
Se permita sonhar para não se perder >
em sonhos que não são seus.>
Coragem é saber partir.>
*União de frases da autora.>
02. Poema de Vanessa Brunt (@vanessabrunt):>
Se não é tempo de colheita, é de plantio.>
Se não é tempo de plantio, é de podar.>
Se não é tempo de podar, é de analisar perfil.>
Sempre é tempo.>
Até quando parece que não é, ao menos é tempo de descansar.>
E quando parece que não passou, paz sou.>
Porque o que é, já era ontem de outro jeito.>
Não há vento que derrube raiz forte que espalhou e nem tempo que não seja tempo de olhar o feito no de-feito.>
Não há vento que derrube >
profunda raiz.>
E quem é raiz faz parte do levante.>
Tem gente que só vê um pedaço>
da minha cicatriz,>
mas ela não esquece os motivos>
das idas e dos instantes.>
Se me quebro, ganho nova forma.>
Se me fixo, me espalho.>
Nada no mundo me conforma.>
Só quem não é raiz é que acha bom>
se segurar em galho.>
Tem gente que só vê meu lado>
apegado à terra>
e tem gente que só vê>
o quanto quero mais.>
Esquecem que, no resumo,>
já não guardo rancor,>
mas não esqueço da guerra.>
Aqui só fica água, sol e a lição>
dos ancestrais.>
Deixar>
um tanto de mim>
em cada lugar.>
Não deixar>
que tirem de mim>
o meu lugar.>
03. Poema de Paula Anias (@paulaanias):>
Atravesso o mar da Bahia>
No sol de todos nós trago comigo uma mala na mão>
Dentro uma oração de mainha>
Fé, força e proteção>
Sou um corpo, um ser, uma nação>
A história de um lugar, Bahia>
Sou embarcação >
De um povo todo, Porto seguro de Filho e Alegria>
E palavra de direção, sou Mulherio da Bahia>
Mulher, mãe e filha.>
Em garrafas flutuantes encontrei>
Cartas escritas por olhos confessos>
E naquelas narrativas mergulhei>
Kirimurê, águas de Paraguaçu, >
Baia de Todos os Santos, velejei nos progressos.>
Exuberante beleza, Sagrado feminino, >
Flor a desabrochar na beira do rio.>
A vida nos convida a festejar o dia, >
Chuva que cai do céu a beijar chão e navio.>
Paradisíaca terra, abelha rainha, >
Novo Mundo que encantou o viajante.>
Rica fauna e flora, na beira do mar , no azul piscina, >
Da praia de Mar Grande.>
Vejo a criação se desdobrar onde enchia. >
Eu, o universo e a minha Bahia.>
04. Poema de Lívia Natália (@livianataliapoeta):>
Asé>
Sou uma árvore de tronco grosso.>
Minha raiz é forte,>
nodosa,>
originária,>
betumosa como a noite.>
O sangue,>
ejé que corre caudaloso,>
lava o mundo e alimenta>
o ventre poderoso de meus Orixás.>
A cada um deles dou de comer>
um grânulo vivo do que sou>
com uma fé escura.>
(Borrão na escrita do deus de olhos docemente azuis).>
Minha fé é negra,>
e minha alma enegrece a terra>
no ilá>
que minha boca escapa.>
Sou uma árvore negra de raiz nodosa.>
Sou um rio de profundidade limosa e calma.>
Sou a seta e seu alcance antes do grito.>
E mais o fogo, o sal das águas, a tempestade>
e o ferro das armas.>
E ainda luto em horas de sol obtuso>
nas encruzilhadas.>
(Livro Água Negra)>
05. Poesia de Elizza Barreto (@elizzabarreto):>
será que as folhas>
também sentem medo>
ao se despedirem de seus galhos?>
encaram saltos arriscados>
traçam planos em suas linhas>
acumulam cadernos de ideias>
post-its com nomes de cidades>
roteiros improvisados>
promessas?>
a sensação de não conseguir ser raiz>
sempre precisar voar>
ser folha seca>
parte de algo>
nunca a árvore>
(Livro Ballet das Folhas)>
06. Poema de Vanessa Brunt (@vanessabrunt):>
Para os nãos, melhorias.>
Para os adeus, aprendizados.>
Para os choros, alegrias>
Em alguns pontos revelados.>
Para os aqui, a clemência>
De saber continuar.>
Para os ruins, a inteligência>
De nos memorizar.>
Para todos, nossas marcas.>
Para os bons, nosso esforço.>
Para os sonhos, nossas barcas.>
Para os medos, nosso esboço.>
Para o ato, não ter dó>
Que viver é por um triz.>
Para quem não poetar,>
Nossa eterna cicatriz.>
Para a grandeza, paciência.>
E pós vitória, atividade.>
Para o que é morno, abstinência.>
Para o que ferve, eternidade.>
Para o amor, a mudança>
Para saber prosseguir>
Que nada fica sempre igual>
Mas nos merece se o fe-RIR .>
(Livro Depois Daquilo)>
07. Poema de Romildo Alves (@romildoalves.cordel):>
Por terras desconhecidas, >
jogar sementes do reino >
no campo das novas vidas.>
Vá ser sinal de amor, >
luz e sal, ser bom pastor,>
salvar ovelhas perdidas.>
Crava um verso na testa do destino,>
põe no saco um punhado de vontade,>
veste a força ideal da liberdade.>
Que o futuro badala o seu sino,>
Pois o tempo é também um assassino,>
agiota terrível, impiedoso,>
que trajado se mostra tão formoso>
aos sonhos que moram na algibeira.>
É amigo da morte e da poeira,>
nada nele é pra sempre grandioso.>
Sobe o monte da sorte que plantou,>
colhe a calma que a tudo alimenta,>
a distância mais longe se ausenta.>
Quando menos se espera já chegou.>
Se o acaso ao ocaso apelou,>
tudo chega, às vezes sem querer,>
seja em forma de dor ou de prazer.>
Os ponteiros que giram também param>
umas calam e outras vozes falam>
no momento que o tempo aparecer.>
08. Poema de Mariana Paiva (@marianapaivacultura):>
no playground da vida,>
os meninos correm>
alheios aos avisos de silêncio>
tornam tudo em barulho,>
risada, alegria,>
os meninos>
pé descalço>
toda hora>
toda hora>
é de brincar>
olhar amigo do amanhã>
os meninos>
trazem o futuro pela mão>
ensinando ele a brincar>
os meninos>
barulho>
risada>
alegria>
o tempo é um menino deitado>
na areia de uma praia distante>
que o olhar viu>
nas bancas de jornais>
ô, erê, chega perto,>
faz do menino amigo das ondas do mar>
ô, erê, carrega no colo,>
traz um sonho bom pro menino sonhar>
e amanhecer num outro dia>
todos os meninos>
barulho>
risada>
alegria>
09 - Matheus Peleteiro (@_matheuspeleteiro)>
PASSOS FORTES>
sei que quando reencontrar>
o meu primo de outro trópico,>
enxergarei como novidade as rugas>
que se formaram em sua face,>
os pés de galinha a crescer em seu olhar,>
e as suas olheiras ainda maiores.>
sei que a cada vez que voltar>
ao bairro em que um dia cresci,>
deixarei de encontrar alguém lá.>
o caixa grisalho do supermercado,>
o jovem alegre da venda de frutas,>
o contador de causos da água de coco.>
olho para os recém-nascidos de meus amigos>
e sei que logo desatarão a me chamar de tio;>
que toda vez sou outro quando me olho no espelho>
e que basta o decurso de poucos anos>
para que a rua onde caminho agora>
não se pareça mais com o que é.>
da mesma maneira, não me esqueço>
de que em todo lugar onde piso,>
posso estar pisando pela última vez.>
por isso, dou passos fortes>
e deixo as marcas das minhas pegadas,>
para que elas durem, firmes e perseverantes,>
até que a primeira chuva as dissolva.>