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Gil Santos
Publicado em 25 de janeiro de 2021 às 12:55
- Atualizado há 2 anos
Ninguém quer pegar o coronavírus, mas um estudo apontou que 20% da população de Salvador já contraiu o vírus, e muita gente nem soube. O relatório epidemiológico foi encomendado pela prefeitura à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e os resultados da primeira fase foram apresentados nesta segunda-feira (25).>
De maneira objetiva, o estudo revelou que apesar do número de pessoas diagnosticadas com a doença em Salvador estar na casa dos 122 mil, a quantidade real é bem maior. Equipes estiveram em bairros dos 12 distritos sanitários da capital, visitaram 2.558 domicílios e fizeram cerca de 400 entrevistas presenciais.>
Eles fizeram 2.970 testes, e identificaram 604 pessoas com anticorpos IgG (já teve o coronavírus) e IgM (foi diagnosticado com a doença no momento do exame). O prefeito Bruno Reis foi quem apresentou os dados e disse que os resultados foram obtidos através de uma pesquisa por amostragem. A estimativa é de que 20% dos 3 milhões de habitantes da capital já tiveram a doença, cerca de 600 mil pessoas. >
“Desde o início da pandemia sentíamos a necessidade de ter um dado sobre a quantidade de pessoas que já havia contraído o vírus em nossa cidade. A gente se baseou na ocupação de leitos e no número de óbitos diários [para tomada de decisões]. Sempre que a gente ampliava o número de testes aumentava o número de infectados, mas a gente ainda não tinha uma amostragem da cidade toda, um estudo que pudesse estimar quantas pessoas já tinha contraído o vírus”, contou.>
A parceria com a Fiocruz surgiu nesse sentido. Segundo o prefeito, através da análise desses dados será possível identificar qual parte da população está imunizada, ainda que provisoriamente, e quais decisões precisam ser tomadas. O estudo é dividido em fases, e vai avaliar a capacidade de resposta dos indivíduos à doença.>
Bairros A pesquisa também conseguiu identificar os bairros onde a população foi mais infectada. Os distritos sanitários de Itapagipe e Liberdade lideram o ranking. Segundo o estudo, 29% dos moradores de cada uma dessas regiões já tiveram a doença, com sintomas ou não. Em seguida aparece São Caetano (26%), Cajazeiras (25%) e Itapuã (22%). Confira a tabela completa abaixo. Itapagipe e Liberdade lideram ranking de casos de coronavírus em Salvador (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Nos distritos líderes, o movimento de pessoas nas ruas é intenso e muitas delas não utilizam a máscara corretamente ou nem mesmo a levam consigo. O cenário em plena segunda-feira parece na verdade de final de semana, mas o comércio a pleno vapor confirma a data. Na porta das casas e nos bares, pessoas sentadas em mesas bebendo cerveja.>
Nas praças, meninos jogando futebol e mais pessoas reunidas sem máscara. Até mesmo comerciantes não utilizam o equipamento de segurança corretamente. Além disso, outros locais de aglomeração são os pontos de ônibus, que estavam lotados, e o sol do meio de tarde fazia as pessoas se apertarem ainda mais na disputa por sombra. >
Na Ribeira, Praia da Penha cheia. Muitas pessoas em quiosques da beira mar e também na areia. Reunião para piquenique na sombra, vôlei de praia, som tocando. Mas, segundo uma vendedora de caldo de cana, moradora do bairro, o movimento ainda estava fraco para o que era normalmente antes da pandemia. Dona Conceição da Silva, de 59 anos, contou que viu a filha e também vizinhos atravessarem a doença. “Antes o pessoal estava mais em casa, mas as pessoas têm que sair, até mesmo para trabalhar, aí os ônibus estão lotados. Eu tenho medo, porque ninguém está livre. É uma doença que todo mundo sabe que está matando. Mas tenho que trabalhar, né?”, disse a ambulante.>
O oficial de manutenção e morador de Caminho de Areia Sílvio Oliveira, de 50 anos, estava comendo caranguejo em um bar e relatou ao CORREIO que vários vizinhos foram infectados e ele mesmo já teve a covid-19. “Na virada do ano eu estava isolado de covid. Eu, minha mãe de 84 anos, minhas irmãs e minhas sobrinhas. Foi quase a família toda. Eu devo ter pego no trabalho, que teve muitos casos, e levado para dentro de casa, porque na verdade eu nunca gostei de usar máscara", confessou. 29% dos moradores de Itapagipe já tiveram a doença (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Barraqueiro há mais de 40 anos, Seu Antônio Luiz, de 63 anos, está na região quase todos os dias da semana e contou que é na Praia do Bugari onde acontecem as maiores aglomerações, inclusive com festas paredão. Ele relatou que também conhece pessoas que foram infectadas. “Lá no Bugari fica uma multidão, a faixa de areia é mais curta e ninguém vai atrás, não faz nada. Conheço moradores daqui que já tiveram a doença e até mesmo faleceram. São amigos, conhecidos, comerciantes também. Teve uma família que perdeu dois irmãos”.>
Na Liberdade, movimento também intenso, principalmente do comércio de rua. Segundo uma moradora do bairro que preferiu não se identificar, a circulação na região está igual a como era antes da pandemia. “As pessoas parecem não acreditar na doença. E agora então que chegou a vacina, o pessoal está achando que já acabou o coronavírus. Muita gente sem máscara, bares cheios, tanto dia de semana quanto final de semana. Aqui não tem dia”, disse a moradora.>
No estabelecimento em que trabalha, uma faixa para impedir a aproximação dos clientes do balcão e placas nas paredes avisando que só será atendido quem estiver de máscara. Mas, segundo a moradora, nem todo mundo respeita. “Eu tenho medo sim. Por isso coloquei a faixa e os avisos. Mas muita gente chega aqui sem máscara e nem sempre eles atendem quando a gente pede para colocar”, relatou. (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) A dona de casa Iolanda Assis, 56 anos, mora no bairro de Paripe, no Subúrbio Ferroviário. A região é a menos infectada até o momento. “Eu fico até surpresa em saber disso porque nem todo mundo está respeitando o isolamento. Tem muita gente se aglomerando sem necessidade, mas na rua onde moro tem muita gente consciente também”, contou.>
Para o prefeito o fato dos números estarem baixos no Subúrbio não é motivo para comemorar. Ele voltou a frisar sobre a necessidade de evitar aglomerações, usar máscara, e higienizar as mãos com frequência, seja com álcool em gel ou com água e sabão. >
“No Subúrbio 9% da população contraiu o coronavírus, ou seja, 91% das pessoas ainda não foram infectadas. Esse é um número preocupante tendo em vista que o Subúrbio é uma região que tem a concentração populacional maior, com maior número de habitantes por casa, e onde as casas estão mais próximas umas das outras, ou seja, uma região mais difícil de fazer o isolamento social”, contou.>
Metodologia O relatório foi construído através de uma parceria entre a prefeitura e a Fundação Oswaldo Cruz. O Município forneceu pessoal, veículos, e testes para covid, entre outros recursos, enquanto a Fiocruz entrou com a análise dos dados colhidos, e com suporte técnico e científico.>
O estudo tem quatro objetivos. Estimar a quantidade de soteropolitanos com anticorpos para o vírus, avaliar a duração dos anticorpos nessas pessoas, determinar o percentual de assintomáticos ou subclínicas, e analisar os aspectos sociodemográficos da doença.>
Na prática, os pesquisadores vão acompanhar para saber por quanto tempo uma pessoa terá o IgG positivo, e para isso o estudo foi dividido em quatro etapas. Na primeira fase os intervalos entre os testes serão de 30 dias. O primeiro foi apresentado nesta segunda-feira (25). Haverá outros três. Já na segunda fase os intervalos serão de 180 dias.>
Confira o ranking das regiões mais infectadas de Salvador:>
Itapagipe (29%) Liberdade (29%) São Caetano (26%) Cajazeiras (25%) Itapuã (22%) Boca do Rio (21%) Cabula (19%) Pau da Lima (17%) Brotas (16%) Centro Histórico (15%) Barra/ Rio Vermelho (12%) Subúrbio (9%)>
*Com orientação da subeditora Monique Lôbo >