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Marcela Vilar
Publicado em 12 de fevereiro de 2021 às 05:00
- Atualizado há 2 anos
A pandemia fez com que hotéis, bares, restaurantes e tudo que não fosse serviço essencial ficasse fechado, para evitar a disseminação do novo coronavírus. Com isso, o setor de serviços foi extremamente afetado no ano de 2020. A Bahia teve uma queda histórica de 14,8% no setor, a maior desde 2011, segundo dados da Pesquisa Mensal de Serviços (PMS), divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nesta quinta-feira (11). >
Esse é o sexto percentual negativo seguido no estado. No ano passado, ele ficou bem abaixo do Brasil – a queda nacional foi de 7,8% - e foi a quarta maior queda entre os 27 estados do país. A Bahia só ficou atrás de Alagoas (-16,1%), Rio Grande do Norte (-15,7%) e Sergipe (-15,1%). Somente o Amazonas (0,5%) e Rondônia (0,3%) fecharam o ano com variações positivas. Todos os meses tiveram resultados negativos no estado baiano. >
O IBGE aponta que todas as atividades de serviços tiveram recuo na Bahia, o que já tinha acontecido em 2015 e 2016. Só que, em 2020, a categoria de serviços prestados à família teve a maior retração de todas, com baixa recorde de 39,8%. Nesse segmento, estão os restaurantes, hotéis, serviços de bufê e produção e promoção de eventos esportivos e atividades de ensino ligadas a cursos profissionalizantes, técnicos e autoescolas, por exemplo. A atividade mostrou recuos em 11 dos 12 meses do ano e avançou apenas em fevereiro, quando subiu 2,6%. >
Para o presidente da Federação Baiana de Hospedagem e Alimentação (Fehba), Silvio Pessoa, a estatística não surpreende. “Ano passado fechamos a ocupação de hotéis em 36,79%. Em 2019, a gente teve uma ocupação média de quase 64%, então isso dá mais ou menos 40% de queda. Os números são muito próximos do que estávamos trabalhando também em nossas pesquisas”, afirma Pessoa. Mensalmente, a Fehba faz pesquisas com os 20 maiores hotéis de Salvador, que dá um parâmetro sobre o setor. >
Além da redução na ocupação dos meios de hospedagem, a Bahia sofreu com o fechamento de bares e restaurantes. O presidente de Fehba estima que 30% dos restaurantes não voltem a funcionar. Com isso, o estado perdeu milhares de empregos. “Nosso cálculo é que entre 5 a 10% dos hotéis não voltem mais à atividade. Para bares e restaurantes, são mais de 30% que não voltam mais. Na Bahia, já foram mais 60 mil postos de trabalho perdidos em restaurantes e 20 mil na rede hoteleira, ou seja, são 80 mil postos de trabalhos perdidos no estado no ano passado, sendo 200 mil indiretos”, revela. >
Ao todo, são 4.170 meios de hospedagem na Bahia, sendo 410 em Salvador. A capital baiana tem mais de 40 mil leitos e 10 mil bares e restaurantes - no estado, são quase 30 mil. Segundo Silvio, o turismo representa 7,5% na economia da Bahia e 20% na de Salvador. Alguns hotéis permanecem fechados em Salvador, como o Novotel, no Rio Vermelho, o MarAzul, na Barra e o Sotero, no Stiep. >
Por conta de o estado ter o terceiro maior polo hoteleiro do Brasil, a queda registrada na Bahia foi maior que a maioria dos estados e bem maior que a do país. “O setor de turismo integra mais de 50 setores da economia, é enxoval, lençol, pintura, ar condicionado, construção, hortifruti, produtos agropecuários, motoristas, ou seja, a mola da economia de Salvador é o turismo e temos polos como Morro de São Paulo, Mata de São João e Porto Seguro, que vivem do turismo”, argumenta Pessoa. >
O presidente também ressalta que o turismo local e regional, mais fortalecido com a pandemia da covid-19, não sustenta, sozinhos, os empreendimentos locais. Com a malha aérea ainda restrita, a perspectiva de retorno ao patamar atingido em 2019 é distante. Sem um plano de retomada estabelecido para o setor, a dificuldade é maior ainda. “Estamos até hoje sem um plano de retomada apresentado pela Setur [Secretaria de Turismo da Bahia], ou seja, ficamos parados quase seis meses e os protocolos não foram discutidos até hoje entre o município e estado. Precisamos de mais proatividade dos governos e de planejamento, promoção e marketing para atrair esses visitantes, que estão sendo muito disputados por outros estados”, conclui Pessoa. >
Uma das pessoas que perdeu o emprego foi o gerente geral do Real Classic Bahia, Luis Derieul. Na verdade, ele resolveu se demitir, em novembro, por conta de tantos meses de reduções salariais. Ele conclui que a crise foi pior ainda na rede hoteleira coorporativa. “Hotel coorporativo teve média de ocupação em torno de 30%. As famílias não trazem ninguém para o centro da cidade e viagem coorporativa simplesmente acabou, então o cenário é de tragédia total. Eu vendo essa situação se agravar, quase que não estava sobrevivendo. Meu salário de gerente geral de 8,9 mil reais reduziu para três. E com três mil reais eu quase que não sobrevivo”, desabafa Derieul. >
Na unidade, pelo menos 30% da equipe de trabalhadores foi demitida. Agora, o antigo gerente do Real Classic busca oportunidade em outros polos, como em Porto Seguro e Itacaré e Sergipe. “Na forma que eu estava, estava muito ruim, e estou fazendo o impossível na expectativa que o setor volte à normalidade, mas a situação é muito desastrosa. Dentro do turismo, o turismo de eventos coorporativos é o que mais está sofrendo, o melhorzinho é o de lazer, dos resorts”, relata Luis. >
No caso do Mar Brasil Hotel, em Itapuã, conhecido por ter sido a casa do antigo cantor e compositor Vinícius de Moraes, a situação foi “dramática” em 2020, como definiu proprietária Renata Prosérpio. “Nunca tivemos que desempregar como fizemos em 2020, e não foram pessoas com mau desempenho, são pessoas que tivemos que desligar porque não havia receita suficiente para pagar a equipe. Na hotelaria, em geral, tivemos uma ocupação média e 37,4%, que é algo que nunca tínhamos visto na história de Salvador”, contou Renata, que também é diretora de Relações Institucionais da Associação Baiana de Hotéis (ABIH-BA). No seu hotel, ela teve que reduzir 40% do pessoal. O faturamento, também caiu, em 20%. O empreendimento esteve aberto durante toda a pandemia e foi um dos primeiros a receber o Selo de Turismo Responsável do Ministério do Turismo (MTur). >
O perfil dos turistas também mudou. “O público, no verão, normalmente eram portugueses, espanhóis, argentinos e chilenos. Hoje, basicamente são brasileiros de Salvador, do interior da Bahia e de estado perto, como Minas Gerais, que dá para o pessoal vir de carro. Minha garagem está sempre lotada, porque agora ninguém mais vem de avião. O perfil do público mudou muito, é bastante regional”, narra a empresária. “Foi um ano muito difícil. Temos, pelo menos, a esperança da vacina poder mudar esse cenário, para que 2020 nunca se repita”, completa. >
Serviços turísticos fecham 2020 com queda recorde de 37,2% >
Os serviços ligados ao turismo, como hospedagem, transporte de passageiros e agências de viagem, fecharam o ano também com uma queda recorde de 37,2%. O resultado foi próximo ao nacional (-36,7%) e o sexto pior entre os 12 estados pesquisados. Todos eles mostraram recuos, sendo o menor em Santa Catarina (-30,6%) e o mais intenso no Distrito Federal (-44,2%). >
No entanto, no final do ano, o turismo mostrou uma melhora. Entre novembro e dezembro de 2020, as atividades ligadas ao turismo tiveram o quinto resultado positivo consecutivo na Bahia e cresceram 7,6%. Foi o segundo melhor desempenho entre os 12 estados, abaixo apenas do Distrito Federal (16,6%), e bem superior ao do país como um todo (0,0%). >
Para a Secretaria de Turismo da Bahia (Setur), esse desempenho ruim já era esperado. “Uma vez que o Turismo está entre as atividades mais relevantes para a economia da Bahia, sobretudo para o setor de serviços. Isso é fruto da primeira fase da pandemia, que praticamente zerou a ocupação nos hotéis e deixou bares e restaurantes fechados por alguns meses. Isso foi o remédio amargo que provamos naquela época para que mantivéssemos o máximo controle sobre o coronavírus”, respondeu a Setur, por meio de nota. >
A perspectiva, porém, é positiva para a pasta. “Aos poucos, o turismo tem dado sinais de recuperação. Segundo a ABIH, já tivemos uma taxa superior a 50% em janeiro e, à medida que formos ampliando a cobertura vacinal, retomaremos nossos índices e chegaremos a taxas mais próximas da normalidade”, comentou. A secretaria ainda disse que, no primeiro semestre de 2021, entregará “importantes equipamentos náuticos no entorno da Baía de Todos-os-Santos", requalificados através do Prodetur Nacional Bahia e que beneficiará “18 municípios que compõem esta zona turística e que irá dinamizar o turismo náutico”, conclui. >
Outros dados da pesquisa >
A pesquisa do IBGE também avaliou o desempenho de outras categorias, que compõem o setor de serviços. O grupo transportes, serviços auxiliares aos transportes e correio teve a segunda maior contribuição para o desempenho dos serviços baianos em 2020 e apresentou queda de 11,3%. >
Os serviços profissionais, administrativos e complementares tiveram a segunda maior queda, com 12,4%, seguido da categoria “outros serviços”, que caiu 11,6%. Nessa última, são analisadas atividades da área financeiras - corretoras de títulos e valores mobiliários; administração de bolsas e mercados de balcão organizados; consultoria em investimentos financeiros; corretores e agentes de seguros, de previdência complementar e de saúde. Por fim, o segmento que apresentou menor queda entre os cinco analisados foi o de informação e comunicação, que caiu 8,8%. >
Variação setor de serviços Bahia // Brasil (fonte: IBGE) 2012: + 2,6% / + 4,3% 2013: + 4,9% / + 4,1% 2014: + 3,8% / + 2,5% 2015: -6% / -3,6% 2016: -8,6% / -5% 2017: -4,5% / -2,8% 2018: -3,3% / 0% 2019: -2,2% / + 1% 2020: -14,8% / -7,8% >
*Com a orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro >