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Executivo acredita que agro precisa investir mais nos trabalhadores, e não apenas em tecnologia
Donaldson Gomes
Publicado em 21 de novembro de 2023 às 05:00
O trabalho de Santiago Franco rende um livro. Quando o agrônomo colombiano assumiu o comando da Cibra, até então uma pequena fábrica de fertilizantes instalada em Camaçari, há doze anos, a empresa faturava R$ 70 milhões por ano. Hoje a Cibra fatura R$ 8 bilhões anuais e possui mais 13 unidades, espalhadas pelo país. Eram 70 funcionários e agora, mais de 1,5 mil. O segredo da virada de chave? “O agro sempre se preocupou muito com tecnologia, mas pouco com a gestão de pessoas”, avalia Santiago Franco, que também já viveu uma fase de acreditar no “comando e controle” como melhor maneira de lidar com com pessoal. “Eu já fui chefe e hoje posso dizer que vivo um processo de transformação”, reconhece em entrevista exclusiva. A virada de chave, que permitiu à Cibra um crescimento de 70 vezes, é o assunto do livro que Franco está lançando: “Liderança e gestão de pessoas no agronegócio: como a gestão focada em pessoas pode trazer resultados extraordinários para sua empresa”.
Quem é
Santiago Franco é agrônomo e CEO da Cibra Fertilizantes. Tem mais de 30 anos de experiência no agronegócio brasileiro e internacional. Ao assumir a Cibra em 2012. Antes dela, dirigiu a Divisão Agro na Abocol (Colômbia) e foi responsável pelas operações comerciais da OFD Holding, onde liderou a expansão das operações para o México, América Central, Peru e Bolívia, além de exportações de fertilizantes especiais para 40 países. Graduou-se em Engenharia Agronômica pela Universidad de Caldas, na Colômbia, e no mesmo país fez pós em Administração de Empresas no INALDE Business School.
O título do seu livro chama atenção. Como é que a gestão de pessoas é, normalmente, tratada no agro?
Na minha visão, ainda impera muito um estilo de gestão bastante focado na chefia, num processo de comando e controle. Muitos negócios passam de pai para filho e este estilo do dono antigo, que acredita que precisa ter o poder centralizado dentro da empresa, controla tudo, todas as decisões passam por ele e não instiga os seus colaboradores a darem ideias novas e participar das decisões. Normalmente todas as decisões passam pelas mãos de uma única pessoa. É o que algumas pessoas chamam de microgerenciamento e outras, comando e controle. Eu defendo no livro e, posso falar pela minha vivência pessoal e profissional, que quando a gente dá espaço as pessoas, tratar bem os funcionários, formar uma cultura forte na empresa, isso dá resultados, mas não apenas isso. Traz satisfação e gera resultados no longo prazo. Quando se tem um estilo de gestão de comando e controle, os bons funcionários não ficam, procuram outros locais para trabalhar, onde possam se desenvolver e expressar as suas ideias. Ficam apenas os ruins, os que são medíocres e se acomodam a cumprir apenas o que o chefe manda. Eu acho que ainda é muito comum esse formato no agro e o meu propósito com o livro é realmente inspirar os gestores jovens, empresários do agro, executivos que almejam crescer, que entendam a importância que focar nas pessoas pode ter para as suas carreiras.
Eu imagino que com o passar do tempo e as mudanças geracionais essas questões vem ganhando cada vez mais importância. Cada vez mais, as pessoas buscam estar em empresas alinhadas aos seus propósitos e ideais.
Sim, este é um assunto cada vez mais atual e necessário. Nós estamos num momento de mudanças muito rápidas e significativas para os negócios. Você mencionou uma palavra que é central em minha trajetória, que é o propósito, é o que tentamos dar na Cibra, senso de propósito e de pertencimento. Assim, as pessoas conseguem se realizar tanto profissionalmente, quanto do ponto de vista pessoal. O agro, nas últimas duas ou três décadas, tem focado bastante na adoção de tecnologias. Então, a gente foca muito nisso, na parte técnica, no maquinário, no satélite. Digamos que, por focar tanto nestas questões, tem deixado de olhar para as pessoas. Só que tecnologia não faz milagres, a gente precisa de pessoas. Essas tecnologias precisam de pessoas muito mais desenvolvidas, capacitadas e engajadas na gestão do que antes, quando os trabalhos eram simplesmente manuais.
Não sei se você sempre teve essa visão, ou se este olhar foi amadurecendo com o tempo, mas como foi a implantação disso na Cibra?
Foi uma virada de chave para mim sim, mas foi muito gradual. Eu sou agrônomo, sou colombiano. Estou há 11 anos no Brasil, sempre morando em Salvador. Já cheguei aqui um pouquinho transformado. Quando eu iniciei a minha carreira, era um agrônomo técnico, que achava que aquele conhecimento que eu adquiri na faculdade era tudo o que eu precisava para me virar na vida profissional e crescer. Lentamente, fui descobrindo que a realidade não é esta. Os nossos cursos na faculdade, para o agro de maneira geral, nos ensinam agronomia, engenharia, administração de empresas, zootecnia, e outras, de maneiras muito técnicas. Apenas tangencialmente as nossas formações tocam em questões voltadas para a gestão e, quando fazem isso, é sempre por um olhar mais financeiro, contábil. A gestão de pessoas fica de lado. Eu comecei minha carreira sendo um chefe, que acreditava em comando e controle, que simplesmente ordenava para os colaboradores que fizessem o que eu achava que deveriam fazer. Só muito tempo depois que eu fui evoluindo e descobrindo que precisava engajar e envolver muito mais as pessoas. Escutar mais. O meu case profissional e pessoal é o que valida a minha tese de que focar nas pessoas dá resultados. Eu já vivenciei isso. Fiz muitas coisas que estão contadas em meu livro.
Este olhar do agro para tecnologia e inovação tem como finalidade alcançar resultados em termos de produtividade e finanças. Você consegue comprovar que investir em pessoas também ajuda a alcançar estes resultados?
Uma confirmação é o meu resultado como gestor. A Cibra é uma empresa sediada em Camaçari que hoje tem 13 fábricas no Brasil inteiro. Quando cheguei, a empresa estava muito mal das pernas. O faturamento em 2012 foi de R$ 70 milhões. Em 2022, no ano passado, o faturamento foi de R$ 8 bilhões. Eu te garanto que só tecnologia não teria feito isso. Precisamos de muitas pessoas engajadas, tivemos que dar autonomia para elas e acreditar na motivação dos nossos times. A gente entendeu que precisava trabalhar para fazer as pessoas desejarem permanecer por muito tempo na empresa. Se você tem uma alta rotatividade, como acontece numa gestão que não foca nas pessoas, você não consegue ter resultados consistentes ao longo do tempo. O chicote e a canetada funcionam só no curto prazo. No longo prazo, você não terá resultados consistentes.
Quais foram as principais transformações na rotina da empresa?
Essa é uma pergunta muito boa, que até agora ninguém fez. Eu acho que a principal delas foi a de passar para todo mundo, com muita clareza, as metas, objetivos e os nossos valores. Este é o nosso alicerce. Mas a gente precisa fazer um esforço muito grande para, não só praticar estes valores, que eu considero o primeiro passo. Se eu desejo que os funcionários atuem de uma determinada maneira, é preciso que eles vejam isto em mim. Mas não é apenas isso, temos que comunicar muito claramente os nossos ideais e nossos propósitos. E tem mais uma coisa que é muito importante. Quando a gente contrata pessoas, a gente comunica muito claramente os nossos valores. A gente olha muito para os valores das pessoas para sabermos se elas vão se conectar com o que nós queremos. Um exemplo disso é que temos a transparência como um dos nossos principais valores. Obviamente, tem coisas que são guardadas para depois, mas nossos resultados são apresentados todos os meses para quem está com a gente. Todos os funcionários sabem o que está acontecendo na área deles e em todas as outras. As pessoas gostam de saber se o time está ganhando ou não, assim todo mundo consegue se engajar. Quando o resultado não está bom, fazemos um esforço adicional. Se está bom, cada um se sente parte daquilo. Fizemos uma transformação cultural. A base da empresa é a sua cultura e, neste sentido, você pode pensar e desenvolver a cultura que deseja. Se você não fizer isso, vai surgir uma cultura, mas será algo que pode não ter nada a ver com onde você deseja chegar. Por isso trabalhamos tanto os nossos valores.
Quantas pessoas trabalham na Cibra atualmente?
Aproximadamente 1,5 mil. Antes eram 70 pessoas e R$ 70 milhões de faturamento, este número inicial está muito claro em minha mente. Hoje somos 1,5 mil, temos 13 fábricas e temos pessoal espalhado por todo o país. Uma das coisas que fizemos nos últimos anos, além do foco na cultura, foi trabalhar um mindset de inovação, queremos ser uma empresa que está sempre inovando. Pouco antes da pandemia já tínhamos iniciado o uso do formato do trabalho remoto. Quando ela aconteceu, adotamos o formato de 100% home office. Hoje, somos uma empresa grande que não tem um escritório.
Criar uma cultura é desafiador, mas mante-la, principalmente quando se tem um processo tão rápido de crescimento é ainda mais difícil. O que vocês fazem para preservar isso?
Este é o meu principal desafio. As pessoas pensam que o presidente da empresa, o CEO, vive focado na operação, no resultado ou na produção. Claro que eu olho para tudo isso, mas em mais da metade do meu tempo eu estou dedicado às pessoas e ao fortalecimento da nossa cultura. Estou sempre envolvido e engajado em atividades no dia a dia que visam fortalecer isso.
O agro é uma atividade fundamental para as nossas vidas, mas acaba não tendo uma imagem compatível com a excelência e a importância do trabalho que realiza. Você acha que iniciativas como esta, de investir mais na gestão de pessoas pode ajudar a mudar essa imagem?
Tenho certeza disso e estou comprometido com este propósito também. O agro, não apenas no Brasil, mas de maneira geral, não tem uma imagem muito positiva. As pessoas esquecem que quando elas comem, vestem, se transportam, são abastecidos por agricultores. Tudo o que fazemos no nosso dia a dia depende do trabalho de um agricultor. O que eu vejo é uma desconexão com a rotina da vida moderna e o que facilita esse estilo de vida. Isso é histórico, mas tenho o compromisso de mudar isso. Um em cada quatro empregos no Brasil é gerado pelo agronegócio, então se tivermos uma gestão de pessoas mais humana e eficiente, iremos melhorar a vida de muita gente. A gente precisa que os bons profissionais olhem com interesse para o agro, porque precisamos atrair os melhores profissionais, pessoas mais engajadas e felizes com o que fazem. Isso vai gerar uma melhor imagem, sem dúvida. Quando a gente vê a imagem que a sociedade tem do agro e compara isso com a importância que temos, dá muita tristeza.
Como está sendo o ano de 2023 e o que vocês esperam de 2024?
Não está sendo um ano fácil para o setor porque seguimos sentindo as consequências de conflitos globais, mas de maneira geral, a Cibra tem tido um desempenho acima da média do setor. Este ano, estamos crescendo quase 40% em volume, comparado com o ano passado. O nosso setor está crescendo em média entre 9% e 10%. Temos planos de investimento muito agressivos, respaldado pelos nossos acionistas. Ainda queremos crescer mais. Este ano, inauguramos uma fábrica muito grande em Sinop, no Mato Grosso, com um investimento de R$ 250 milhões. E estamos construindo a nossa mais nova unidade em São Luís do Maranhão, com o mesmo volume de investimentos. Isso vai nos permitir continuar crescendo. Temos uma aprovação do nosso conselho de investir R$ 1,5 bilhão, do qual executamos menos da metade. Temos ideias, produtos inovadores…
Algo específico para a Bahia?
Tudo o que fazemos tem relação com a Bahia. Temos três fábricas aqui, em Camaçari, Candeias e Luís Eduardo Magalhães. Não devemos ter novas fábricas aqui, apesar de adorar a ideia, mas a partir de 2026, seremos o único distribuidor de um produto bem inovador que se chama Poli4, que é um produto novo, de uma mina que está sendo construída na Inglaterra. Seremos a única empresa a trazer isso para a Bahia, o restante do Brasil e toda a América do Sul. Temos outras ideias que ainda não podemos mencionar.