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Finalista do Jabuti, autor baiano Ian Fraser lança novo romance

Cartografia para caminhos incertos alinha realismo fantástico e reflexões profundas

  • Foto do(a) author(a) Luiza Gonçalves
  • Luiza Gonçalves

Publicado em 18 de abril de 2025 às 10:29

Finalista do Jabuti, autor baiano Ian Fraser lança novo romance
Finalista do Jabuti, autor baiano Ian Fraser lança novo romance Crédito: Divulgação

Nas trilhas da ficção de Cartografia para Caminhos incertos, a busca do eu e das descobertas é uma constante em movimento, imersa na fantasia, entendendo que, ao se perder, os caminhos do coração nos redirecionam a lugares conhecidos. “Eu gosto de pensar que esse livro é sobre se perder e se achar. E você só pode começar a se achar uma vez que entende que há parte de você que está sempre perdida. Sua identidade nunca vai ser um ponto fixo, você sempre tá caminhando, construindo, achando e criando novos eu. Daí que nasceu o Cartografia para Caminhos Incertos”, define o escritor Ian Fraser.

Lançamento pela editora Intrínseca, a publicação do autor baiano traz ao realismo mágico Redenção, uma cidade itinerante e em eterna romaria, que vira objeto de busca de Mané, morador local que um dia se perde de casa. O jovem poeta inicia uma jornada pela Bahia, conhecendo lugares e personagens fantásticos, na busca do que também é encontrar a si mesmo. Mané leva consigo as mazelas e as belezas naturais de seu nome, descreve Fraser: “Quando a gente pensa no Mané, vem a ideia do ser ingênuo que pode ser ludibriado e ainda não entende direito o seu lugar no mundo. Mané carrega essa sina de ser uma pessoa em eterna busca de si mesmo”.

Um protagonista inquieto, investigador das letras e paisagens, que é em partes alegórico, em outras autobiográfico. “Tem muito de mim, né? Meu nome é Ian Fraser, sou baiano da gema, nascido e criado, e quem escuta meu nome, acho que eu não sou baiano. Sempre me senti meio perdido na minha própria cidade, por mais que eu ame e nunca tenha vivido fora”, pontua. Fraser reflete que a figura de Mané é representativa de uma tentativa presente na sua escrita de ter brasilidade, dentro do vasto universo que é a ideia de ser brasileiro, atrelando-se a pautas raciais e de sexualidade. “É um dos meus personagens que eu acho mais bonito e gosto de dar a ele as lutas e as causas que eu acho que são mais bonitas neste mundo”, defende.

Voltaire e miyazaki

Filho de professora e neto de uma bibliotecária, a literatura sempre esteve muito presente no cotidiano do escritor. Porém, sua primeira paixão pelas narrativas foi no audiovisual, a escrita veio em segundo plano. “A literatura sempre me pareceu uma realidade muito estrangeira. Um terreno que pertencia às outras pessoas e não a mim. Machado de Assis, Clarice Lispector, João Ubaldo Ribeiro, aos nomes grandes e consagrados”, explica. Inspirado pelo amigo Davi Boaventura, também escritor, Fraser percebeu que a literatura poderia estar mais próxima. “Eu precisei ver de perto um amigo lançando, para começar parar de pensar em roteiros de cinema e ir para a prosa, escrever romances”, relembra.

Autor de oito títulos que mesclam ficção, elementos fantasiosos e regionalismo, seu último trabalho, Severino Olho de Dendê (Intrínseca, 2022), foi finalista do prêmio Jabuti 2024 na categoria Romance de entretenimento, mesclando referências de Guerras nas Estrelas a O Auto da Compadecida. “Não diria que mudou minha escrita, mas foi uma experiência de muita satisfação, sabe? Eu sempre fui um cara que não escrevia porque me achava burro, achava que literatura estava para além da minha capacidade. E chegar no Jabuti, foi mais uma das confirmações de que esse lugar tem que ser inclusivo e para todo mundo”, pondera Fraser.

Apesar de Cartografia para Caminhos Incertos ser o livro mais recente, sua escrita começou antes mesmo de Severino e sua origem remonta à adolescência do autor, provocado ao ler Cândido, de Voltaire, mesmo sem compreendê-lo completamente à época. “Mas ficou comigo. E tem uma frase do Miyazaki, diretor dos Estúdios Ghibli, que eu acho muito perspicaz: ‘a criança precisa entrar em contato com algo que ela não entenda completamente, que tenha um sentido amanhã’”, relembra. Essa semente só floresceu décadas depois, quando, tocado por A Cabeça do Santo, de Socorro Acioli, Fraser decidiu revisitar Cândido com outros olhos — e ali começou a tomar forma o projeto de um homem em constante deslocamento, atravessando cidades que moldam sua subjetividade.

Na contramão de uma narrativa linear, com começo, meio e fim bem definidos, Ian optou por uma construção que privilegia a experiência sensorial. A estrutura do romance permite que os capítulos sejam lidos em qualquer ordem, destacando mais o impacto das vivências do que uma progressão narrativa convencional.

Há ainda experimentações como um capítulo inteiro escrito em aliteração: “É pela brincadeira, pela exploração de se aventurar nesse desafio e de ver o que esse desafio diz sobre mim mesmo e sobre a cidade que eu estava criando ali.”. A escolha pelo realismo mágico também parte dessa liberdade e vem como resposta política e poética a tempos sombrios. “A realidade já é tão dura e tão concreta... Por que não podemos ser uma resistência lúdica?”, questiona.