Antes x Depois: entenda o que muda na vida do professor indígena se PL for aprovada

Projeto de Lei entregue na Alba quer reestruturar carreira do professor indígena e promover equidade salarial

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  • Larissa Almeida

Publicado em 19 de abril de 2024 às 05:15

Reestruturação da carreira de professor indígena Crédito: Thuane Maria/GOVBA

A carreira dos professores indígenas da Bahia é a pauta central do Projeto de Lei (PL) que visa equiparar os salários dos professores indígenas aos salários dos demais integrantes do magistério e possibilitar o avanço na trajetória profissional dos educadores dessa etnia. Entregue na Assembleia Legislativa da Bahia (Alba) no início da tarde desta quinta-feira (18), a proposta, se for aprovada, vai promover mudanças na vida dos docentes. A  de que a votação seja realizada em caráter de urgência, na próxima terça-feira (23).

A primeira dessas mudanças trata do valor recebido mensalmente por esses profissionais. Conforme mostrado na reportagem do CORREIO no início deste mês, os docentes não indígenas recebem um salário-base de R$ 4.420,55 para uma carga horária de 40 horas semanais, enquanto os indígenas recebem apenas R$ 1.253,12 de subsídio. Ou seja, há diferença de R$3.167,43 entre os dois grupos de educadores.

“Desde a Constituição de 1988, os povos indígenas têm o direito e a autonomia de ensinar e aprender da forma que bem entendem. O que acontece é que a carreira do professor indígena hoje é a mais desvalorizada entre todos os servidores públicos do estado da Bahia. Muitos dos professores chegam a receber menos do que um salário-mínimo e não recebem em salário, recebem em forma de subsídio em razão da instituição de uma carreira que foi feita muito a toque de caixa”, aponta Felipe Fernandes, professor de Antropologia da Universidade Federal da Bahia (Ufba).

Se o projeto for aprovado, os professores indígenas devem ganhar pelo menos R$3 mil a mais. Isso depende da revisão do enquadramento dos professores indígenas efetivos, que está prevista para acontecer, por meio da Secretaria da Educação da Bahia, no prazo de 30 dias a partir da data de publicação da lei.

A segunda mudança diz respeito ao recebimento de estímulos e gratificações. Rodolfo Moreira, professor pertencente à etnia Kaimbé da região de Euclides da Cunha, relatou que a disparidade em seu rendimento como diretor em uma escola de médio porte é de R$ 2.236,26 em comparação com um diretor não indígena em um colégio de tamanho similar.

"Os gestores, por exemplo, recebem menos que qualquer gestor de outra escola, mesmo tendo o mesmo porte. Não tem as porcentagens que todos os outros recebem a mais. Então, nós recebemos ali um salário abaixo do salário-mínimo e líquido, sem nenhuma gratificação, sem nenhum benefício, mesmo estando numa carreira de efetivo”, disse o professor ao CORREIO no dia 3 de abril deste ano.

A situação de Rodrigo é uma regra, não a exceção. Isso ocorre uma vez que, por ser enquadrado como subsídio, o valor recebido pelos professores indígenas não agrega o vencimento, abonos e as atividades complementares. A proposta legislativa prevê mudança desse cenário ao determinar que os integrantes da categoria recebam os mesmos estímulos e gratificações concedidos aos demais docentes do Ensino Fundamental e Médio da Rede Estadual de Educação da Bahia.

Outra alteração proposta pelo PL possibilita que o ingresso do professor indígena na carreira seja possível com titulação em Licenciatura Plena (Classe 1) ou Licenciatura Intercultural Indígena (Classe 2). Atualmente, somente os professores com Licenciatura Intercultural Indígena fazem avanços na carreira, o que o projeto também pretende mudar.

“Quando a Lei [que instituiu a carreira do magistério indígena na Bahia] foi feita, a maioria dos professores indígenas tinham Ensino Médio. Hoje, a maioria já tem o Ensino Superior e muitos outros são pós-graduados em educação específica dentro da Licenciatura Intercultural Indígena, com mestrados e doutorados. Crescemos bastante e nos qualificamos bem, então não cabemos mais na carreira da maneira que estava na lei”, pontua Patrícia Pankareré, liderança e gestora escolar indígena.

“Todo servidor público tem direito a ascender na carreira. É como se fossem degraus. À medida que a pessoa vai se consolidando na carreira de servidor público, seja docente ou não docente, ela tem direito de subir degraus. O que acontece na legislação atual é que a subida de um degrau para outro é uma barreira impossível de ser transposta. Com a lei, o que a gente espera é a progressão dos docentes, a aceitação dos títulos de pós-graduação, da formação continuada, da valorização da carreira e do investimento individual e coletivo dos professores na sua formação seja valorizada”, afirma Felipe Fernandes, professor de Antropologia da Universidade Federal da Bahia (Ufba).

Também é um desejo dos integrantes do magistério indígena que sejam feitas contratações que reconheçam seu nível de qualificação educacional. Ou seja, que professores indígenas doutores que venham a ser contratados por instituições de ensino sejam reconhecidos pelo Doutorado e ganhem o valor condizente com a titulação.

No PL, para emplacar essa mudança, está prevista a contratação imediata de 248 professores da educação indígena. Igualmente mostrado pelo CORREIO, a carreira para os docentes desta etnia foi criada em 2011, a partir da Lei 12.046, e foi necessária uma nova luta para que um concurso fosse realizado em 2014. Durante os quase 18 anos de governos petistas, este foi o único processo seletivo destinado aos educadores indígenas.

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro