ORDEM NO TABULEIRO

Baianas de acarajé fazem ato por regulamentação do ofício na Alba

Movimento aconteceu nesta segunda-feira (15)

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  • Millena Marques

Publicado em 15 de abril de 2024 às 20:21

Salete Batista, baiana de Salvador
Salete Batista, baiana de Salvador Crédito: Marina Silva/CORREIO

O ofício das baianas de acarajé é Patrimônio Imaterial Cultural do Brasil desde 2005 e Patrimônio Imaterial da Bahia há 12 anos, no entanto, ainda não possui uma regulamentação própria no estado. Por isso, dezenas de baianas promoveram um ato de defesa pela atividade nesta segunda-feira (15), na Assembleia Legislativa (Alba), reivindicando o reconhecimento do ofício em todos os municípios baianos e tratando de assuntos como a uniformização e produção insuficiente de dendê no estado.

“A gente quer que o estado faça um decreto com direitos e obrigações da atividade. A gente precisa valorizar esse ofício, a gente precisa do plano de salvaguarda a nível de estado”, afirma a presidente do conselho executivo da Associação Nacional das Baianas de Acarajé (Abam), Rita Santos.

O plano de salvaguarda citado por Rita é uma exigência da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) para conceder o título de Patrimônio da Humanidade ao ofício. “A Unesco só aceita se tiver um plano de salvaguarda e a gente precisa que o estado faça, porque precisa de dinheiro, e a associação não tem”, complementa Rita.

A regulamentação exigida pelo grupo é similar ao Decreto de Regularização das Baianas no Rio de Janeiro, que ocorreu em fevereiro do ano passado. Nesse caso, o estado instituiu o Programa de Desenvolvimento Cultural Baianas do Rio de Janeiro, com o objetivo de promover o trabalho exercido pelas baianas de acarajé, com regras para autorização e exercício do ofício.

“É uma regulamentação igual, ou melhor, do que a do Rio de Janeiro. O ofício é Patrimônio Brasileiro, que cada estado onde houver baiana de acarajé tem que fazer seu plano salvaguarda, sua legislação. Foi isso que o Rio de Janeiro fez e aqui ainda não”, continua Rita.

No âmbito profissional, as baianas de acarajé são reconhecidas, desde 2017, pela Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), documento que reconhece e classifica as ocupações existentes no mercado brasileiro. No entanto, a regulamentação estadual própria fortalece a uniformização do ofício, como aponta Letícia Gambelegé, coordenadora do núcleo da Abam em Santo Antônio de Jesus, no Recôncavo Baiano.

“A baiana não pode vender bolinho de Jesus, tem que vender acarajé, e não pode estar no tabuleiro de acarajé de calça jeans e guarda-pó. A gente não pode fazer nada que descaracterize o ofício da baiana”, pontua Letícia, que não inibe os deveres das baianas em sua fala.

“Nós não exigimos apenas direitos. Temos os nossos compromissos quanto a utilização do solo e do espaço público, mas dificilmente ocorre um desrespeito nosso com o espaço público. É sempre o contrário”, finaliza.

Outro ponto levantado pelas profissionais de tabuleiro é a produção insuficiente de dendê no estado. Segundo Rita, a Bahia só produz 2% do ingrediente que atende toda a população baiana. “Vem de Belém 98% do dendê que a gente utiliza e não é um dendê próprio para nós. Ele é um dendê de commodities, que é para fazer biscoito, pasta de dente e sabonete. O nosso é para comida”, explica a presidente da Abam.

Há um debate sobre a solicitação de registro do dendê como patrimônio ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), segundo Alcides Caldas, professor da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e líder do Grupo de Pesquisa Território, Propriedade Intelectual e Patrimônio (Terpi). Mesmo que seja aprovado, “não resolve as questões estruturais de plantio, de assistência técnica, que são tão necessárias para a cultura e permanência do nosso dendê.”

O movimento na Alba substituiu a posse da Frente Parlamentar Baiana do Acarajé, grupo formado por 22 deputados estaduais para debater as reivindicações das baianas. O evento não aconteceu porque o documento, assinado pelo presidente da casa, Adolfo Menezes, ainda não foi publicado.

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro