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Donaldson Gomes
Publicado em 7 de maio de 2025 às 05:00
Os países da América Latina e Caribe (ALC) possuem 18.173 administrações locais – estruturas equivalentes aos municípios no Brasil – e 262 governos regionais, similares à concepção de estados. Mesmo tendo que lidar com responsabilidades como o planejamento urbano, coleta de resíduos, investimentos em infraestrutura, transporte público, ensino, saneamento, segurança e saúde, as estruturas de gestão possuem elevada dependência em relação aos repasses de recursos públicos. >
As principais fontes de receitas das administrações subnacionais na região da ALC são provenientes de repasses. Segundo o novo Relatório de Economia e Desenvolvimento (RED), lançado nesta terça-feira pelo Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe (CAF), em Brasília, 58% das receitas das municipalidades dependem dos recursos enviados por outros entes de governo. Como comparação, no caso da OCDE, a média de dependência é de 43%. >
Conhecido informalmente como o banco dos municípios, o CAF espera que o estudo ajude as administrações locais a encontrarem caminhos para os desafios no caminho do desenvolvimento. >
Os números indicam a necessidade de fortalecimento da institucionalidade fiscal das administrações de cidades, acredita o presidente do CAF, Sergio Díaz-Granados. "Grande parte das soluções que vão transformar a vida das pessoas dependem dos governos locais", destacou o executivo numa conversa com jornalistas representantes dos 15 países que integram o banco de desenvolvimento. Fortalecer as gestões locais foi um compromisso assumido pelo CAF em 2020, no auge da pandemia de covid. >
Segundo Díaz-Granados, o RED 2025 chega como uma tentativa de esquematização do trabalho que já vinha sendo desenvolvimento pela instituição financeira. "Estamos há mais de 10 anos focados no crescimento sustentável das cidades. Somos o banco dos municípios, desde os grandes, como São Paulo, mas também dos pequenos", explica. >
Na Bahia, o banco é responsável por dar suporte a obras de requalificação na região do centro antigo de Salvador, com a implantação do Museu da Música no processo de restauração do Casarão dos Azulejos Azuis. A obra, que recebeu investimentos de US$ 2,2 milhões, foi financiada através do Programa de Requalificação Urbana de Salvador (Proquali), que teve início em 2019 e totaliza US$ 60,2 milhões em recursos aplicados em diversas frentes na municipalidade.>
A requalificação da orla de Amaralina e melhorias no transporte urbano da capital também contaram com o apoio da entidade. Em Camaçari, o banco participou de melhorias na infraestrutura para o turismo. Além disso, o CAF também ajudou o governo do estado a oferecer garantias para o projeto da Ponte Salvador-Itaparica, com um contrato de US$ 150 milhões. >
O banco tem um portifólio de crédito de R$ 3 bilhões no Brasil. >
Para o presidente do CAF o fomento à integração de diversas esferas de governo no processo de planejamento urbano é fundamental para o crescimento saudável das cidades. Ele defende ainda a necessidade de investir em ferramentas como a digitalização para compensar a escassez de recursos públicos – uma realidade muito forte seja para países, estados ou municípios. >
Durante o lançamento do relatório, nesta terça-feira (dia 06), na sede do Banco do Brasil, em Brasília, José Ricardo Sasseron, vice-presidente do Banco do Brasil, destacou a importância de pensar o desenvolvimento de estados e municípios. “Quem realmente resolve as dores dos cidadãos são os estados e municípios. Este relatório vai auxiliar bastante nas nossas políticas”, projetou.>
Sergio Diaz-Granados, presidente do CAF, explicou que o estudo reúne mais de 20 anos de conhecimento sobre a realidade da América Latina e o Caribe. “É um estudo mais sensível porque apresenta soluções para níveis de governos próximos da população”, acredita. “Quando entramos em detalhes, estamos falando de mais de 18 mil administrações, em todos os níveis, sejam de governos, municipais, regionais, distritais ou departamentos. Dois terços da população da região vive sob governos municipais”, lembrou. “As soluções que virão nas áreas de saúde, fornecimento de água, ou educação, passarão por governos subnacionais”, aponta, lembrando que até 2050 88% da população da ALC viverá em áreas urbanas. “A América Latina terá o grande desafio de prover soluções compartilhadas”, diz. >
Outro desafio será o de lidar com as transformações demográficas. Segundo ele, após um boom até a década de 70 do século XX, houve um processo de desaceleração nas taxas de natalidade e se projeta que em 2055 toda a América Latina e Caribe terá que conviver com uma população idosa maior que a jovem. “Teremos menos crianças, mais jovens e desempregados do que nunca e um número gigantesco de pessoas procurando aposentadoria. Este é um quadro que alimenta tensões políticas e sociais”, aponta. >
Verônica Frisancho, gerente de conhecimento do CAF, conta que nos últimos 20 anos foram registrados avanços sociais e econômicos na região, como a redução da pobreza. Apesar disso, há desafios que persistem, como o da desigualdade e o das mudanças climáticas. “Há regiões em que onde houve progressos nacionais, mas há situações alarmantes entre governos locais”, pondera. >
Comércio internacional>
Sergio Díaz-Granados acredita que a guerra tarifária iniciada pelos Estados Unidos vai exigir muita criatividade e capacidade de negociação dos países da América Latina e Caribe. "As regras globais do comércio eram uma espécie de contrato que organizava as transações entre os países. O que está acontecendo é que este modelo está sendo substituído pelas negociações individuais, que representam uma mudança profunda e por isso causam tanta tensão", avalia. Para ele, o nível de sucesso de cada nação latino-americana vai depeder do tipo de relacionamento externo e do nível de dependência de cada país. >
"Mais de 70 milhões de latinos estão atualmente nos Estados Unidos e essas pessoas transferem para seus países US$ 110 bilhões por ano. Quando olhamos a realidade desde o México até a Colombia, vemos que os Estados Unidos são o principal parceiro comercial", pondera. >
O presidente do CAF lembrou que mesmo antes do acirramento da crise tarifária já havia um movimento global de fechamento das economias. "Depois de 30 anos em processo de quedas de tarifas, o que se viu nos últimos cinco anos foi uma inversão neste cenário. Há uma mudança estrutural acontecendo", diz.>
*O jornalista acompanhou o lançamento do RED 2025 em Brasília a convite da CAF.>