Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Maysa Polcri
Publicado em 12 de julho de 2024 às 06:30
Pouca gente sabe, mas Mãe Hilda Jitolu (1923-2009) foi a primeira ialorixá a subir a Serra da Barriga, local que abrigou o Quilombo dos Palmares, em Alagoas. Na década de 1980, durante o movimento que buscava reconhecer o Dia Nacional da Consciência Negra, a líder religiosa fez rituais à memória de Zumbi dos Palmares, que liderou o maior quilombo do Brasil. Os detalhes sobre a história de Mãe Hilda, como sua contribuição para a fundação do bloco Ilê Aiyê, são contados em detalhes em um livro que será lançado na próxima segunda-feira (15). >
A obra, intitulada ‘Mãe da Liberdade: A trajetória da Ialorixá Hilda Jitolu, matriarca do Ilê Aiyê’, é fruto da pesquisa de mestrado conduzida pela jornalista Valéria Lima, neta de Mãe Hilda. O desejo de compartilhar com o mundo os ensinamentos da líder religiosa surgiu quando Valéria estava na universidade.>
“Estando muito perto, às vezes, é difícil enxergar a grandiosidade de quem está ao seu lado. Foi durante a minha graduação que tive oportunidade de compreender isso. Meu Trabalho de Conclusão de Curso foi um livro-reportagem sobre a história dela”, conta Valéria Lima. Mesmo assim, no processo de pesquisa do mestrado em Estudos Étnicos e Africanos, a neta de Mãe Hilda descobriu novos episódios da vida da matriarca da família. >
A iniciação de Mãe Hilda no candomblé foi uma das surpresas. “São vários detalhes da vida da minha avó que nós não sabíamos. Apesar de o terreiro fundado por ela, o Axé Jitolu, ser da nação Jeje, ela foi iniciada na nação Angola. Ninguém da minha geração sabia o nome do pai de santo dela, por exemplo”, diz a autora do livro. >
Assim como os ensinamentos de Mãe Hilda, que dedicou a vida ao combate ao preconceito religioso, os detalhes sobre sua vida têm a marca da oralidade. São poucos os documentos com informações sobre a passagem da ialorixá na terra, o que dificultou o trabalho de pesquisa, feito entre 2012 e 2014. >
“Para construir essa história, eu encontrei com todos os quatro filhos dela, um de cada vez, para que eles contassem tudo o que sabiam sobre ela, desde a infância até os últimos momentos. A partir desse processo, resgatei detalhes, construí o roteiro da dissertação e comecei a fazer cruzamentos de informações ”, revela. Cada entrevista durou, em média, duas horas, e foi feita dentro do barracão do terreiro, na Liberdade. >
Durante o processo da pesquisa, posteriormente transformada em livro, Valéria Lima teve ainda mais certeza sobre o principal legado de Mãe Hilda. “A missão de vida dela sempre foi combater o racismo. Com sua importante contribuição para a fundação do Ilê Aiyê, ela compreendeu que a música e a cultura são caminhos de luta”, diz. No decorrer de 216 páginas, a jornalista relata como se deu o apoio da ialorixá para a construção do primeiro bloco afro da Bahia. >
“Ela não idealizou o Ilê, mas foi a maior incentivadora que impulsionou o bloco. Vovô do Ilê, filho de Mãe Hilda, era muito novo quando decidiu criar o bloco. Sem o apoio dela, ele nunca teria ido para frente”, ressalta. A líder religiosa sempre defendeu a importância dos estudos e, no final da década de 1980, fundou uma escola com seu nome dentro do terreiro, o que garantiu educação básica para crianças do Curuzu, em Salvador. >
Os feitos de Mãe Hilda ao longo de seus 86 anos fizeram com que ela recebesse diversas homenagens, como o Prêmio Nacional de Direitos Humanos, além da indicação ao Prêmio Nobel, em 2005. Depois de 15 anos da data do seu falecimento, Valéria Lima espera que a história da ialorixá inspire as próximas gerações. >
Valéria Lima
Autora do livroO lançamento do livro será realizado no dia 15 de julho, em uma cerimônia especial para convidados, transmitida pelo canal oficial da TV Correio Nagô no Youtube. Após ser lançado, o livro estará disponível para download nos sites da Fundação Rosa Luxemburgo e do Instituto da Mulher Negra Mãe Hilda Jitolu, responsáveis pela transformação da pesquisa em livro. >