Homens estão cometendo mais estupros no Carnaval? Veja o que dizem especialistas

Ao menos dois estupro coletivos foram registrados em Salvador durante a festa

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  • Maysa Polcri

Publicado em 15 de fevereiro de 2024 às 07:00

Multidão segue o trio no Campo Grande
Casos estão sendo investigados Crédito: Arquivo CORREIO

Era para ser um momento de festa, mas a violência de gênero falou mais alto no Carnaval de Salvador. Ao menos três casos de estupro coletivo aconteceram durante os dias oficiais da folia. Ambos nas proximidades dos locais em que os trios elétricos desfilam no Circuito Barra-Ondina e para onde todos os olhares da cidade estavam voltados. Mesmo diante de diversas campanhas contra assédio e o policiamento intensificado no período, as mulheres continuam sendo vítimas de violações sexuais.

Além dos três casos de estupro, os Centros de Referência de Atendimento às Mulheres da Prefeitura de Salvador registraram 244 ocorrências de violência, sendo quase todas (96%) relativas a importunação sexual. Para especialistas, ao mesmo tempo que as mulheres fazem mais denúncias do que no passado, os homens estão mais violentos.

Na sexta-feira (9), uma moradora do Imbuí foi violentada por sete homens nas imediações do antigo Salvador Praia Hotel, no início da madrugada. Dois dias depois, três homens estupraram uma mulher na Rua Baependi, em Ondina. Na madrugada da última quarta-feira (14), uma mulher vulnerável foi estuprada enquanto retornava do Carnaval. Os três casos são investigados pela Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam).

Márcia Tavares, professora e pesquisadora do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (Neim/Ufba), analisa que os casos de estupros coletivos no Carnaval operam como uma espécie de “punição” para as mulheres que “fogem” da régua do machismo. Ou seja, ao mesmo tempo em que elas se sentem mais à vontade para curtir a folia, os homens se tornam mais violentos.

“Qualquer mulher se torna ainda mais vulnerável nesse período porque o agressor vai culpabilizar a vítima, ao dizer que ela bebeu ou estava com uma roupa curta, por exemplo”, diz Márcia Tavares. “Culturalmente a mulher ainda é vista como propriedade do homem desde o processo de educação na infância. Quando a mulher descumpre algum desses moldes, ela se torna uma ameaça e é punida da forma mais cruel possível”, analisa a professora.

A última edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, revelou que em 2022 o país bateu recorde no número de registros de estupro desde o início da série histórica, em 2011. Foram 74.930 vítimas, o que representou um aumento de 8,2% em relação ao ano anterior. A reportagem não encontrou informações sobre anteriores de estupros coletivos no Carnaval de Salvador. Em 2019, no entanto, a Secretaria de Políticas para Mulheres (SPM) registrou seis casos de estupro, sendo três vítimas adultas, duas crianças e uma adolescente.

A advogada Milena Pinheiro, especialista em violência doméstica e crimes sexuais, ainda ressalta que as vítimas de violência ainda enfrentam preconceito quando resolvem denunciar. “É comum que as mulheres não deem segmento jurídico em casos de violência sexual porque as vítimas se questionam antes de se expor. Nós ainda temos um comportamento social no qual a vítima não é vista em sua integralidade como vítima”, afirma.