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“Nós somos independentes”, solteiras contam como é viver na capital mais feminina do Brasil

Salvador tem maior proporção de mulheres entre as capitais do país e é a segunda cidade mais feminina do país

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  • Foto do(a) author(a) Maysa Polcri
  • Millena Marques

  • Maysa Polcri

Publicado em 27 de outubro de 2023 às 14:57

Salvador é a capital com mais mulheres no país
Salvador é a capital com mais mulheres no país Crédito: Divulgação/Sepromi

Em meados da década de 90, a apresentadora Xuxa Meneghel deu uma entrevista que, anos depois, se tornaria um dos memes mais compartilhados nas redes sociais: "No Brasil, não há homem para mim". A famosa frase pode ser personificada na vida de muitas soteropolitanas. No caso das moradoras de Salvador, o problema não é só a qualidade dos partidos, mas também a quantidade: a cidade é a capital brasileira com maior proporção de mulheres, segundo o último levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Tem tanta mulher pela cidade que a capital baiana é o segundo município mais feminino do país, ficando atrás somente de Santos (SP). Por aqui, dos 2,4 milhões de habitantes, 54,4% são mulheres - o que representa 1.315.298 pessoas. Os homens, por outro lado, somam 1.102.380 (45,6%). Para se ter ideia, são 10 mulheres a cada oito homens. Os dados fazem parte do Censo Demográfico 2022, divulgado nesta sexta-feira (27).

A diferença no número de homens e mulheres é notada pela promotora de atendimento Priscila Anjos, 31 anos, há muito tempo. A escassez de homens, principalmente dos que são considerados 'bons partidos', é inegável. Nos bares, boates, restaurantes e praias que a soteropolitana frequenta, o público feminino costuma dominar: das 50 pessoas que encontra em barzinhos, por exemplo, apenas 15 são homens.

Dos poucos homens à disposição do público feminino, ainda há um outro problema para aquelas que pretendem estabelecer um relacionamento sério. Solteira há dois anos, Priscila tem dificuldade para encontrar conexões sinceras. "Falta homem de qualidade para uma relação séria. Já é difícil achar alguém que tenha os mesmos gostos ou algo em comum, desses, poucos têm coragem de levar a diante", disse.

A dominância do público feminino na cidade reflete até mesmo na maneira de flertar, no caso de romances heterossexuais, de acordo com a promotora. Nos lugares propícios para conhecer novas pessoas, são as mulheres as que mais tomam iniciativa.

"As mulheres de Salvador são, em sua grande maioria, independentes e decididas. Poucos são os que têm coragem de enfrentar, acho que isso meio que assusta eles"

Priscila Anjos

Promotora de atendimentos

Sandra Coelho tem 54 anos e também observa a escassez de possíveis paqueras nos lugares onde frequenta. A estudante universitária estima que, do público de bares no Rio Vermelho, apenas 30% são homens. "O pior é que os disponíveis não estão para mulheres soteropolitanas. Na verdade, não estão preparados para nenhuma. Nós estamos mais empoderadas. Nós, soteropolitanas, somos danadas, independentes, trabalhamos, dirigimos os nossos próprios carros", disse, com convicção.

Nos passeios ao Centro Histórico de Salvador, Coelho aponta uma situação ainda mais precária. Segundo a professora, apenas 10% dos frequentadores do local são homens. Viúva há 4 anos, ela também aponta a dificuldade de encontrar alguém como o antigo esposo, vítima de um ataque fulminante em 2019. "Acho que também não consegui me relacionar com outra pessoa porque sei que não vou encontrar alguém como ele."

O machismo enraizado na sociedade atravessa o universo dos flertes e impacta na forma com que as paqueras se desenrolam, principalmente entre as mulheres. A psicoterapeuta Nicole Ornellas, especialista em relacionamentos abusivos e violência contra a mulher, analisa que muitas muitas mulheres ainda repetem padrões patriarcais, mesmo sem perceber.

“É importante rever algumas crenças, padrões, caráter escolhido, lugares de busca, entre outros. As consequências de não encontrar alguém que esteja alinhado às expectativas, pode gerar, além da frustração, um processo de ansiedade generalizada e outros transtornos como a depressão”, diz.

Em 2022, as mulheres representavam 54,4% da população soteropolitana, ou 1.315.298 de um total de 2.417.678 habitantes. Embora o contigente feminino tenha diminuído em relação a 2010, se reduziu menos do que o masculino e do que a população total da capital, o que fez a participação das mulheres crescer.

O número total de moradores de Salvador caiu 9,6% entre 2010 e 2022 (menos 257.978 pessoas), mas o de homens recuou 11,7% (menos 146.517, indo a 1.102.380), enquanto o de mulheres se reduziu em 7,8% (menos 111.461).

Mulheres negras sentem mais

Se as mulheres brancas solteiras já enfrentam uma série de desafios para engatar um relacionamento sério com homens, no caso das mulheres negras, a situação é ainda mais delicada. O racismo latente na sociedade faz com que elas sejam preteridas em diversos âmbitos da vida, inclusive, nos relacionamentos. O tema é tão sério que tem nome definido e pesquisa acadêmica envolvida: a solidão da mulher negra.

Professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e pesquisadora do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (Neim), Izaura Santiago da Cruz analisa que o racismo que sexualiza as mulheres negras reflete na forma com que as pessoas se relacionam amorosamente. 

"As mulheres negras ainda são, infelizmente, mais sexualizadas do que as mulheres brancas. Então, as mulheres negras e pardas são vistas como mais 'acessíveis'. Isso contribui para a questão da solidão", explica. Segundo Izaura, o preconceito é recorrente entre homens brancos e negros, nos relacionamentos heteroafetivos. 

"É uma lógica que atravessa diferentes classes sociais, os homens, em geral, buscam mulheres brancas para construir relacionamentos duradouros. Ainda naquela noção eugenista de 'limpar a barriga', que busca ter filhos de pele mais clara", completa a pesquisadora.