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Maysa Polcri
Publicado em 15 de abril de 2025 às 11:03
A professora Irma Ferreira, que teve a contratação pela Universidade Federal da Bahia (Ufba) cancelada por decisão da Justiça, voltou a se pronunciar sobre o caso. Em um vídeo publicado em seu perfil no Instagram, Irma Ferreira defende que tem direito à vaga da Escola de Música da Ufba, reservada para cotas. Uma decisão judicial determinou que uma candidata branca ocupasse a posição. >
Irma Ferreira, que é uma mulher negra, obteve a segunda maior nota na seleção. Porém, a vaga era reservada preferencialmente para pessoas com direitos às cotas. Por isso, ela foi selecionada e ministrou aulas durante um semestre. >
"Eu sabia dos meus direitos, eu tinha lido o edital e, sim, a vaga era minha por lei. Eu fui contratada, e, no dia 1º de outubro, assinei meu contrato. Junto aos meus alunos, mesmo com todas as dificuldades estruturais, fiz valer o que tinha conquistado", afirma Irma Ferreira. >
A candidata que teve pontuação maior, Juliana Franco Nunes, que é branca, questionou a admissão de Irma Ferreira alegando que tirou nota final maior que a concorrente, segundo resultado divulgado pelo Departamento de Música em 6 de setembro de 2024. A reportagem tentou contatar a candidata nomeada após decisão judicial, mas não obteve retorno. >
"Mais uma vez, o sistema judiciário intervindo na autonomia da universidade. A intervenção só acontece quando essa autonomia desrespeita a aplicação da lei de cotas. Racismo institucional é o nome disso. Estamos vendo mais uma tentativa de desmonte da lei", completou Irma Ferreira. >
Irma é cantora lírica, mestre em Criação Musical, doutoranda em Educação Musical e pós-graduanda em História e Cultura Afro-Brasileira. Em nota, a Ufba se manifestou contra a sentença, afirmando que a Justiça teve um entendimento "equivocado". >
"A Universidade considera este entendimento equivocado e soma-se às reiteradas recomendações do Ministério Público Federal para a matéria. A aplicação da reserva de vagas sobre o conjunto das vagas das áreas do processo seletivo é coerente com a finalidade da política de cotas em concursos públicos", pontua a Ufba, que solicitou que a Procuradoria Federal recorra da decisão.
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A decisão da 10ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária da Bahia em cancelar a contração da Irma Ferreira Santos repercutiu entre entidades acadêmicas e da música. A Associação Brasileira de Educação Musical (Abem) publicou uma nota contra a determinação. Segundo a Abem, a professora atuou como docente na Ufba durante um semestre, teve seu contrato renovado e, logo em seguida, foi afastada de suas funções após decisão judicial.
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"O afastamento da professora Irma de suas funções, já em pleno exercício da docência, representa um constrangimento institucional inaceitável e um ataque simbólico a políticas e ações afirmativas", diz a associação. Uma candidata que participou do processo seletivo buscou a Justiça contra a nomeação de Irma. >
"Situações como essa ferem a dignidade das pessoas envolvidas e produzem efeitos desmobilizantes, fortalecendo os obstáculos ao ingresso e permanência, em espaços acadêmicos e profissionais, de pessoas negras, indígenas e pertencentes a demais grupos historicamente excluídos", completa a Abem.>
O Colegiado e o Corpo Docente do Programa de Pós-Graduação em Música da Ufba (PPGMUS) também se manifestaram. "O PPGMUS se posiciona contra qualquer ataque às políticas de cotas, neste caso a Lei Federal n. 12.990/2014, uma conquista importantíssima da sociedade civil e do movimento negro como medida para corrigir e reparar violências históricas e as desigualdades que ainda caracterizam a sociedade brasileira, consequentemente, vários contextos profissionais, entre os quais, as universidades", disseram em nota. >
Essa não é a primeira vez que uma polêmica envolvendo a contratação de professores através de cotas acontece na universidade. A doutora em Ciências da Saúde Lorena Pinheiro foi impedida por uma liminar da Justiça de ser nomeada professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia (Famed-Ufba). Apesar da aprovação no concurso através da reserva de cotas, a médica otorrinolaringologista, que é negra, teve o seu direito à vaga contestado por uma candidata da ampla concorrência. >
Após a repercussão do caso, a médica foi nomeada na Ufba, em outubro do ano passado. Lorena Pinheiro se manifestou sobre a nova polêmica. "Olhe quão grave é a situação que a gente vive, de insegurança jurídica, em que não há respeito às pessoas e à democracia", falou. >