A Irmã Dulce e o vovô Dutra

Nelson Cadena é publicitário e jornalista, escreve às sextas-feiras

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  • Nelson Cadena

Publicado em 31 de maio de 2019 às 05:00

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“Quando foi inaugurado o Círculo Operário, obra fantástica resultante do trabalho da Irmã Dulce, uma santa mulher que fez tudo arrecadando esmolas dos ricos, o governador Mangabeira fez a apresentação: senhor presidente esta é a nossa santa. A irmã Dulce comovida até as lagrimas contou que tinha dois pais: Um era o governador e o outro o Sr. Simões Filho. Ao que o presidente respondeu: Pois então, agora, quero ser seu avô que é ser pai duas vezes. Mais tarde a Irmã Dulce pediu a seu avô um donativo para a sua grandiosa obra de caridade. O pedido valeu duas vezes”. O diálogo entre o Anjo Bom da Bahia e o Presidente Eurico Gaspar Dutra foi testemunhado por Jacinto de Thormes e relatado na sua coluna do Diário Carioca em 26/11/48.

Jacinto de Thormes, pseudônimo de Maneco Muller, era o mais importante, prestigiado e lido colunista social do Brasil, há quem o considere o pioneiro da crônica do gênero e precursor do estilo Ibrahim Sued que marcou toda uma época no jornalismo brasileiro. De fato, o presidente Dutra que, reza a crônica, teria sido abordado pela Irmã Dulce se interpondo__ acompanhada de várias crianças__ à frente do carro oficial, a caminho do Bonfim, liberaria mais tarde oito milhões de cruzeiros, recursos destinados a saldar dívidas e concluir as obras do Círculo Operário. Dutra perguntou à freira: “O que mais a senhora deseja?” Um restaurante Presidente, respondeu de pronto.

No ano seguinte à visita do Marcehal à Bahia, a Irmã Dulce viajou ao Rio de Janeiro para uma audiência no Palácio do Catete, em 24/05/49, com o Presidente da República em exercício, Nereu Ramos, seguramente para tratar dos recursos liberados pelo seu antecessor. Pela  mesma época foi homenageada pela Rádio Nacional do Rio de Janeiro que era ouvida em todo o território nacional, a de maior audiência no país, pelo radialista Paulo Roberto, produtor do célebre programa “Honra ao Mérito” que destacava personalidades, dramatizando a sua biografia. 

Aproveitou a sua visita à capital para visitar o bem montado restaurante do Serviço de Alimentação e Previdência Social-SAPS, serviço que contava com o apoio da American International Association, presidida por Nelson Rockefeller. Se impressionou com o que viu e correu atrás, obteve do então Major do Exército, o escritor Umberto Peregrino, a confirmação de que em breve Salvador teria uma unidade. Estava previsto nos planos de expansão, confirmou. Promessa feita, deu-se início aos preparativos com as formalidades legais de praxe. Alguém sugeriu instalar o restaurante popular no Belvedere da Sé, um mirante, longe do Largo de Roma, uma ideia que felizmente não vingou.

Em 16 de abril de 1950, o Círculo Operário ganhou o restaurante solicitado pela Irmã Dulce, no lugar certo, ao lado da entidade. No seu discurso de inauguração Peregrino empolgado expressou seu sentimento: “Bem sei que todos conhecem a Irmã Dulce...É preciso ver o seu trabalho e de suas auxiliares...É preciso ter testemunhado o afetuoso e confiante entendimento entre a Irmã Dulce e seus assistidos...Neste restaurante o SAPS fornecerá aos trabalhadores e exclusivamente a eles, refeições cientificamente planejadas...Os que passarem pelas nossas mesas certamente frequentarão menos a farmácia, serão mais produtivos no seu trabalho de cada dia; terão, enfim, mais saúde, mais progresso, mais alegria”.