'A policial disse que me mataria ali mesmo', diz líder do MLB preso em ocupação

Membros do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) foram expulsos pela PM de galpão ocupado na Ribeira

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  • Eduardo Dias

Publicado em 29 de dezembro de 2019 às 14:19

- Atualizado há um ano

. Crédito: Divulgação/MLB

Um dos líderes do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), Victor Aircau, foi preso durante o processo de desocupação do galpão da Navegação Bahiana Oficinas, na Ribeira, na manhã do sábado (28), pela Polícia Militar. Ele foi autuado pelos crimes de invasão de prédio e danos ao patrimônio e levado para a 7ª Delegacia (Rio Vermelho), onde foi ouvido e liberado após pagamento de fiança.

A ocupação do galpão ocorreu oito dias após a operação de desocupação do antigo Hospital Couto Maia, na Ribeira. O grupo de pessoas do MLB era o mesmo e entrouno galpão na noite da sexta-feira (27). Eles só o local após a ação dos policiais.“Eles não me deram espaço de tempo para falar com as pessoas e decidir em conjunto sobre a saída do galpão. Foi uma desocupação violenta, como a outra também foi. Eu fui preso enquanto conversava com alguns repórteres. Uma das policiais chegou a apontar a arma para a minha cabeça dentro da viatura e disse que se eu tentasse algo me mataria ali mesmo”, relatou Victor.Victor revelou ainda que foi levado pelos policiais após uma entrevista com repórteres que estavam no local no momento da desocupação. Ele afirmou que passou cerca de 1h dentro da viatura sofrendo agressões psicológicas.

“Foi entre 40 minutos e 1h dentro da viatura. Foi uma violência psicológica muito grande durante todo o tempo. Eles me levaram para a Ribeira e aguardaram a chegada de uma viatura da Rondesp para me levar para o Rio Vermelho. Eles queriam me levar direto para o presídio da Mata Escura”, contou Victor.

Ao CORREIO, Gabriela Soares, outro membro do grupo relatou a ação dos policiais durante a operação. Segundo ela, o Governo do Estado instruiu os militares a agirem de forma truculenta contra os ocupantes.

“Não houve negociação alguma. Teve foi agressão, tanto verbal quanto física, machucaram um rapaz. Estávamos na rua desde a saída do Couto Maia. Novamente os policiais vieram sem nenhum mandado de reintegração de posse, nem um aval de um juiz a tempo. Vieram com a Rondesp e o Choque fazendo o que bem quisessem com a gente. Estamos com um grito de socorro, não existe nenhuma proposta por parte do governo. Eles não dão nem um destino para essas pessoas, que por desespero, resolvem ocupar esses imóveis abandonados”, contou a ocupante, que questionou a posição do governo sobre ser um governo de esquerda.  

“O governo do estado, que se diz de esquerda, está agindo de forma como se fossemos criminosos, colocando ocupação por moradia como crime. Hoje, estamos cada um em casas de parentes, o movimento se dispersou, mas não acabou. O MLB já está vendo outras maneiras de realizar a nossa luta. São muitos imóveis abandonados na cidade, e isso que está acontecendo é uma tentativa clara de criminalizar os movimentos sociais”, completou.

O que diz o governo Em nota, o Governo do Estado informou que, por volta das 12h, do sábado (28), policiais militares da 17ª da Companhia Independente de Policiamento Tático (CIPT), Rondesp BTS e do Batalhão de Polícia de Choque prestaram apoio na desocupação do imóvel do Governo do Estado do Estado, Navegação Baiana Oficinas, no bairro da Ribeira.

Ainda segundo a nota, a polícia permaneceu no local até a conclusão da desocupação. O policiamento segue reforçado na região. Durante a ação, Victor Aircau Moraes Pires de Souza foi autuado pelos crimes de esbulho possessório (invasão de prédio) e danos, que serão investigados pela 3ª Delegacia (Bonfim).

A nota ainda explica que Victor, acompanhado pelo advogado, permaneceu em silêncio durante todo o interrogatório, passou por exames de corpo de delito e pagou fiança arbitrada pela autoridade policial, sendo liberado em seguida.

A Secretaria de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia (Sedur) informa que:

a) Todas as medidas negociadas com os líderes do movimento estão sendo prontamente cumpridas pela Sedur;

b) Dentre as famílias, 25 são beneficiadas com o Aluguel Social, custeado pelo Governo do Estado. Elas aguardam, dentro do prazo de entrega ainda vigente, as suas unidades habitacionais. Portanto, não houve atraso e ainda recebem, em dia, o Aluguel Social;

c) Conforme combinado, assistentes sociais da Sedur realizaram o levantamento situacional das outras famílias do movimento, a fim de possibilitar a inclusão delas no Cadastro Estadual da Casa da Gente. Este é o procedimento legal para que as pessoas sem moradia possam ser contempladas pelos projetos sociais de habitação conforme os princípios da isonomia e da publicidade;

d) Desta forma, a Sedur cumpriu todas as demandas cabíveis, conforme protocolo que veda privilegiar estes ocupantes em detrimento de milhares de outros que esperam, no Cadastro, por uma unidade habitacional.

Ainda de acordo com o líder do movimento, os ocupantes estão lutando por uma causa justa, garantido pela Constituição Federal. Para ele, muitas das famílias que compõe o movimento não têm para onde ir, nem condições de manter um aluguel.

“Estamos lutando por uma causa justa. Quando ocupamos, não estamos depredando nada. Psicologicamente, eu estou muito surpreso com tudo o que aconteceu nessas desocupações, Estou tentando me manter o mais íntegro possível para não transparecer para os meus companheiros que eu estava mal. Vamos continuar ocupando, não vamos parar, não”, afirmou Víctor, que garantiu ainda que, após a saída do galpão, as famílias estão sendo acolhidas em casas de parentes e conhecidos.

Com supervisão da chefe de reportagem Perla Ribeiro*