A praça era do povo, as sentimentais memórias de um folião trieletrizado

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  • Da Redação

Publicado em 3 de março de 2019 às 05:00

- Atualizado há 10 meses

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Eu e o cineasta e diretor teatral Álvaro Guimarães proseávamos durante a cobertura jornalística do carnaval de Salvador. Era 1986. Fascinado pela orgia pansexual que materializava na praça Castro Alves a maior farra da Terra, comenta: - Que coisa linda gente se amando dessa forma tão libertária! Quem dera o futuro se eternizasse neste momento. Disse: - Quem dera! [Esse momento glorioso não se materializou, e ele teve morte deplorável que não fez jus ao importante nome da cultura brasileira que foi, e é] [Ai, ai, tanta saudade, Alvinho!].

Eu e a jornalista Linalva Maria também participamos dessa cobertura jornalística. Em pleno ato de trabalhar, Dionísio nos arrebatou e seguimos atrás de trio elétrico. No meio desse burburinho, ela falou; - Que bom se o mundo fosse esta festa linda o tempo todo, né Rogê! Disse: - Que bom! [Mas a vida, caprichosa, não é eterna festa. Tempos depois, na flor da idade, essa morena brejeira foi devastada por doença demolidora, e deixou a todos nós, que a amávamos tanto, desolados]. [Ai, ai, tanta saudade, Lina!]

[A TV Educativa da Bahia foi inaugurada com pouca pompa e circunstância, no final de 1984. Desprovida de recursos, investiu em equipe jovem e aguerrida. Eu, na função de chefe de reportagem, sentava-me em tosco banco de madeira à margem de tosca mesa de madeira, na qual, em máquina de escrever rudimentar,   escrevia as missões que repórteres deveriam cumprir nas reportagens de rua].

Entre 1977 e 1986, quando me mudei para São Paulo, trabalhei como repórter em vários carnavais. Em tempos nos quais nem de gravadores dispúnhamos, anotávamos tudo às pressas, e, na fuzarca carnavalesca, às vezes não anotávamos nada. Eu, que desde muito jovem, fui reconhecido como ‘bom em reportagens com tom + literário’, entrava em todas sem perder o tom.

Um dia me deram a missão de fazer perfil do lendário Rei Momo Ferreirinha. Fiz esse perfil na histeria de entrevista coletiva em pleno sol da manhã do Porto da Barra. De cara, disparei: - Qual é o seu signo e o seu santo no candomblé, meu rei? Ele estranhou, colegas riram, mas respondeu: - Touro. E Oxóssi.

Outra missão. Registrar, em ‘matéria fora dos padrões, do seu jeito’, a saída da Mudança do Garcia, o mais genuíno e picaresco evento do carnaval baiano. O cortejo era pura pândega. Fui, mas quase não voltei ao jornal. Acompanhado do repórter fotográfico Roberto Gaguinho – figura carimbada no meu álbum de notáveis do jornalismo baiano -, me perdi na multidão – e me deixei levar pelo ‘éter da loucura’.

Acordei horas depois, em sarjeta enlameada. Cachorro vira-lata lambia a minha barba embebida em fiapos de vatapá. Olhei ao redor, caí na real, e pé na estrada. Passei em casa,  tomei banho, engoli xícaras de café puro, e voltei à redação. Fui recebido por Roberto Gaguinho, que bradou: - Fiz fotos lindas. Vamos arrasar! [E não é que arrasamos, mesmo?] Nunca contei esta história. Só a revelo agora, quando tudo isso é merencória memória]. Evoé Mama! Evoé, Momo! Evoé, Monas! Evoé, Salvadores.