A punição de Taison é um absurdo

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  • Miro Palma

Publicado em 22 de novembro de 2019 às 18:43

- Atualizado há um ano

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“Em uma sociedade racista, não basta não ser racista, precisamos ser antirracista”, a frase escrita pelo jogador brasileiro e atacante do clube ucraniano Shakhtar Donetsk, Taison, ficou circulando em minha cabeça. A declaração aconteceu após o jogador sofrer insultos racistas em uma partida contra o Dínamo de Kiev, no último dia 10. As ofensas, dirigidas a ele e aos outros companheiros brasileiros do time, foram respondidas com um gesto indignado: o dedo do meio. Um chute furioso na bola em direção a torcida racista causou a sua expulsão da partida. Taison deixou o campo chorando. Dentinho, companheiro de clube, também. 

Anteontem, quando foi celebrado o Dia Nacional da Consciência Negra aqui no Brasil, a Associação Ucraniana de Futebol confirmou que suspendeu por um jogo o atacante Taison como punição pelo seu ato. Isso mesmo, você não leu errado: a Associação Ucraniana de Futebol puniu a vítima de um ataque racista. 

O Dínamo de Kiev também foi punido. O clube terá que jogar uma partida com os portões fechados e pagar uma multa de 500 mil Grívnia, cerca de R$ 87 mil. Convenhamos, uma punição até branda comparada a gravidade do que fez sua torcida. 

Quando eu soube que Taison seria penalizado por responder a uma agressão tão cruel, me lembrei de um antigo discurso da ativista do movimento negro dos Estados Unidos, Angela Davis. Quando questionada sobre a violência causada por pessoas negras, ela respondeu: “Você me pergunta se eu aprovo a violência e isso não faz sentido. [...] Porque eu vejo que quem está perguntando não faz a mínima ideia do que as pessoas negras passaram, do que experimentaram neste país [Estados Unidos] desde que o primeiro negro foi raptado do seu lar na África”. 

Nesse discurso, Davis falou sobre uma realidade norte-americana – que, apesar dos avanços, não mudou muito nos dias de hoje – que, infelizmente, é comum em muitos outros países. Como na Ucrânia. Como aqui no Brasil. No mesmo dia em que saiu a confirmação da punição de Taison, o goleiro da equipe sub-20 do Flamengo, Hugo Souza, foi até o árbitro nos minutos finais da partida conta o Vasco para reclamar de gritos de “macaco” vindo da torcida rival. Cerca de uma semana antes, no Mineirão, o segurança do estádio Fábio Coutinho foi agredido verbalmente por torcedores do Atlético Mineiro, entre eles os dois irmãos Adrierre Siqueira da Silva e Natan Siqueira Silva que, além de cuspir no funcionário do estádio, o chamaram de “macaco” e falaram “olha a sua cor”.

A decisão da Associação Ucraniana de Futebol de culpabilizar a vítima do racismo não me surpreendeu. Me surpreende que Taison não tenha tomado uma atitude mais drástica. Ou Hugo, ou Fábio. Porque, com minha experiência de um homem de pele clara, é muito difícil compreender de onde vem o autocontrole depois de séculos de constante violência.

Taison foi combativo diante de um ataque baixo. Sua atitude não merecia punição. Merecia, no mínimo, um pedido de desculpas do Dínamo de Kiev em nome de sua torcida desqualificada. Merecia apoio da associação que relativizou uma agressão racista. Merecia compreensão. Afinal, ninguém tem sangue de barata.

Miro Palma é jornalista e subeditor de Esporte. Escreve às sextas-feiras.