'Alarme da Bahia', conjunto de sinos da Conceição da Praia volta a tocar após 40 anos

Campanário de 16 sinos ganhou sistema automatizado capaz de tocar músicas; inédito no Brasil, só existe semelhante na Itália e na Rússia

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  • Alexandre Lyrio

Publicado em 7 de fevereiro de 2021 às 15:05

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Arisson Marinho/CORREIO

Podia ser alguma autoridade chegando na primeira capital do Brasil pela Baía de Todos os Santos ou simplesmente o horário da Ave Maria. Podia ser a morte de um ilustre, um casamento da nobreza, um dia de santo ou só a próxima missa. O fato é que, ao longo de mais de dois séculos, os sinos da Basílica de Nossa Senhora da Conceição da Praia foram "o alarme da Bahia". Tinha gente que sabia de cor e salteado o que representava cada toque. 

Neste domingo, depois de mais de 40 anos, os 16 sinos da basílica voltaram a tocar a plenos badalos. A revitalização dos equipamentos sonoros ocorreu graças ao Projeto de Resgate do Toque dos Sinos, da Secretaria do Turismo do Estado(Setur), que desde 2019 fez o mesmo trabalho em outros sete templos na Bahia: a Igreja do Rosário dos Pretos, a Igreja de Nossa Senhora da Graça, a Igreja de Santo Antônio da Barra, a Igreja do Passo, a Igreja da Ajuda, a Igreja de São Domingos e uma igreja em Trancoso, município de Porto Seguro.

Assim como os demais, o novo sistema, que custou em torno de R$ 200 mil, é totalmente automatizado (veja vídeo). Mas, no caso da Conceição da Praia, a automação é inédita no Brasil e até nas Américas. Com 16 sinos, o campanário da Conceição é capaz de tocar músicas, sacras ou não. Apenas igrejas na Rússia e na Itália possuem sistemas semelhantes.

"Foi a mais complexa de todas as revitalizações até agora. São 16 sinos de diversos tamanhos e que tocam de forma diferente. Cada sino badala no momento certo para tocar a música, seja a Ave Maria ou o hino nacional", explica o historiador Rafael Dantas, responsável pelo projeto. Rafael observa que, com o tempo, os sinos sofreram um processo de degradação que provocou rachaduras nas estruturas. 

Ultimamente, para poupa-los, os sinos eram tocados de forma improvisada, apenas em momentos muito especiais, como a festa da padroeira da Bahia, Nossa Senhora da Conceição da Praia, no dia 8 de dezembro. O último sineiro da Igreja, que já enfrentava dificuldades para badalar os sinos, morreu na década de 1980.

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Controle remoto A nova automação, explica Rafael, ocorre através de um sistema eletromecânico controlado por computador e acionado por controle remoto. "O sino fica parado e o sistema faz o badalo ir de encontro à parede da estrutura", explica. Os horários dos toques são programados. Todos os dias, os sinos irão tocar às 6h, ao meio dia e às 18h. Mas é possível programa-los para outras tantas ocasições. Rafael destaca a relevância dos sinos da Conceição da Praia na comunicação da antiga Salvador. “Além de toda a relevância nas atividades litúrgicas, o toque dos sinos era elemento chave no processo de sociabilidade na cidade”.

São nove sinos em uma torre e sete em outra: o templo com o maior conjunto de sinos na Bahia. Os 16 foram colocados no decorrer dos séculos 18 e 19.As revitalizações são todas custeadas por empresas privadas, não há dinheiro público. No caso da Conceição, o investimento foi feito por três benfeitores: Toninho Andrade, Jorge Simões e Jorge Goldenstein. A inauguração do sistema automatizado dos sinos contou com uma missa presidida pelo arcebispo primaz do Brasil, Dom Sérgio da Rocha. "Que os sinos nos convoquem à oração, que nos convoquem a uma vida em comunidade, uma vida em união", disse Dom Sérgio. Dom Sérgio da Rocha (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Poucos estavam tão emocionados pelo toque dos sinos quanto o padre Adilton Lopes, reitor da Basílica há 15 anos. "Os sinos são Deus nos chamando à oração. Somos impulsinonados a rezar porque eles ajudam o ser humano a recordar de Deus. Os sinos fazem bem à alma, mesmo que seja para reconfortar em um momento triste. Hoje tivemos essa grande graça depois de mais de 40 anos", comemorou o padre. O secretário de turismo, Fausto Franco, disse que o projeto de revitaização dos sinos vai coninuar. "Jorge Amado dizia que Salvador tem 365 igrejas. Sabemos que tem até mais. Queremos atingir o máximo possível de templos com esse projeto". A próxima reativação ocorrerá nos sinos da Câmara Municipal de Salvador. 

A Basílica da Conceição da Praia foi um dos primeiros templos a ser construídos em Salvador. A igreja atual é a terceira a ser erguida no local, iniciada na primeira metade do século 18. A fachada montada em pedra de lioz trazida de Portugal é um projeto atribuído a Manoel Cardoso de Saldanha. A basílica compõe o belo frontispício da Cidade Baixa, ao lado do Elevador Lacerda. No ultimo dia 8 de dezembro, o templo completou 147 anos, sendo um dos principais cartões postais da capital baiana. Foto: Arisson Marinho/CORREIO Há um ano, pontualmente às 11h, o Terreiro de Jesus e o Largo do Pelourinho assistiram (ou ouviram) um fenômeno que não ocorria há 50 anos. Os sinos da Igreja de São Domingos, da Catedral Basílica e da Igreja do Rosário dos Pretos tocaram juntos. O ato se deu em comemoração à automação de três sinos de uma delas: a de São Domingos. Neste caso, eles eram acionados por um sistema eletromagnético que empurrava a estrutura dos sinos contra os badalos.