Ambulante diz que lucra até R$ 6 mil vendendo guarda-chuva: 'Rezo pra chover'

Salvador passará por distúrbio que causa instabilidade no clima até o início de julho

  • Foto do(a) author(a) Tailane Muniz
  • Tailane Muniz

Publicado em 4 de abril de 2019 às 16:03

- Atualizado há um ano

. Crédito: Mauro Akin Nassor/CORREIO

O tempo fechou em Salvador. Com o fim da temporada de Verão, agora é hora de reorganizar o jeito de ganhar dinheiro. Trocar o picolé pela capa de chuva, a água de coco pelo guarda-chuva, e buscar alternativas. O negócio é dançar conforme a música - ou melhor, vender o produto de acordo com as previsões meteorológicas. 

E, para os empreendedores de plantão, um aviso: até o início de julho Salvador sofrerá com um distúrbio climático. Trata-se do Distúrbio de Leste (DOL) que, segundo a meteorologista do Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), Maryfrance Diniz, provoca instabilidade no tempo, como ocorreu na capital baiana nesta quinta-feira (4). Pela manhã, choveu e trovejou, enquanto no turno da tarde o sol apareceu e fez bastante calor. Foi pensando no famoso toró, como os soteropolitanos chamam as chuvas fortes e repentinas, que a ambulante Telma Cristina dos Santos, 50 anos, começou a lucrar. Segundo ela, o lucro já chegou a R$ 6 mil por semana.

Depois da forte chuva desta quinta, ela já torce e prevê: "Agora é 30 dias de chuva na cidade, graças a Deus". Entusiasmada, Telma explicou à reportagem o porquê de comemorar tanto o tempo ruim. É que nos dias em que 'o cacau cai', o ensopado com carne de primeira é prato certo na residência da família Santos, no bairro de Alto de Ondina, em Salvador.

Mãe de cinco, 'negona do guarda-chuva', como prefere ser chamada, trabalha com a venda do acessório há mais de 40 anos na região da Piedade, no Centro da cidade. Apaixonada pelo trabalho, ela conta que criou os filhos com a venda no comércio informal. "Chego a rezar para São Pedro mandar mais água", brinca. Afinal, quanto mais água, maior a possibilidade de bater a meta que ela mesma traçou: vender 100 unidades, a R$ 15, por dia. 

As sombrinhas de Telma são de formas, cores e tamanhos variados. E ela capricha na hora de vender. "Chegou a menina do momento! O menino chorou? Guarda-chuva pra ele! Vem de R$ 10, minha gente". Aos risos, a Negona garante que, além de chuva, o bom humor é diferencial para conseguir vender."Claro que não dá pra vender 100 todo dia. Quando o sol chega, fica tudo barril, aí eu tenho que fazer aquela promoção, brincando com o cliente, fazendo aquela piada. Propaganda é alma do negócio", brinca ela, ao explicar à reportagem que armazena a mercadoria em um depósito na região da Piedade.  Telma afirma que, em dias chuvosos, vende 100 sombrinhas por dia (Foto: Mauro Akin Nassor/CORREIO) Mau tempo Na contramão das previsões - e lucros - de Telma, o vendedor de coco Itamar Assunção, 48, garante, no entanto, que o mau tempo representa prejuízo para a maioria dos vendedores informais. "Quem gosta de toró? Não tem quem ache isso bom, atrapalha tudo", disse, em tom de chateação. Ele, que também atua na região central da cidade, afirmou que até já vendeu guarda-chuva, mas não gostou."Não tem nada de de mais. O valor que a gente compra não é muito menor do que a gente consegue vender. Às vezes, é melhor vender um alimento, até, por R$ 5, que sai mais e ocupa menos espaço", defende.Enquanto isso, implacável na propaganda, Telma atrai até mesmo quem se interesse do guarda-chuva para se proteger do sol, como a estudante Ellen Carmen Bahia, 29. "Eu já conheço ela dos tempos. Sempre compro minhas sombrinhas com ela, até hoje tenho uma que comprei há dois anos, que uso até para os dias de sol".

A preferência pelo produto, segundo a famosa ambulante, vem do preço e variedade que são oferecidos. "Eu vendo várias coisas se for preciso. Eu sou correria, gosto de ter o meu. Mas gosto mesmo é de vender minhas sombrinhas", completa ela. 

Distúrbio de Leste De acordo com a Defesa Civil de Salvador (Codesal), as chuvas que atingiram a cidade nesta quinta foram ocasionadas pelo Distúrbio de Leste (DOL). A Codesal informou que "esse tipo de sistema meteorológico é de difícil previsibilidade", porque se forma rapidamente e causa eventos chuvosos em tempo considerado curto. 

Maryfrance Diniz explicou que o DOL é mais comum no Nordeste do estado e costuma ocorrer com frequência no mês de junho. A explicação para a ocorrência de chuvas como a desta quinta, no entanto, de acordo com a especialista, é justificada pelo aumento da temperatura no Oceano Atlântico."As chuvas na região do Recôncavo e parte litorânea começam em abril e vão até julho, em geral, mas como as águas do oceano estão muito aquecidas, há um aumento do fluxo de umidade na atmosfera. O Distúrbio de Leste vem com a intensificação de ventos", destacou. A especialista acredita que o DOL pode voltar a acontecer, em momentos variados, pelos próximos três meses. Telma do guarda-chuva quer mais é que a água caia ainda mais nos próximos dias. Se a previsão contrariar, disse que vai voltar a vender água mineral, cerveja e refrigerante porque, chova ou faça sol, o que Telma garante mesmo é o bom humor.

Confira a nota na íntegra da Codesal, sobre o distúrbio climático:"A intensa chuva que atingiu Salvador na manhã desta quinta-feira (04/04) foi resultante de um sistema atmosférico, conhecido entre os meteorologistas por Distúrbio Ondulatórios de Leste (DOL), comum na atmosfera tropical, que se caracteriza por altas temperaturas e muita umidade. O fenômeno se desloca sobre o Oceano Atlântico até o litoral e a Zona da Mata nordestina.

“Este sistema se forma rapidamente e causa eventos chuvosos significativos em curtos intervalos de tempo”, explica do diretor geral da Defesa Civil de Salvador, Sosthenes Macêdo.

Ele acrescenta que o DOL, que se formou sobre a capital, por volta das 9h50, teve duração de cerca de três horas e se sentiu com maior intensidade em Periperi, Subúrbio Ferroviário, onde choveu em apenas 30 minutos (entre 10h30 às 11h) 80 mm.

Para se ter uma ideia, 1 mm de chuva equivale a um litro de água armazenada em um metro quadrado. Os maiores totais acumulados de chuvas no intervalo de seis horas foram registrados em Periperi (86,6mm), Alto Peru (59,3mm), Vila Picasso (56,6mm), Bom Juá /Marotinho (39.6mm).

Para o período de hoje a domingo (08/04) estão previstas pancadas de chuvas fracas a moderadas em Salvador a qualquer hora do dia. Essas precipitações estão associadas à formação ode áreas de instabilidade sobre o Oceano Atlântico, não se descartando risco para alagamentos e deslizamento de terra.

Os DOLs se propagam para oeste em áreas onde predominam ventos alísios (resultantes dos deslocamentos de massas de ar quente e úmido que se realizam de forma concêntrica em direção às áreas de menor pressão atmosférica das zonas equatoriais), apresentando configurações ondulatórias".