Assédio não é 'mimimi': veja relatos de mulheres vítimas durante o Carnaval

'Se eu tivesse num lugar deserto, vazio, eu teria sido estuprada', diz um dos relatos

  • Foto do(a) author(a) Thais Borges
  • Thais Borges

Publicado em 28 de fevereiro de 2019 às 07:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Instagram/Reprodução

Não é ‘mimimi’. Não é bobagem. E não é porque já aconteceu “com todo mundo” que o assédio deve ser considerado uma coisa normal. A pedido do CORREIO, 10 mulheres aceitaram contar relatos de assédios e abusos sexuais que sofreram em diferentes momentos do Carnaval. 

Acompanhe todas as novidades do Carnaval Correio Folia

Durante a apuração, percebemos que, dentro de nossa própria realidade, encontramos vítimas do machismo. Repórteres e editoras que chegaram a ser impedidas de trabalhar por assédios durante a cobertura da folia. Por isso, aqui, também há depoimentos de profissionais do CORREIO que aceitaram relatar violências sofridas durante a festa. 

Leia também: Guia: aprenda a diferença entre assédio e paquera e não seja um babaca na foliaLara Guimarães, 25 anos, designer de moda  "Tem três anos e foi no show de (Wesley) Safadão. Estava em busca de uma pessoa dentro do bloco e atravessei o bloco para achá-la, porque a gente tinha marcado. Foi quando vários homens me cercaram e fizeram uma rodinha em torno de mim. Fui forçada a beijar um deles. Ele só não conseguiu porque fiquei com a mão na frente o tempo inteiro. Conselhi dar uma joelhada nele e sair (da roda). Isso foi dentro do bloco, mas nenhum segurança, nem ninguém tentou me ajudar. E eles (os homens) só riram. 

Me senti humilhada, arrasada. Meu dia de carnaval acabou ali. Isso tem relação com eu não sair mais. No ano seguinte, eu fui para o Rio, não queria mais sair. Hoje, com a gente na luta, na rede contra o assédio, a gente se protege. Então, me sinto um pouco mais protegida agora, mas só saio em grupo. Não saio mais sozinha, nem com duas, três pessoas. Isso me motivou a participar da corrente contra o assédio e motivou minha irmã (Gabriela Guimarães) também a ser embaixadora da campanha Não é Não". Paula Dultra, 38 anos, publicitária "Fora aquelas situações 'básicas' de ser puxada, eu trabalhei por oito anos no Carnaval. Até trabalhando, com roupa de trabalho, já teve cara que parou em minha frente e veio me puxando, até ter que vir outra pessoa pra ele parar. Quando eu era mais nova fui laçada, literalmente, por um cara que estava de vaqueiro. Fui laçada como um boi. Já teve um menino que eu disse que não queria ficar com ele, mas ele me abraçou por trás. Eu me abaixei e mordi, mordi (para se soltar). Ele era bem forte, e ficou dizendo que podia morder mais. Mordi até sentir um dente mordendo o outro. No Carnaval, a maioria das mulheres se sente como um pedaço de carne no açougue. Você está com sua roupinha, uma roupa que se sente confortável e por esse motivo o cara se acha no direito de tocar, mesmo você dando negativa. Muitas vezes você nem vê. eu tenho cabelo curto e eu já recebo a 'lapa' esfregando nas costas. É muito comum. Muitas mulheres já acham que faz parte você receber uma cantada assim, assédio, puxão, pegando o cabelo. Já tive que salvar algumas amigas nesse período. Já milito no movimento feminista há uns 10 anos, então há muito tempo sei disso, mas a maioria das mulheres não sabe. A maioria acha que faz parte do Carnaval. 'Se você não quer isso, não saia de casa'. Mas não é assim. 

Agora, a gente tem que estar mesmo armada para vir uma coisa do nada. Eu já me preparo psicologicamente. Se vou sair de casa com minha fantasia, já penso que posso levar uma mão na bunda. É diferente você estar num lugar que você quer paquerar.  Mas, no meio da multidão, você receber uma mão na bunda não é normal. As pessoas têm que parar de normatizar isso como parte do Carnaval". Yasmin Garrido, 29 anos, advogada, estudante de jornalismo e estagiária do CORREIO "Carnaval, se não me engano, de 2015, eu estava com minha mãe na região da Barra e, do nada, um grupo de Filhos de Gandhy parou a gente. Um foi pra cima de minha mãe, tentando beijá-la, e eu - que sou direta e séria nessas horas - fechei a cara e pedi para eles nos darem licença. Eles se afastaram e, quando virei de costas, pra continuar andando, fui surpreendida por um colar - no estilo laçar boi - que me engarguelou e me puxou para os braços do filho de gandhy. Ele me virou e ficou tentando me beijar. Eu fiquei muito pirada e falei uns desaforos, que não me lembro. Fui embora com minha mãe e eles ficaram fazendo piadas, falando coisas ofensivas só porque tinham sido rejeitados. 

Na segunda situação, eu estava acompanhada de minha namorada (na época) e fui abordada por um homem. Ele perguntou se poderia me conhecer e se eu estava sozinha. Eu disse que poderia conhecê-lo, sim, mas que estava acompanhada de minha namorada. Ele não acreditou, falou que era mentira e continuou a insistência. Até que eu precisei beijar ela para ele poder ir embora - mesmo assim, tivemos que ouvir que "a três é melhor".Caroline Vilas Boas, 20 anos, estudante de jornalismo  "Há dois anos, eu fui para a Avenida, para o circuito do Campo Grande. Estava com uma amiga e a gente passou pelas Muquiranas. Estávamos, na saída, para esperar passar, mas vieram dois fantasiados. Um me segurou pelo braço e outro segurou minha amiga. Eu alterei logo e disse: 'me solte'. Ele me xingou, dizendo que a gente ainda 'estava achando que ele estavam flertando com a gente'. Quando ele me soltou, ele deu um tapa na minha bunda. O que estava segurando minha amiga, tive que afundar a unha nele. Os dois foram embora molhando a gente com a arminha embaixo do short, Ninguém tentou ajudar. As pessoas ainda falam ‘É Muquiranas toda né? É assim mesmo, esse é o Carnaval’. Enxergam como uma brincadeira, mas foi horrível.

Na hora, eu só pensei em soltar minha amiga. Sempre que eu saio, eu volto com chave nos dedos apontando para fora das mãos para me defender. Naquela hora, o que passou na minha cabeça foi: 'poxa, não estou com chave agora'. E eu queria defender minha amiga, soltar ela era meu pensamento. Fiquei desesperada. A gente perdeu até o ânimo de curtir. Fomos para a casa de uma amiga que mora perto, bebemos água. Minha amiga chorou, você sai para se divertir e é assediada". Carla Leal, 40 anos, autônoma "O caso que me deixou até meio traumatizada foi uma vez que eu estava na Barra, indo para o camarote com algumas amigas. Eu estava indo e o cara vindo. Ele era muito alto, muito grande. Ele veio, meteu a mão em mim, na frente, na... e apertou. Eu fiquei tão assustada que não tive reação. Eu tenho 1,70m, olhei para cima, ele devia ter uns 2 metros, olhei assustada e saí. Foi aquele segundo que você fica olhando para a pessoa e ele saiu dando aquele riso malicioso. Se eu tivesse num lugar deserto, vazio, eu teria sido estuprada. Eu tinha uns 28 anos. A gente estava numa filinha, então a amiga que estava atrás de mim viu, me puxou, mas foram aqueles segundos intermináveis. Ele estava sozinho, não foi nem nada em grupo. 

Mas ele foi invasivo, tocou numa parte íntima. Foi bem difícil, você se sente impotente, não tinha polícia, não tinha ninguém perto. E uma outra situação que deve ter um ano ou dois, foi o final do Filhos de Gandhy e eu vi um módulo policial. Fiquei próximo porque sabia que não ia ter problema nem nada. Os Filhos de Gandhy são sempre invasivos nesse sentido, então um começou e eu disse que não, que não. Fiquei rodando o posto da policia, ele atrás de mim. Eu disse que era casada, ele não acreditou. Nada parava esse homem. É chato, porque a insistência é chata. Essa lei contra o assédio pelo menos vai proteger um pouquinho. Espero que a polícia tenha sensibilidade para receber esse tipo de denúncia. Esse ano, estou pensando em ir, mas numa coisa mais light. Ir para a casa de alguma amiga que dê para ver, algo mais simples, porque o assédio incomoda muito e a violência incomoda muito". Fernanda Varela, 29 anos, jornalista, subeditora do CORREIO "Meu primeiro beijo foi bizarro e com um ilustre desconhecido. Até aí tudo bem, se ele tivesse vindo na hora que eu quis e com quem eu quis. Aconteceu no meu primeiro Carnaval como foliã. Eu fui com uma amiga para o circuito Barra-Ondina (tínhamos comprado cinco dias de bloco) e, logo no primeiro dia, no Cerveja e Cia, ainda no comecinho do percurso, eu fui agarrada por um cara, que eu nem sei de onde veio. Eu juro que não sei se ele era branco, negro, alto, baixo, loiro, ruivo, tatuado. Ele simplesmente me beijou. Me agarrou, enfiou a língua em minha boca e saiu. Eu fiquei tão em choque, que nem reagi. Nem olhei pra trás, pra ver quem era. 

Eu não fui pro Carnaval pra pegar ninguém, só queria me divertir. Também não queria que meu primeiro beijo tivesse essa narrativa. Eu consegui curtir os outros dias sem problemas e não é mais um trauma pra mim, mas, na época, foi uma coisa que me machucou.

Me feriu como mulher. Eu tinha o direito de querer que fosse diferente e ele - cujo nome não faço nem ideia - simplesmente destruiu isso. Quando rolava papo sobre primeiro beijo, eu era a primeira a abaixar a cabeça e sair das conversas, e isso me marcou".Amanda Palma, 29 anos, jornalista, repórter do CORREIO "A multidão do Carnaval sempre me assustou, mas me sentia segura com minha família. Aos 17 anos, estava com meus pais e outros parentes, animada com a folia. Tinha acabado de chegar quando um cara se sentiu no direito de puxar meu cabelo. Puxei de volta e ele puxou de novo. Meus parentes viram a situação e quase vira uma confusão. O Carnaval teve outro sentido pra mim ali.Já trabalhando como jornalista, sofri de novo. Estava com a blusa da empresa, com crachá, bloquinho, quando recebi um jato de água na bunda. Eram Muquiranas. Uma, duas, olhei pra trás e saí andando, ainda com outros jatos de água. O último assédio foi quando estava cobrindo a saída de um bloco na Barra. Eu escrevia no bloquinho quando um turista pediu meu telefone. Eu disse que não. Ele insistiu. Eu disse que não queria dar e que estava trabalhando. 'É por isso mesmo que quero'. Pedi respeito, dei as costas e saí".Gisana Railine, 34 anos, advogada "Foi no Carnaval de 2011. Eu desci do camarote e, na época, meu amigo tinha um restaurante. Desci para encontrar um pessoal, com quem fiquei conversando. Reparei que tinha um cara vestido de Gandhy olhando, mas não levei muito a sério. Quando meus amigos saíram para ao camarote, esse cara veio e tentou me agarrar a força. Ficou aquela luta, mas um homem com quase dois metros de altura, fica quase impossível uma mulher se sair. Foram aquelas velhas frases. ‘Você está fazendo doce, eu sei que você quer, toda mulher no Carnaval quer, você estava me olhando’. Para minha sorte, tinha um grupo de cinco ou seis meninos que eu tinha conhecido no dia anterior no camarote e me tiraram de lá. Foi a situação mais absurda que eu vivi. Eu acho que é pior do que medo. É a situação da impotência, de não conseguir fazer nada, de ter várias pessoas olhando e ninguém conseguir fazer nada, porque as pessoas acham que toda mulher que está sozinha no Carnaval está se oferecendo. As pessoas acham que, se você está com uma roupa curta ou decotada, é possível. Se ela está ali, é um objeto, é nada. E tenho visto que isso tem piorado. 

Hoje eu ouvi a seguinte frase: ‘o Carnaval perdeu a graça por causa da lei do assédio’. Eu me exaltei no trabalho, disse que a pessoa que estava falando tem uma filha mulher. A lei, na verdade, veio colocar para fora algumas coisas que as pessoas falavam, coisas que estavam escondidas. As máscaras todas caíram. 

As pessoas veem a situação e não ajudam. Em outra situação, eu pulei na frente do cara que estava agredindo a mulher e disse para ele que antes de bater nela, ia ter que me bater. Fiz um escândalo até virem vários seguranças no camarote. As pessoas veem alguém sofrendo e não fazem nada. 

Eu gosto do meu corpo, gosto de quem eu sou e quero estar bem para mim. Aquela fantasia não é um convite para ninguém. Meu sentimento é de impotência mesmo. Tulipa* (nome fictício), 30 anos, jornalista "Minha família, pelo que eu recordo, sempre foi meio carnavalesca. Meus pais sempre gostaram muito de Carnaval. Mas a primeira lembrança que tenho do Carnaval é de um dia que eu estava vestida de índia, minha mãe com um top branco e estávamos tomando refrigerante. Eles me levaram para passear no Politeama e eu era muito novinha. Tinha uma banda, Chiclete com Banana, e eu não sei se eu gostava da banda. Mas o que meus pais me contam é que, quando pedi para ver o Chiclete passar, meus pais não queriam me levar, em 1992, 1993, por aí, o Chiclete passou e eu dei uma crise de choro. Era muita gente. Eu era muito pequenininha, estava com muito medo e não sei se pela aglomeração, pelo puxa-puxa, mas até até aí tudo bem. Foi daí que eu fiquei com um pezinho atrás com Carnaval. Eu sempre tentei desconstruir esse pé atrás com Carnaval, porque sou soteropolitana, de família super carnavalesca e sou alegre, gosto de festa. 

Em 2004, eu tive um namorado que é muito fã de Carnaval e insistiu muito para a gente ir. Fui com ele, mas a gente desceu e o lugar tinha uma ambulância. Não sei se a gente desceu na Barroquinha para subir o Pelourinho ou se a gente desceu na Avenida Sete, perto do circuito para ir andando. Sei que, quando a gente desceu, tinha um cara com uma facada nas costas e outro com um espetinho de churrasco no ouvido. E aí eu não mais queria ir, mas ele me convenceu. 

Quando eu cheguei, passou a Timbalada, foi super difícil ultrapassar e veio um bloquinho desses alternativos na Praça Castro Alves. As pessoas se espremiam nas paredes, até que veio o Chiclete com Banana. Quando veio o Chiclete, meu namorado disse ‘não solta da minha mão, fica comigo que eu te protejo’. Mas não adiantou. Eu tenho 1,50 m e eu me perdi. Eu nunca vi tanta mão na minha bunda. Meu peito parecia tomate de feira. Eu comecei a me desesperar, entrei numa crise de pânico a ponto de chamar tanta atenção no bloco que eles abriram um buraco, a ponto de pedir ajuda. As pessoas faziam do meu corpo uma coisa que era pública e não é . Era o meu corpo. Ele me achou, fomos para uma unidade de atendimento, eu recebi os primeiros cuidados. Fiquei com esfoliações, porque o público do Chiclete fica empurrando. E eu não pulava, eu era empurrada. Esse caso me traumatizou pra caramba e eu jurei que munca mais iria para o Carnaval. 

Mas aí eu viro jornalista. Uma vez, eu era estagiária e fui repórter de pista. O primeiro assédio que sofri como repórter eu estava naquele circuito Barra-Ondina das marchinhas (circuito Sérgio Bezerra), em 2013. Eu fui fazer minha passagem e meu ex estava por lá. Ele era muito cuidadoso, estava perto de mim, meu assistente era muito legal e estava próximo tentando fazer uma barreirinha. Eu não estava animada, mas é nosso emprego. Eu estava de camisa vermelha, calça preta e, quando comecei a gravar, graças a Deus não foi ao vivo, um cara do nada pulou no meu pescoço e queria me beijar a qualquer custo. Graças a Deus, meu assistente puxou ele e meu ex foi me tirando do local. Eu fiquei abismada porque, puta que pariu, velho, eu não estava preparada para um negócio desses. Já tinha ouvido falar que repórter sofria isso, mas nunca tinha acontecido. Aquele circuito era de marchinhas e eu sei que meu ex era pacífico, não quis bater no cara e que, obviamente, eu estava numa posição muito vulnerável. Eu estar trabalhando facilitou ele me assediar. Essa foi a coisa mais ridícula que ouvi, mas foi o que os amigos dele me disseram. 

Conversei com outras repórteres que me ajudaram muito. Eu aprendi que meu corpo seria, para os homens, algo público. Comecei a ficar mais safa. 

Passada essa experiência, eu formei, trabalhei em outra emissora e voltei para a emissora anterior em 2014. Vivi assédios corriqueiros, inclusive de artistas, o que me deixa muito emputecida, mas durante o Carnaval, no camarim, nos bastidores, eu tive um problema sério uma vez. O vocalista de uma banda estava vindo para cima de mim querendo me beijar e eu fiquei muito chateada. Artistas também fazem isso.

Minha pior cena de fato foi em 2015, que foi o melhor Carnaval para mim em termos de profissão. Numa das matérias de rua, eu tinha que atravessar  o Gandhy para fazer uma matéria infantil do outro lado da pista. Meu cinegrafista era muito mais velho que o habitual, então ele foi na frente, o pessoal geralmente respeita mais o cinegrafista e meu assistente ficou tentando proteger ele, porque ele estava com o tripé, coisa que é super raro de levar. E eu fiz a burrice de ficar atrás do assistente. Eu não pensei muito, não imaginei que ia acontecer no Gandhy. Um cara passou aquele colar do Gandhy no meu pescoço para me beijar, só que ele fez isso de forma animalesca e quando ele fez isso, ninguém fazia nada. Eu peguei a canopla (do microfone) e comecei a bater na cabeça dele. Os outros Gandhy viram que estava acontecendo algo, chamaram minha equipe e expulsaram ele do bloco, mas aquilo mexeu para caramba comigo, porque foi sem noção.

Em 2016, eu fui fazer uma matéria de camarote. Adorava, mas sempre tinha aquelas piadinhas e aquelas pegadas na mão. Pelo menos não era tão grave quanto as Muquiranas, porque eles passavam de qualquer limite humano. Eu tinha um cinegrafista que é boxeador, mas tem uns 70 anos. Nem está mais trabalhando. A gente estava sem assistente, estava barril e passando pela Muquiranas para chegar no praticável.A galera pegou o câmera e começou a jogar água, meter o dedo no ânus dele, desrespeitar completamente e fazer a mesma coisa comigo. Com ele, eles faziam como se fosse mulequeira, que é um desrespeito enorme com um idoso. Comigo, eles faziam se esfregando. Aí um deles colocou o pênis para fora. Eu lembro que a fantasia tinha um negócio rosa choque. Era rosa choque e tinha uma pistolinha. A peruca era rosa choque e aquele cara com o pau do lado de fora. Eu comecei a me desesperar, mas só que, se a câmera quebrasse, seria responsabilidade nossa. Ficaria difícil para o cinegrafista me defender e defender a câmera.

Eu acabei socando todo mundo que eu vi pela frente. Cheguei no praticável totalmente arrasada, dei uma crise de choro. Meu cinegrafista foi lá ver os danos da câmera e graças a Deus o chefe da externa era um anjo, super compreensivo. A gente passou a Muquiranas porque a gente tem horário a cumprir.

As pessoas ficavam falando ‘você tem que aprender a trabalhar em multidão, porque você é repórter’. Eu disse ‘meu filho, eu trabalho em multidão, eu trabalho no Femadum’. O cara no Femadum pegou no um pesoço, me agarrou pra beijar e ninguém fez nada. Mas a questão é  que sempre vão culpar a vitima. Ah, o que você estava fazendo no Muquiranas? O que você estava fazendo? Sempre a culpa era minha. E estava trabalhando, mas a culpa era minha. Continuo dizendo que não encaro Carnaval, não gosto. Prefiro interior, Maragojipe. Nao culpo Carnaval, mas os homens perdem a noção completamente. 

Conte sua história Você já foi assediada no Carnaval de Salvador? Pois, para mostrar que assédio sexual não é ‘mimimi', o CORREIO está reunindo relatos de mulheres que desejam contar sobre violências que já sofreram nos circuitos da folia. 

O ano de 2019 deve entrar para a história como o primeiro em que o assédio sexual – em todas as suas formas – será crime, devido à lei federal 13.718, aprovada em setembro do ano passado e que tipifica a importunação sexual. 

Para participar, basta preencher este formulário. A participante pode enviar o relato de forma anônima, se preferir. 

Os relatos vão ser utilizados em uma matéria sobre o assédio no Carnaval. 

Veja como denunciar Há várias formas de denunciar, que vão desde chamar a patrulha da Polícia Militar mais próxima, entre os PMs que ficam fazendo rondas a pé entre os foliões, até simplesmente fazer um registro em um dos postos da Polícia Civil no circuito. De acordo com a Secretaria da Segurança Pública do Estado (SSP-BA), pela primeira vez, três Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deam) vão funcionar nas proximidades da folia. 

Anota aí: elas vão ficar no canteiro central da Avenida Ademar de Barros, em Ondina; no Largo Dois de Julho e na Rua Airosa Galvão, na Barra. No entanto, qualquer delegacia que estiver funcionando poderá atender aos casos de assédio e agressão à mulher – seja uma Deam ou não. 

Os policiais vão ser indicados a ficar atentos a todo tipo de situação – seja quando homens estiverem encostando demais em uma mulher sem o seu consentimento, seja em tentativas de beijo forçado ou até se um homem estiver se masturbando perto de uma mulher. O beijo forçado, inclusive, já foi considerado estupro pelo Supremo Tribunal Federal (STF). 

Na hora de fazer a denúncia, vale tudo – desde levar uma ou duas testemunhas do crime até registrá-lo em vídeos, áudios e fotos. O registro não precisa ser feito, necessariamente, pela vítima. Ou seja, se alguém, no circuito, notar que uma mulher está sendo assediada, pode registrar o caso para que ela use as imagens como prova depois.