Baco: 'Eu parei pra me olhar tarde demais e estava com a saúde destruída'

Rapper conversou com o CORREIO uma semana após o lançamento do álbum QVVJFA e falou sobre saúde, sexo, vida pessoal e projetos

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  • Vinicius Nascimento

Publicado em 4 de fevereiro de 2022 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Roncca

Você pode não conhecer Diogo Moncorvo, 26, mas certamente já ouviu falar em Baco Exu do Blues. De volta a Salvador após uma longa temporada em São Paulo, o rapper brinca de ser dono do mundo. Hoje, por exemplo, tem quinto disco mais ouvido no Spotify em todo o planeta, com seu disco QVVJFA? (Quantas Vezes Você já foi Amado?), lançado no dia 26 de janeiro, o terceiro de sua carreira. Rico, feliz e firme, Baco diz ter se encontrado e está satisfeito com seu próprio trabalho, independente das críticas e polêmicas que circundam seu nome.

Em QVVJFA, ele conta que fala da forma do homem preto receber e dar afeto. Orgulhoso, diz que Baco Exu do Blues nunca foi tão Diogo Moncorvo. As duas personalidades aparentemente ficaram separadas durante um período de vida dele, por mais que, quando questionado, diga que se identifica muito com os dois vocativos e deixou a reportagem bem à vontade para chamá-lo como preferimos."Estou surpreso. É é a primeira palavra que posso dizer. Estava sumido há muito tempo e esperava que fosse num nível menor. Essa repercussão pra mim é um grande e presente, uma maluquice na minha cabeça. Bota fé que não acreditei num primeiro momento?", diz sobre o sucesso no Spotify com menos de uma semana após o lançamento do disco.No entanto, o que mais o deixou feliz foi a maneira na qual o público recebeu as 12 faixas: "A maneira como vi as pessoas debatendo afeto e como lidam com afeto dentro da própria vida, as dificuldades que têm tanto para receber quanto para dar afeto, isso me surpreendeu. As pessoas foram a fundo na discussão".

O próprio Baco conta que precisou mergulhar fundo em suas próprias questões. Ele revela que foi um adolescente muito agressivo e hoje percebe que aquilo era uma casca que criou enquanto um rapaz negro para evitar apanhar todo dia. O processo criativo dentro da pandemia foi o de mergulhar dentro de si, revisitar de onde vêm suas duras e tentar se fortalecer. Ele sentia que se abaixasse a cabeça seria agredido e não encontraria paz. Ser agressivo foi a resposta que encontrou para se preservar.

O próprio retorno a Salvador, diz Baco, foi importante no processo. "Eu acho que revisitar esses lugares e expulsar isso que estava dentro de mim no disco... Eu fiz dois discos na pandemia. 'Bacanal' sai em breve e o processo dos dois discos foi muito doloroso mas muito necessário pra mim, pra eu me entender, entender que não sou o culpado de certas coisas, não sou tão ruim ou tão merda quanto imaginava", revela.

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QVVJFA traz feats com Gal Costa, Vinicius de Moraes (em samples), Gloria Groove e Muse Maya. E ainda trechos de Batatinha e Originais do Samba, além de áudios de personalidades da música da Bahia como Ravi Lobo do Rap Nova Era, JF e Polêmico da Banda O Metrô e o ator Leandro Ramos. Tudo com o dendê de Exu e o talento de Baco. Aliás, a religiosidade africana é tema em destaque no disco. Parece que o cantor se encantou pelas entidades para entender o melhor sentido do amor.

A relação entre corpo, negritude e mente é um elemento que sempre esteve presente no trabalho de Diogo. E as polêmicas são quase inevitáveis. Durante a pandemia, ele foi obrigado a se cuidar um pouco mais e levou as orientações médicas a sério: voltou à pratica artes marciais (uma paixão) e ficou mais disciplinado com academia e alimentação. Ele conta que estava obeso e muito próximo de ter problemas sérios como hipertensão, por exemplo. Baco voltou a morar em Salvador após longa temporada em São Paulo (Foto: Roncca) Depois de todo o foco, a mudança no corpo foi nítida e gerou burburinho nas redes sociais, com um debate sobre gordofobia após muitos tweets elogiando a nova forma física. "Eu vi alguns debates, muita gente colocando a culpa do sucesso do disco por eu estar em um certo padrão e eu fico um pouco preocupado com isso. Fui obrigado a me cuidar. Eu parei pra me olhar tarde demais e estava destruído, com a saúde destruída. Não fiz nada para ficar menos gordo. Eu precisava fazer por minha saúde e ver as pessoas colocando de forma maldosa me incomoda".

Bacanal Além do QVVJFA, Baco fez um outro disco durante a pandemia: Bacanal, que deve ser lançado ainda em 2022. Ele não deu detalhes se será uma continuação do seu último EP, 'Não Tem Bacanal Na Quarentena', lançado em 2020. A presença do sexo e da sexualidade sem pudores é motivo de memes e até críticas no trabalho de Diogo. As brincadeiras são levadas na esportiva, mas ele fica chateado de ser acusado de fazer um trabalho que só fala sobre sexo. Baco diz que está firme e muito forte (Foto: Roncca) De acordo com Baco, cada pessoa tem seu tempo de amadurecer "e entender as coisas como realmente são". Ele acha exagerado o rótulo de ser um cara que só fala de sexo em seu trabalho e diz que a maioria das pessoas tem uma relação puritana com o sexo. Não as culpa, mas diz que essa não é a sua realidade: "Eu componho sobre minha vida e o que eu sinto. Dentro da minha vida, o sexo é fácil, não é um bicho de 7 cabeças pra mim. Não sinto que estou descobrindo o Brasil quando falo disso. É um detalhe, uma linha. Um dia essas pessoas vão tratar a sensualidade das coisas de forma normal", aponta.

Construído na cultura hip-hop, Baco já passeou por muitos estilos dentro de seus trabalhos e mesmo assim segue se considerando um artista de rap. E um artista que faz tudo que quer: fala de sexo, de dinheiro, futebol, amor, dúvidas e continua conseguindo fazer com que as pessoas sejam provocadas por seu trabalho. Gostando ou não, seja como Diogo ou Baco.