Barril triplicado: fuzis apreendidos na Bahia podem alcançar alvo a 3,8 km

Número de fuzis recuperados triplicou desde o ano passado

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  • Mario Bitencourt

Publicado em 16 de novembro de 2017 às 20:20

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Alberto Maraux/SSP

Chamar alguns lugares da Bahia de “barra pesada” pode ser considerado exagero por algumas pessoas, mas há números que podem justificar essa classificação nada amistosa. Um deles é o que demonstra o aumento das apreensões de armas desde 2014 em todo o estado: os criminosos estão cada vez mais aderindo às armas pesadas, como fuzis, cujo número de apreensões triplicou de 2016 para 2017, segundo a Secretaria da Segurança Pública (SSP).

Entre as armas, está o Fuzil Automático Leve (FAL) 7,62mm, conhecido popularmente no Brasil como "sete meia dois", que consegue atingir um alvo a até 3,8 km de distância. Com 1,10m de comprimento e pesando quatro quilos, ele tem sido utilizado em navios e organizações militares em terra. Originário da Bélgica, ele ainda fabricado no Brasil e nos EUA, e consegue, a uma distância de 600 metros, ter boa precisão e alto poder de destruição. Arte: CORREIO No rol das armas retiradas de circulação entre janeiro de 2014 e setembro de 2017 na Bahia, as polícias Civil e Militar apreenderam, ao todo, 18.920 armas, a maioria revólveres (11.376), espingardas (4.026) e pistolas (2.316). Também aparecem na lista carabinas (96), garruchas (612), rifles (198), escopetas (122), submetralhadoras (82), metralhadoras (46) e os famigerados fuzis (46). A média é de 11 armas apreendidas por dia.

No estado, houve 4.549 apreensões de armas em 2014; 4.962 em 2015, 5.381 em 2016 e 4.028 em 2017 (janeiro a setembro). Neste ano, de janeiro a setembro de 2017, houve a apreensão de 22 fuzis contra sete em 2016, aumento de 314%. Já as metralhadoras, foram 12 este ano, contra nove em todo ano passado.

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Essas armas são consideradas de grosso calibre (de 50 milímetros em diante) ou de grande poder de fogo, quando se consegue dar mais de 100 tiros por minuto. Também foram tiradas de circulação 1.032 espingardas, 2.181 revólveres e 555 pistolas.

Dentre esses armamentos, os que têm chamado mais atenção são os fuzis, um tipo de armas cada vez mais em poder de traficantes, quadrilhas de assalto a banco, sequestradores e até políticos.

Na Bahia, os dados da SSP mostram a apreensão de 3 fuzis em 2014, indo para 14 em 2015, 7 em 2016 e 22 em 2017. Os tipos de fuzis mais apreendidos são o M16, AR 5,56, o Airsoft, além da “sete meia dois”.

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Dez vezes mais nas ruas Facções criminosas que atuam em Salvador, como Bonde do Maluco (BDM) e Comando da Paz (CP), as quais também estão presentes no interior da Bahia por meio de outras facções menores, têm cada vez mais imposto o medo por meio das armas utilizadas na guerra do tráfico.

Os fuzis têm sido a arma preferida nos assaltos a banco no interior do estado, onde os bandidos chegam na madrugada atirando em imóveis residenciais e até em prefeituras, como ocorreu no dia 3 de outubro na cidade de Buerarema, no Sul da Bahia.

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Os assaltos a banco são uma das principais fontes de renda de facções como o Primeiro Comando da Capital (PCC), a maior quadrilha de criminosos do país e que tem atuação também na Bahia por meio de facções locais, atuando tanto no fornecimento de drogas quanto de armas.

O secretário da Segurança Pública Maurício Teles Barbosa disse que o aumento das apreensões de armas de grosso calibre é resultado do trabalho integrado entre as Polícias Civil, Militar, Federal e Rodoviária Federal.

“Essas ações, para terem êxito, precisam de muito trabalho de inteligência policial, e, sobretudo de troca de informações entre as forças de segurança”, ele disse, em nota, e destacou que os números não incluem as apreensões realizadas em conjunto com as polícias em outros estados e as apresentadas na Polícia Federal.

Barbosa destaca que o aumento neste ano da pena para o crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito (que varia agora de 3 a 6 anos) e sua inclusão no rol dos crimes hediondos, por meio da Lei 3.376/15, publicada no Diário Oficial da União em 26 de outubro de 20174, são iniciativas positivas.“Entretanto, a responsabilidade de fiscalizar as fronteiras, por onde entram essas armas em nosso país, principalmente as de grosso calibre, é do Governo Federal. E, como é feita a contento, o problema recai para as polícias estaduais”, disse o secretário.Ele explicou ainda que essas armas longas geralmente são encontradas com quadrilhas de assalto a bancos, boa parte com atuação interestadual.

Uso banal Estudiosos da área de segurança pública estimam que a quantidade de fuzis e outras armas que circulam no submundo do crime seja de seis a dez vezes maior que o que foi apreendido. E elas vêm sendo utilizadas não só na guerra do tráfico e outros atos criminosos de maior monta, como assalto a banco.

No dia 8 de agosto, por exemplo, o assaltante Fabrício da Costa Santana, 24, usou uma submetralhadora para roubar uma delicatessen no bairro do Horto Florestal, em Salvador. Junto com um comparsa que usava uma arma menor (possivelmente uma pistola), ele levou o revólver, o colete à prova de balas e R$ 100 do segurança do local. Foi preso quase um mês depois, sem a submetralhadora. Bandido preso usou submetralhadora para levar  arma de vigilante de delicatessen no Horto (Foto: Divulgação/Polícia Civil) No bairro Caminho de Areia, a polícia apreendeu em junho na casa de Jorge Wilian Stuart Marques e Aline Souza dos Santos mais um fuzil 7,62, muito utilizado, segundo a Polícia Civil, em assaltos a bancos.

No mesmo mês, o sequestrador Celso Almeida Andrade, 42, foi preso em Lauro de Freitas, na Região Metropolitana de Salvador, com um fuzil AR 5,56, dois carregadores, 47 munições para o mesmo calibre e uma espingarda calibre 12. Jorge e Aline foram presos na Cidade Baixa em posse de um "sete meia dois" (Foto: Divulgação) Os casos de apreensão de fuzis e munições para este tipo de arma se espalham pelo interior do estado. Em Itagimirim, no extremo sul, o ex-prefeito Rogério Oliveira foi preso em maio deste ano com uma espingarda calibre 12, e um ex-secretário dele estava com munições calibre 762 usadas em fuzil.

Em Teixeira de Freitas, três comerciantes que vendiam armas e munições ilegalmente foram presos em outubro. Eles estavam com 122 armas de diversos calibres e 1.200 munições de armas de uso restrito das forças armadas, como as utilizadas em fuzil 7,62 e 5,56, em pistolas, submetralhadoras 9 milímetros e em metralhadoras.

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Bandidos que estavam em um veículo Frontier cinza trafegando na contramão por uma avenida de Jequié, Sudoeste do estado, durante a madrugada do dia 30 de outubro, deixaram para trás um fuzil 7,62 e duas submetralhadoras, uma delas de fabricação norte americana, após trocarem tiros com a polícia e fugir pelo mato.

Quebra financeira O diretor do Departamento de Repressão e Combate ao Crime Organizado (Draco), delegado Marcelo Sansão, disse que as apreensões representam “uma grande quebra financeira aos grupos criminosos.”

Uma operação de equipes da Força Tarefa da SSP, Batalhão de Choque, e Polícia Federal, realizada no mês de outubro apreendeu dois fuzis AK 47 calibre 7,62, uma metralhadora 9 milímetros, uma submetralhadora MT12, 9 milímetros, uma pistola CZ, 9 milímetros e uma espingarda calibre 28.

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“Só esse material foi avaliado em R$ 500 mil”, disse o delegado, em uma nota da SSP. Essa avaliação, contudo, é passível de contestação. O site americano Atlantic Fire Arms, do estado da Flórida, comercializa fuzis AK47, por exemplo, por entre 759 e 1.889 dólares – um dólar nesta quarta-feira estava cotado a R$ 3,30.

O comandante do Batalhão de Choque, tenente-coronel Paulo Guerra, disse que essas armas “não são comuns na Bahia, como acontece no Rio de Janeiro e São Paulo, por exemplo”.

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Afirmou que, apesar do aumento no número de apreensões, “a realidade baiana não se compara aos outros dois estados”, lembrando ainda que as polícias baianas, com suas unidades especializadas, estão bem equipadas e preparadas, para os casos de enfrentamento com essas quadrilhas.

Em abril deste ano, a SSP recebeu da Marinha a doação de 100 fuzis automáticos leves e 200 carregadores – 85 fuzis ficaram com a PM e 15 com a Civil.

O armamento fazia parte da reserva estratégica da Marinha do Brasil e, antes de ser doado à SSP, passou por revisão e manutenção no Centro Tecnológico do Corpo de Fuzileiros Navais, no Rio de Janeiro. A Marinha já havia feitos outras doações, em 2009 e 2011, de 350 fuzis automáticos, no total.