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Cesar Romero
Publicado em 16 de março de 2020 às 05:00
- Atualizado há um ano
Um dos maiores críticos de arte do Brasil, Jayme Maurício (1926 - 1997), passava no final da década de 80 por um momento de dificuldade financeira. Preocupado com as contas que não paravam de chegar, aceitou fazer um texto de apresentação para o catálogo de uma artista sem nenhuma representação como criadora. Jayme, cultíssimo, rígido, aceitou a encomenda, que causou espanto entre seus colegas e a comunidade cultural do Rio de Janeiro.
O crítico apenas “descreveu” os trabalhos a serem expostos, sem análises, nem juízos de valor. Não envolveu interpretações, nenhuma formulação teórico–filosófica. Apenas registrou o que os olhos viam, nada mais. A grita foi enorme, e ele em calmaria retrucou: “a maioria dos artistas são medianos, bons são raros, eu escrevi sobre esta pintora, e não estou fazendo mal a ninguém”. Todos calaram, até os mais radicais, os de pensamento rígido e raivosos. Jayme Maurício sabia escrever, coisa que não é fácil e seu texto tão bem posto como literatura, parecia elogioso. Não era. Mas era, sim, bem escrito. Se a maioria dos artistas são medianos, como disse Jayme Maurício, é bem melhor que ruim. Gênios na história da humanidade, desde seu início podem chegar a 100, com muito esforço.
A arte é clara, ela denuncia o bom e o ruim, o legítimo e o blefe. Atesta criadores, ratifica carreiras ou apontam farsas. É importante o artista estar atento à carreira, para que tentações como o mercado, o modismo, a família, a longevidade não venham causar danos ao conjunto da obra.
A longevidade é um bem divino. Traz limitações, o gesto criador não mais atente as emanações cerebrais, declinando as sinapses. A primeira coisa que acontece é a deficiência da inteligência espacial, a capacidade de desenhar, pintar, compor objetos e visualizá-los mentalmente. As habilidades cognitivas fragilizam. Bem melhor para a carreira saber parar. Isto não é demérito, é a natureza, a que todos estamos submetidos. Saber parar é proteger o legado, nunca uma fraqueza.
Um exemplo lapidar foi Aldemir Martins (1922 – 2006), um desenhista extraordinário, pintor refinado, muito premiado, inclusive nas Bienais de São Paulo e XXVII Bienal de Veneza como Melhor Desenhista Internacional. Prêmio de Viagem ao Exterior no VIII Salão de Arte Moderna do Rio de Janeiro. A partir dos anos noventa, sua produção caiu em qualidade, chegando a prejudicar sua carreira.
Que fique bem claro: é uma decisão voluntária, nunca um decreto, nunca uma punição. Pode-se trabalhar até o final dos dias, mas separar adequadamente a melhor parte das produções. Assim se tem a obra protegida.