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Paulo Leandro
Publicado em 10 de fevereiro de 2021 às 05:02
- Atualizado há um ano
A esta época, o pé de acerola, nosso vizinho, estaria despejando seus frutos vermelhos. Sua sombra dava bom refresco e quem aproximasse de seu tronco enrugado bastava dizer ‘bom dia’ para ganhar aquela overdose da melhor vitamina C.
De uma hora para outra, o pé de acerola passou a descorar, suas folhas ressecaram e, logo, logo, provavelmente a música clássica soteropolitana primeiro lugar no Hit Parade será ouvida, o som demolidor da motosserra, para ali os homens fazerem novo terraço.
Coincidiu o Bahia secar junto com o querido pé de acerola, hoje condenado, pois logo, logo, algum órgão virá emitir alguma via para amparar legalmente nossa inépcia e absoluta falta de compaixão com a flora, característica da espécie dita racional.
Agora, para salvar o Esquadrão e não permitir sua metamorfose em Ex-quadrão, restam ainda três remédios, pois segundo informações oficiais, um raro morador dotado de boa vontade tentou salvar, sem sucesso, a árvore com medicamento de botânico.
O mais difícil, na sequência, seria Atlético Mineiro, pois ainda respira o Carijó a oportunidade de sonhar em alcançar Flamengo e Internacional, além de curtir a certeza de marcar presença na Libertadores, se o coronavírus não virar algo mais destrutivo.
O torcedor do Bahia, este já mudou de cepa e passou a pensar muito negativamente. O tricolor, sempre tão vibrante e negacionista de seus erros, passou a ser uma pessoa triste, cabisbaixa, já tremendo, conformado, como um dia foi o sofredor do Vitória.
Críticas ácidas e não lisérgicas atingem duramente a defesa e mesmo a denúncia de racismo, sem fundamento, do bom colombiano Índio Ramírez, foi logo assumida pela diretoria: arapucas armadas por VAR e juizões de pouca visão nos tiraram pontos.
Admitindo-se a volta do imortal brio tricolor, um empate contra o Atlético seria de bom tamanho, lembrando, como tanto gostam de lembrar, a campanha do bi 1988, quando o Bahia era “de menor” para o Galo, mas a partir de Zé Carlos, esta história mudou.
Na sequência, o Bahia tem o Fortaleza, lá. Um jogo chamado de seis pontos, para os pitagóricos contemporâneos, uma vez estarem ambos na gangorra para ver quem sobe e quem desce, humilhado o Nordeste, como sempre, tendo também o Sport na guerrilha.
Humilhação repetida, ano após ano, desde 1824, quando a Confederação do Equador rompeu com o poder central, ou mesmo antes, na repressão cruel aos revoltosos de 1798 na Bahia, ou no desmantelo da insurreição pernambucana de 1817.
Acrescente-se a estes eventos o arraial teocrático-socialista de Canudos, do Grande Conselheiro, e a organização de um exército da caatinga, por Coronel Virgulino, e bote mais umas 17 revoltas, originárias do sistema penitenciário nacional.
O futilbol reflete esta evidente divisão de brasis, como se, em um voo, a primeira classe estivesse destinada sempre a sudestinos e sulistas; a Lampions League fica para esta população amaldiçoada por tanta rebeldia diante de quem detém as armas e a força.
Por fim, a campanha vai trazer a nostalgia da I Taça Brasil, estrela da qual o Bahia jamais vai libertar-se, pois mantém viva a memória, diante do Santos, na rodada decisiva, se o pé de acerola já não tiver morrido, por envenenamento ou desgosto.
Paulo Leandro é jornalista e professor Doutor em Cultura e Sociedade.